Opinião
Uma presidência finlandesa sem história ou glória
A Presidência da Finlândia dos Conselhos da União não conseguiu, por falta de tempo ou por uma série de circunstancialismos malfadados, qualquer sucesso de relevo e, antes pelo contrário, somou desastres político-negociais que não ajudaram aos avanços que
Em primeiro lugar, assinale-se o fracasso no "dossier" de um nado-morto, chamado de Tratado Constitucional, vulgus, Constituição Europeia. Supostamente a presidência finlandesa em exercício devia apresentar um relatório sobre a saída para o impasse em que mergulhou a reforma institucional, sobretudo após a não ratificação por franceses e holandeses daquele projecto de Tratado, tendo em vista que no próximo ano se comemora, em Março, o quinquagésimo aniversário da assinatura do Tratado de Roma. A tarefa ficará, contudo, para a presidência alemã a tempo de ser adoptada no segundo semestre de 2008 em tempo de presidência francesa, para entrar em vigor no ano seguinte aquando das eleições para o Parlamento Europeu.
Segundo desastre prende-se com as relações entre a Rússia e a União Europeia, antes de tudo no domínio da questão energética onde Helsínquia tinha conseguido veicular as preocupações comunitárias com discussões francas e profícuas, as quais se goraram ao coincidir com a morte do ex-espião russo Alexander Litvinenko, o que metaforicamente, envenenou o diálogo. Para além disto, o início das negociações tendo em vista um acordo de cooperação com aquele país foram goradas com o veto da Polónia por causa do embargo que a Rússia faz à exportação de carne deste Estado membro.
Infelizmente os insucessos não se ficaram por aqui e, antes, foram coroados, com o congelamento das negociações de adesão da Turquia à União em oito dos trinta e cinco capítulos negociais. Aliás de forma inglória, até porque foi o então primeiro-ministro finlandês Paavo Lipponem que abriu a porta aquelas negociações com o aplauso dos seus congéneres. O que se passa é que parece estar-se perante uma conversa de surdos em que a questão cipriota é o nó górdio. Era sabido que o Chipre grego iria trazer um muro, inclusive no sentido próprio do termo, para a Europa comunitária quando todos os outros já foram demolidos. Este país, hoje membro da União recusa-se a reconhecer a República Norte turca do Chipre, enquanto a Turquia também se recusa, pour cause, a abrir os seus portos e aeroportos ao Chipre grego, sendo que esta questão sempre foi vista de um ponto de vista nacionalista, sobretudo depois do massacre em 1964 dos turcos do Chipre pelos gregos.
O que se passa é que depois do 11 de Setembro as opiniões públicas manifestam-se desfavoravelmente à entrada de um país islâmico, embora laico como a Turquia, que paga, assim, a factura do terrorismo islâmico e que tem, também por isto, a impressão de estar a ser constantemente humilhado. As conclusões deste último Conselho Europeu vão neste sentido ao dar a impressão aos europeus que a Turquia nunca entrará, enquanto se tenta dar aos turcos exactamente a ideia contrária.
Mesmo nos "dossiers" mais técnicos como o atinente ao da Directiva Tempo de Trabalho, inscreve-se mais um insucesso desta presidência, ao não conseguir conciliar os campos que se dividem na jornada já adoptada de 48 horas semanais. É que os ingleses querem continuar a manter as excepções a esta regra em nome da flexibilidade e da competitividade, enquanto os franceses pugnam pela eliminação das derrogações em nome da protecção dos trabalhadores e da pouca Europa social que ainda resta.
Pode dizer-se, em suma, que fruto do elevado número de Estados membros e da diversidade dos interesses em presença, do azar dos timings ou de qualquer outra situação mais ou menos aleatória, o que é facto é que nem esta nem outra presidência conseguirão apenas em seis meses dar os impulsos necessários à resolução destas e de outras questões pendentes. Espera-se, assim, que se comece, no próximo semestre, a desenharem soluções, porque depois deste meio século as Comunidades, e agora a União Europeia, precisam, urgentemente, de reforma.