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Draghi: Precisamos de "confiança, persistência e prudência"
O presidente do BCE lançou os trabalhos do 4.º Fórum do BCE em Sintra com uma mensagem optimista, mas onde deixou claro que os estímulos monetários ainda são necessários para suportar a retoma e garantir inflação. O BCE será persistente e confiante, garantiu.
A retoma está em curso e, embora ainda se faça sentir na inflação como seria de esperar, é tudo uma questão de dar tempo à economia e de cautela na política monetária para não prejudicar a recuperação, por exemplo retirando estímulos demasiado cedo.
"Podemos estar confiantes que a nossa política está a funcionar e os seus efeitos totais na inflação vão materializar-se gradualmente. Mas para isso, a nossa política precisa de ser persistente, e precisamos de ser prudentes na forma como ajustamos os parâmetros [da política monetária] à melhoria das condições económicas", afirmou o presidente do BCE no discurso de abertura do 4.º Forum do BCE, que está a decorrer em Sintra (assista aqui em directo).
Draghi mostrou-se optimista quanto à situação europeia, tanto no plano económico, como político. Mas pediu paciência para dar tempo à retoma e as pressões inflacionistas para se instalarem.
"Todos os sinais apontam agora para um fortalecimento e alargamento da recuperação na Zona Euro", afirmou, considerando que, ao contrário do que acontecia há três anos, "os ventos políticos estão a ajudar. Há uma nova confiança nos processos de reforma e há novo suporte para a coesão europeia, o que poderá ajudar a libertar a procura e o investimento contidos pela crise".
A recuperação económica não está a levar a inflação para o objectivo próximo dos 2% ao ritmo desejado, mas isto trata-se apenas de uma questão de ritmo, defendeu depois Draghi. Segundo as análises do BCE, há vários factores a contribuir para um aumento mais lento da inflação na Zona Euro: preços do petróleo mais baixos com efeito tanto directos, como indirectos via preços de bens sensíveis ao petróleo; reformas estruturais que aumentaram a oferta de mão-de-obra e a flexibilidade salarial atrasando pressões de preços via salários; e o facto de existir ainda muita fraqueza no mercado de trabalho, com a taxa de desemprego ‘real’ – a que considera dos desencorajados e os que trabalham menos do que desejam - ainda na casa dos 18%. Tudo isto atrasa, mas não impedirá a recuperação da inflação, argumentou o líder do banco central.
"As forças deflacionistas foram substituídas por forças reflacionistas. Embora ainda existam factores que estão a pesar na trajectória da inflação, estes são factores principalmente temporários que o banco central pode ignorar no médio prazo", afirmou, acrescentando logo de seguida que, no entanto, significam também que "um grau considerável de apoio monetário é ainda necessário": "para termos a certeza do retorno da inflação ao nosso objectivo precisamos de persistência na nossa política monetária", sinalizando que o BCE pretende continuar a apoiar a economia da Zona Euro.
Finalmente, o líder da autoridade monetária deixou uma garantia num momento em que se debate o início da reversão dos estímulos pelo banco central, nomeadamente uma possível redução do volume de compra de 60 mil milhões de euros activos por mês a partir de 2018. Além de confiança e persistência, "precisamos de prudência", disse: "À medida que a economia recupera, vamos precisar de ser graduais a ajustar os nossos parâmetros de política, de forma a garantir que os nossos estímulos acompanham a recuperação no contexto de incertezas contínuas".
As políticas do pós-crise
À medida que o crescimento e o emprego regressam lentamente, e a inflação se aproxima do objectivo de 2% aceite pela maioria dos bancos centrais, as autoridades monetárias estão a tentar reposicionar-se: a Reserva Federal subiu juros no final de 2016, o Banco de Inglaterra poderá fazê-lo este ano, e provavelmente já o teria feito não fosse o Brexit, e o BCE prepara-se para esclarecer a sua estratégia de normalização da política monetária depois do Verão. Apenas o Japão, ainda a lutar com inflação próxima de zero, prevê manter o seu programa de compra de activos a todo gás.
É neste contexto que Draghi lançou em Sintra a discussão sobre como crescer no pós-crise, num contexto de tendência internacional de abrandamento do crescimento e da produtividade nas economias avançadas que sente no século XXI, e que pode ter sido agravado pela crise dos últimos anos.
Após o discurso de Mario Draghi, seguem-se na terça-feira uma manhã de trabalho em torno dos temas inovação, investimento e produtividade. Primeiro, David Autor, professor no MIT, apresenta o seu artigo "O crescimento da produtividade ameaça o desemprego"; segue-se o debate em torno do artigo "Há um gap de investimento nas economias avançadas? E se sim, porquê?", assinado, entre outros, por Thomas Phillipon, da Universidade de Nova Iorque.
Os trabalhos chegam ao fim pela hora de almoço com painel de debate que conta com vários especialistas em inovação: Mariana Mazzucato (University College London), Joel Mokyr (Northwestern University) Hal Varian (Economista-chefe da Google) e Reinhilde Veugelers (KU Leuven), moderados por Peter Praet, economista-chefe do BCE.
Na quarta-feira, último dia, os participantes debatem os ciclos económicos e a importância da política macroeconómica e, como já é habitual, os trabalhos terminam com um painel de banqueiros centrais: Mark Carney (Inglaterra), Mario Draghi (BCE), Haruhiko Kuroda (Japão) e Stephen Poloz (Canadá) serão moderados por Karnit Flug, a governadora do Banco de Israel.