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Centeno recusa défice escondido mas há dúvidas

Ministro das Finanças evitou falar de cativações na primeira audição na generalidade do Orçamento do Estado e lamentou perguntas dos deputados, nomeadamente sobre as discrepâncias suscitadas pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental.

Miguel Baltazar
23 de Outubro de 2018 às 22:00
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"Não há nada escondido", asseverou Mário Centeno, ministro das Finanças, sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2019, em resposta aos deputados da Comissão de Orçamento e Finanças, ontem, no Parlamento. Mas apesar dos esclarecimentos que foi dando, continua a haver dúvidas por esclarecer.

 

As reservas da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) à proposta de OE 2019 marcaram o debate de generalidade desde o início. E motivaram perguntas tanto das bancadas da direita parlamentar como da esquerda.

 

Mário Centeno foi oscilando entre responder às questões, acusar os deputados de desconhecimento das técnicas orçamentais, lamentar o tom e o conteúdo do debate, acusar a UTAO – e de caminho o Conselho das Finanças Públicas – de erros de previsão, e atirar para canto.

 

Em causa está o facto de a UTAO, no seu relatório preliminar sobre o OE 2019, ter detectado uma discrepância de 590 milhões de euros entre o saldo em contabilidade pública implícito nos mapas do orçamento (os que são votados pelos deputados) e o valor implícito à meta em contas nacionais, identificada no relatório.

 

Perante a dúvida, Centeno disse estar espantado, sobretudo vinda de "expertos em contas públicas e nacionais". O ministro afirmou que "os Orçamentos do Estado nos últimos muitos anos, incluindo na anterior legislatura, sempre foram apresentados com a conta da administração central ajustada da mesma forma". Por outras palavras, este é um procedimento normal.

 

Neste pressuposto, os 590 milhões, cujo gasto a Assembleia da República autoriza, são uma espécie de margem para evitar rectificativos: não é suposto serem usados, sob pena de o défice derrapar, a menos que haja receita além do estimado.

 

Visto de outro ponto de vista, estes 590 milhões de euros são cativos feitos à despesa aprovada, logo à cabeça.

 

Mas Mário Centeno não foi claro – e não disse que se trata de cativos – pelo que a deputada bloquista voltou ao tema. "Há um problema neste orçamento", disse Mariana Mortágua. E quis saber exactamente o que justifica a diferença entre os saldos. Também quis saber o valor nominal das cativações incluídas no OE 2019.

 

Mário Centeno atirou a primeira pergunta para canto e não respondeu à segunda. O ministro repetiu que aquela técnica de orçamentação sempre se utilizou há muitos anos. E que o valor em causa é idêntico em 2019 e 2018. A diferença é que o ajustamento entre o saldo aprovado e o saldo estimado não estava clara no relatório, como está na proposta para 2019, argumentou o ministro. Mas não clarificou as razões da diferença dos saldos.

 

Já sobre as cativações, Centeno argumentou que o valor exacto ainda não está apurado e que esse número será disponibilizado ao longo do debate orçamental.

Dúvidas não acabaram

Ao longo da tarde os deputados insistiram. Se o défice for de facto mais elevado do que a meta de 0,2% inscrita no relatório, se atingir os 0,5% que ficam implicitamente aprovados pela AR, o país desvia-se de forma significativa das regras europeias, avisou a UTAO, e lembraram os deputados da direita parlamentar. E somaram que as medidas enviadas para Bruxelas foram além das que foram reportadas ao Parlamento nacional.

 

O ministro reagiu mal: "Parece-me de tal maneira descabido levantar dúvidas sobre essas matérias que até me custa debatê-las nesse pé." "Não há nenhuma intenção, porque tal não é sequer possível, de entrar nestas andanças mirabolantes que aqui me são colocadas," disse. "Não há nada escondido. Não há nada sub-reportado", garantiu. Mas Mariana Mortágua voltaria à questão da discrepância de valores. A deputada quis certificar-se de que os orçamentos são comparáveis entre si. E quis saber que montantes de aprovação de despesa adicional face ao que é previsto executar estiveram em causa nos anos passados.

A resposta deixou ainda mais dúvidas. "Nos orçamentos de 2014, 2018 e 2019, nos quadros sectoriais constam os valores que designo de orçamento", disse o ministro, adiantando que são "os tectos máximos dos orçamentos desses sectores". Mas nos orçamentos de "2013, 2015, 2016 e 2017 o que aparece nos quadros sectoriais é o orçamento ajustado", admitiu.

Em 2019, "o que difere é que na conta da administração central aparece a soma dos valores dos quadros sectoriais, enquanto até 2018 aparecia a dotação ajustada", acrescentou. Ou seja, há um quadro sobre a conta da administração central em 2019 que não é comparável com o de 2018. Mas os valores sectoriais são.

Ficou por esclarecer se os 590 milhões de euros cativados tanto em 2018, como em 2019, só podem ser usados em caso de receitas além do esperado, ou se a metodologia é diferente este ano. Também não ficou claro se este valor se soma ao montante de cativações que é habitualmente acompanhado pela Assembleia da República, e que é justificado pelo Executivo como uma simples medida de prudência na gestão, ou se, na prática, representam cortes efectivos de despesa na medida em que mesmo que as receitas corram como previsto não podem ser usados, sem fazer derrapar o défice. O Negócios tentou obter esclarecimentos sobre estas questões junto das Finanças, mas não conseguiu resposta até ao fecho desta edição.

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