Opinião
Sexta-feira, dia 9
"A complexidade do sistema que você descreve está para além de tudo o que eu estudei como cientista político!", foi com estas palavras que Henry Kissinger comentou a descrição que Vasco Gonçalves lhe fazia, e ao Presidente Nixon, numa reunião tida em 29 de Maio de 1975, sobre papel das Forças Armadas na vida política portuguesa de então.
"A complexidade do sistema que você descreve está para além de tudo o que eu estudei como cientista político!", foi com estas palavras que Henry Kissinger comentou a descrição que Vasco Gonçalves lhe fazia, e ao Presidente Nixon, numa reunião tida em 29 de Maio de 1975, sobre papel das Forças Armadas na vida política portuguesa de então.
Notas dessa extraordinária reunião, bem como de muitos outros factos e acontecimentos relativos a esse momento único da história de Portugal, podem encontrar-se num interessantíssimo livro publicado, já lá vão 3 anos, por Bernardino Gomes e Tiago Moreira de Sá intitulado " Carlucci vs. Kissinger".
Se, como sugere um amigo meu, a vida, como a Lua, tem 4 fases a minha geração iniciou o seu quarto crescente com uma revolução no País e entra no quarto minguante com uma revolução na Europa.
Há 36 anos Portugal tinha acabado de evitar transformar-se na " Cuba da Europa" fazendo abortar, em 25 de Novembro, o assalto final ao poder tentado pelo Partido Comunista e pelo sector das forças armadas que o apoiava. Nessa luta, que quase desembocou em guerra civil, o Partido Socialista de Mário Soares, o PPD de Sá Carneiro, o CDS de Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa e o sector moderado das Forças Armadas liderado pelo chamado " grupo dos Nove" receberam o apoio solidário e imprescindível da Alemanha, da Suécia, da Inglaterra e da França.
O país tinha a indústria e os principais serviços, designadamente a banca, nacionalizados e as terras agrícolas ocupadas, após um processo vertiginoso de assalto às estruturas produtivas que ganhou alento e "legitimação revolucionária" em 11 de Março de 1975.
Há 36 anos os portugueses iniciaram uma longa etapa de contenção e privação económica e financeira que só terminou na segunda metade da década de 80 com a adesão plena à União Europeia. Convivemos com inflação galopante, juros a 30 %, desvalorizações da moeda, restrições quantitativas às importações, diminuição do PIB, desemprego, taxas e impostos imprevisíveis, papel selado, selos fiscais e mais um sem número de sinais e inevitabilidades típicas do nosso atraso político, cultural, social e económico.
Enfim, um caos inimaginável para aqueles que deram os primeiros passos na vida política e profissional iniciando o seu "quarto crescente" nos anos 80.
Só que, nessa altura, a Europa em que nos pretendíamos integrar não se encontrava no caos político e financeiro de hoje!
Ninguém, julgo que nem os sistemáticos optimistas, está seguro que esse caos alivie na próxima sexta-feira dia 9, quando o Conselho deliberar sobre as propostas que a Sra. Merkel decidiu apresentar, depois de ouvir os Sr. Sarkozy.
A própria Sra. Merkel já baixou as expectativas avisando que a restauração da confiança dos investidores se fará através de um processo longo que, inevitavelmente, passará pela alteração do Tratado e das próprias Constituições dos países aderentes (17, 27?) de modo a nelas incluir uma regra sagrada de equilíbrio orçamental. Ou seja, que ninguém espere um milagre depois de amanhã.
Os "mercados", esses entes abstractos e invisíveis que hoje são dominados por muito menos gente do que Adam Smith pretendia, reagiram com o típico optimismo especulador e proporcionaram, a quem por lá anda, a "melhor semana dos últimos três anos"!
Só que as agências de rating, que se habituaram ao protagonismo, decidiram, através da S&P, colocar os seis inexpugnáveis europeus sob avaliação nos próximos 90 dias com risco considerável de baixa de rating. Como avisava a "The Economist", na passada sexta-feira, " ninguém será poupado se o euro colapsar!"
A confusão está instalada, a incerteza é enorme, o risco de o euro desaparecer e com ele a União Europeia é real! Como diria Kissinger, a complexidade de tudo isto vai muito para além do que alguma vez imaginamos ou estudamos!
Para nós portugueses, se o euro e a Europa sobreviverem, estão-nos reservados tempos difíceis, de grande sacrifício, contenção e confusão, mas com a expectativa razoável de regressarmos ao crescimento dentro de dois ou três anos! Nada pior do que já experimentamos num passado recente e que ultrapassamos com esforço, dignidade e solidariedade.
