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09 de Janeiro de 2013 às 23:30

Venha ela!

Faz agora seis meses, o FMI apresentou um estudo em que estimava que metade do prémio de risco cobrado a Portugal não tinha propriamente que ver com o que cá se passava, com os tais dados fundamentais da economia portuguesa.

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Faz agora seis meses, o FMI apresentou um estudo em que estimava que metade do prémio de risco cobrado a Portugal não tinha propriamente que ver com o que cá se passava, com os tais dados fundamentais da economia portuguesa. A conclusão implícita era a de que os mercados estariam a "castigar" duplamente Portugal e demais países da periferia por recearem que o comboio do euro os deixasse apeados, mais dia, menos dia. De lá para cá, a situação alterou-se significativamente. As "yields" da dívida pública portuguesa a dez anos (que oferecem uma aproximação ao custo que o Estado teria de suportar se pedisse financiamento directo aos mercados) caíram em Dezembro abaixo da barreira psicológica dos 7%, quando em Agosto estavam acima dos 10%.

 

Algumas grandes empresas e bancos voltaram a emitir dívida e, no caso do BES, a dose foi repetida nesta terça-feira com custos inferiores ao do primeiro teste junto dos mercados. A Irlanda, por seu turno, conseguiu nesta semana fazer a primeira venda de dívida de mais longo prazo a uma taxa que compara bem com as anteriores ao resgate – ainda que superior à taxa de juro dos empréstimos europeus que, reconheça-se, são hoje (não o eram no início) "preço de amigo" que deixará saudades.

É difícil medir qual terá sido o impacto do anúncio do BCE, que no Verão prometeu fazer tudo o que fosse necessário para salvar o euro no seu formato actual, mas é fácil intuir que essa garantia terá sido fundamental para reduzir o prémio de risco. É difícil medir que parte dessa redução se deve ao que se tem passado por cá, mas seis exames da troika com nota positiva terão também obviamente contribuído para a recuperação da confiança dos investidores.

Portugal está, assim, hoje mais perto de poder dispensar um segundo pedido de assistência e de recuperar alguns graus de liberdade. Mas nenhum Cabo das Tormentas foi ainda dobrado. Quando se cruza uma enorme dívida acumulada em décadas de erros colectivos e um fraco potencial de crescimento as escolhas até podem ser muitas, mas não escapam aos imperativos de "austeridade", que nalguns casos corresponderão a escolhas de elementar responsabilidade e de justiça, sobretudo com as gerações vindouras.

A fazer fé nos dados do relatório do FMI para preparar a reforma do Estado somos (teremos sempre sido?) um arremedo pervertido de economia social de mercado. Mesmo que fosse financeiramente sustentável, faz sentido que 33,8% dos recursos, pagos por impostos das gerações actuais e dívida a ser paga pelas futuras, postos ao serviço de um Estado social destinado a corrigir as desigualdades caiam no bolso dos 20% mais ricos? E que os 20% mais pobres fiquem com a fatia mais magra, 13,2%? A troika veio para Portugal para destruir o nosso Estado social? Venha ela!

*Redactora Principal

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