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Manuel Castelo Branco - Advogado 11 de Outubro de 2013 às 00:01

O "entroikamento"

Como já se queixavam os Romanos quando nos ocuparam e civilizaram, somos um País de sobreviventes, agora sujeitos a imposto se beneficiarem de alguma pensão de quem partiu primeiro. Tecnicamente, já estamos a rapar o tacho

Há dias, seguindo na Internet os textos de alguns articulistas da Forbes, encontrei um texto muito curioso: "Seis conselhos para transformar o seu hobby no seu emprego".


A ideia, divertida e menos tonta do que parece, explora uma evidência: se os hobbies constituem as actividades que escolhemos e para as quais temos uma apetência e vocação especiais, para quê perder tempo em empregos e tarefas maçudas, nos quais encalhamos muitas vezes sem saber bem porquê, em vez de o dedicar ao que gostamos e em que somos jeitosos?

O artigo dá alguns exemplos, como o do funcionário do departamento de marketing da Microsoft, cujo hobby era a magia e que acabou a ensinar marketing aos mágicos … e algumas sugestões, como a dos editores com a paixão pela cozinha que deveriam concentrar-se na publicação dos temas ligados à indústria alimentar.

Claro que o artigo é pensado para os que têm emprego, ideias e iniciativa e estão fartos do que fazem. Mas pode ser útil, também , para quem está desempregado sobretudo se tem o azar de viver em Portugal.

Anteontem assisti a uma parte da conversa que o primeiro-ministro teve, na RTP 1, com 20 portugueses seleccionados. A minha curiosidade não residia tanto no que lá se iria dizer, mas na independência e utilidade do formato.

Ainda resisti a tempo de ouvir uma proprietária da restaurante, receosa que lhe aconteça o mesmo que a grande parte dos seus colegas a perguntar ao primeiro-ministro quando acabava com os 23% do IVA na restauração, pois ela já não sabia o que mais inventar para manter o negócio em funcionamento.

Se eu, para azar dos Portugueses, fosse primeiro-ministro provavelmente teria respondido que compreendia a preocupação da minha concidadã, que lamentava termos chegado aonde chegamos, que isso era culpa destes e mais daqueles (troika, chanceler Merkl, Tribunal Constitucional, José Sócrates, etc ) mas que os sacrifício pedidos a todos os Portugueses seriam recompensados, em breve, com mais procura, menos impostos, mais lucros, mais alegria e menos depressão.

Mas não, o nosso Primeiro Ministro o que explicou à senhora foi que a falta de gente nos restaurantes nada tem a ver com o aumento dos impostos! Como todos sabemos, os donos de restaurantes não repercutiram nos preços finais o aumento de 10% do IVA. Pois, apesar dos preços não terem subido, continua a haver cada vez menos gente nos restaurantes. E porquê? Porque as pessoas têm menos dinheiro e agora levam as refeições em lancheiras para os empregos!

A senhora proprietária não teve tempo para contrapor o que parecia óbvio: que os proprietários não têm margem para absorver esse custo, que é preciso acabar com a política da lancheira e trazer de volta as pessoas para os restaurantes senão a maioria vai continuar a fechar e que isso só se consegue diminuindo os preços na restauração aliviando os consumidores (na verdade os proprietários ) deste encargo extraordinário.

A conversa, quase em família, continuou para outros temas! Tranquilamente, como se o assunto estivesse explicado e arrumado.

Como já se queixavam os Romanos quando nos ocuparam e civilizaram, somos um País de sobreviventes , agora sujeitos a imposto se beneficiarem de alguma pensão de quem partiu primeiro. Tecnicamente, já estamos a rapar o tacho.

Dir-se-ia que esta é uma etapa necessária, uma estação da nossa viagem. Que assim consolidamos as nossa finanças (leia-se, reduzimos a nossa despesa pública) , recuperamos a confiança dos "mercados" e passaremos, a partir de Junho ,a receber crédito já não subordinados à tutela da troika mas no âmbito de outra "plataforma" em que o papel central será desempenhado pelo BCE .

O problema é que os ditos "mercados" se determinam pelo que ouvem de certos agentes, no nosso caso a chanceler Merkel, a Comissão, o BCE e o FMI.

A Chanceler Merkel não ganhou as eleições, anda preocupada em convencer o SPD a aceitar o que eles chamam de "beijo da morte", eventualmente a preparar novas eleições e, por tudo isso, pouco virada para a periferia. Aqueles que julgavam que depois das eleições alemãs vinha um dilúvio de generosidade e compreensão já se desiludiram.

Mário Draghi e Durão Barroso, para surpresa e frustração de muitos, cortaram cerce qualquer veleidade de acomodação do défice a objectivos mais realistas. Em consequência as viúvas, reformados e restantes desprotegidos, que não são " puros e duros " funcionários públicos foram obrigados a suportar uma parcela substancial de 3.7 mil milhões de Euros de receita adicional.

O FMI, que parecia ser a instituição que favorecia o abrandamento da austeridade e aposta no relançamento da economia, no seu relatório Fiscal Monitor descreve o futuro da economia Portuguesa num contexto que os ditos "mercados" não gostam de ouvir.

Chegados ao "entroikamento", vamos prosseguir na linha que não leva ao País das Maravilhas. Se houver lá paragem, alguns saltarão no Apeadeiro dos Hobbies.


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