Como dizia o ministro das Finanças sueco, que em dois anos reduziu o endividamento público sueco de 54.7% do PIB para 36.3%, " se sabemos que o Inverno vai ser muito frio, temos que assegurar que a casa é bem construída. Caso contrário congelamos"!
Mas se o euro e a Europa se desintegrarem, ou se Portugal for empurrado para fora deles pelos "mercados", congelamos até voltar muitos, muitos anos atrás!
Advogado
mcb@mcb.com.pt
Assina esta coluna semanalmente à quarta-feira
Notas dessa extraordinária reunião, bem como de muitos outros factos e acontecimentos relativos a esse momento único da história de Portugal, podem encontrar-se num interessantíssimo livro publicado, já lá vão 3 anos, por Bernardino Gomes e Tiago Moreira de Sá intitulado " Carlucci vs. Kissinger".
Há 36 anos Portugal tinha acabado de evitar transformar-se na " Cuba da Europa" fazendo abortar, em 25 de Novembro, o assalto final ao poder tentado pelo Partido Comunista e pelo sector das forças armadas que o apoiava. Nessa luta, que quase desembocou em guerra civil, o Partido Socialista de Mário Soares, o PPD de Sá Carneiro, o CDS de Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa e o sector moderado das Forças Armadas liderado pelo chamado " grupo dos Nove" receberam o apoio solidário e imprescindível da Alemanha, da Suécia, da Inglaterra e da França.
O país tinha a indústria e os principais serviços, designadamente a banca, nacionalizados e as terras agrícolas ocupadas, após um processo vertiginoso de assalto às estruturas produtivas que ganhou alento e "legitimação revolucionária" em 11 de Março de 1975.
Há 36 anos os portugueses iniciaram uma longa etapa de contenção e privação económica e financeira que só terminou na segunda metade da década de 80 com a adesão plena à União Europeia. Convivemos com inflação galopante, juros a 30 %, desvalorizações da moeda, restrições quantitativas às importações, diminuição do PIB, desemprego, taxas e impostos imprevisíveis, papel selado, selos fiscais e mais um sem número de sinais e inevitabilidades típicas do nosso atraso político, cultural, social e económico.
Enfim, um caos inimaginável para aqueles que deram os primeiros passos na vida política e profissional iniciando o seu "quarto crescente" nos anos 80.
Só que, nessa altura, a Europa em que nos pretendíamos integrar não se encontrava no caos político e financeiro de hoje!
Ninguém, julgo que nem os sistemáticos optimistas, está seguro que esse caos alivie na próxima sexta-feira dia 9, quando o Conselho deliberar sobre as propostas que a Sra. Merkel decidiu apresentar, depois de ouvir os Sr. Sarkozy.
A própria Sra. Merkel já baixou as expectativas avisando que a restauração da confiança dos investidores se fará através de um processo longo que, inevitavelmente, passará pela alteração do Tratado e das próprias Constituições dos países aderentes (17, 27?) de modo a nelas incluir uma regra sagrada de equilíbrio orçamental. Ou seja, que ninguém espere um milagre depois de amanhã.
Os "mercados", esses entes abstractos e invisíveis que hoje são dominados por muito menos gente do que Adam Smith pretendia, reagiram com o típico optimismo especulador e proporcionaram, a quem por lá anda, a "melhor semana dos últimos três anos"!
Só que as agências de rating, que se habituaram ao protagonismo, decidiram, através da S&P, colocar os seis inexpugnáveis europeus sob avaliação nos próximos 90 dias com risco considerável de baixa de rating. Como avisava a "The Economist", na passada sexta-feira, " ninguém será poupado se o euro colapsar!"
A confusão está instalada, a incerteza é enorme, o risco de o euro desaparecer e com ele a União Europeia é real! Como diria Kissinger, a complexidade de tudo isto vai muito para além do que alguma vez imaginamos ou estudamos!
Para nós portugueses, se o euro e a Europa sobreviverem, estão-nos reservados tempos difíceis, de grande sacrifício, contenção e confusão, mas com a expectativa razoável de regressarmos ao crescimento dentro de dois ou três anos! Nada pior do que já experimentamos num passado recente e que ultrapassamos com esforço, dignidade e solidariedade.
Como dizia o ministro das Finanças sueco, que em dois anos reduziu o endividamento público sueco de 54.7% do PIB para 36.3%, " se sabemos que o Inverno vai ser muito frio, temos que assegurar que a casa é bem construída. Caso contrário congelamos"!
Mas se o euro e a Europa se desintegrarem, ou se Portugal for empurrado para fora deles pelos "mercados", congelamos até voltar muitos, muitos anos atrás!
Advogado
mcb@mcb.com.pt
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