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23 de Dezembro de 2016 às 00:01

Não batam com as portas

Estes tempos de inquietude crescente no PSD encontram uma analogia com graça. No baú de Raul Solnado está a rábula do avô surdo como uma porta. Quando um terramoto provoca estragos e acorda o velho ancião, ele clama estremunhado: não batam com as portas.

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Neste tempo, o primeiro-ministro garante que o défice ficará "confortavelmente" abaixo do patamar exigido por Bruxelas. Não é mau. E dá argumentos para marcha de negociações. Também não será de desvalorizar a segurança de António Costa (certamente conhecedor de algumas variáveis) nos números de fecho de ano, tanto de exportações como de crescimento.

É este um tempo em que uma coerente cumplicidade entre o Governo e o Presidente da República justifica a assinatura do próximo texto orçamental. É verdade que Marcelo não pode estar de acordo com tudo, mas ninguém tenha ilusões: só um terramoto económico, social e político poderia levar o Presidente a quebrar uma relação traduzida num "compromisso nacional".

Claro que não estamos a salvo e ninguém, no seu perfeito juízo, deverá entrar em euforia. As reticências do Presidente estão na incerteza do que pode vir – há eleições na Itália, França, Holanda, Alemanha e uma aterragem, que se pretende suave, no Brexit. Há um projecto europeu a deslassar e um espaço económico, comercial e político a perder força contra uma articulação entre Estados Unidos, Rússia, Turquia. Uma parte do mundo que se pode revelar sufocante.

E é neste contexto de imprevisibilidade que países com os problemas e a dimensão de Portugal poderão retirar algum proveito. De uma forma perversa, mas com ganho de causa. O eventual enfraquecimento da Alemanha pela tenaz Putin/Trump não é a melhor nova para o mundo, mas poderá constituir um contrapeso à ortodoxia orçamental dominante. Eis um trunfo, mesquinho mas com ganho de causa para um devedor.

Pedro Passos Coelho não acreditou. Nunca pensou ser possível fechar o ano com estes números. Muito menos um défice "confortavelmente" abaixo de 2,5%. Não acreditava na fórmula de governação, não enquadrava a reversão de um desenho económico, não avaliou a cumplicidade construtiva de Marcelo e Costa. E foi nesse arrastar de contra ciclo que se cavou o fosso das sondagens, que não houve manha política para gerir apetites e consequências das eleições autárquicas.

Passos Coelho fecha o ano cercado pela hipocrisia dos fracos. Aqueles que são frontais quando o "trade-off" alimenta ambições e necessidades. Passos tem algumas hipóteses: provocar uma clarificação, afirmar uma alternativa à governação, esperar que o tempo lhe dê razão a tempo. Ou, ainda, desencantar uma qualquer equação disruptiva.

Pode sempre fazer de mouco. Como o avô do Solnado. 

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