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09 de Janeiro de 2004 às 12:42

Perspectivas menos sombrias

Raramente tem havido tanta convergência entre os economistas como em relação às perspectivas de evolução da economia portuguesa para 2004. Tudo parece apontar para que este ano não seja um ano de recessão como foi o de 2003. Em contrapartida, pensa-se que

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Raramente tem havido tanta convergência entre os economistas como em relação às perspectivas de evolução da economia portuguesa para 2004. Tudo parece apontar para que este ano não seja um ano de recessão como foi o de 2003. Em contrapartida, pensa-se que a recuperação será muito medíocre, com um crescimento económico quase insignificante.

Pessoalmente, estou de acordo que este é o cenário mais provável. Por isso, vale a pena tomá-lo como referência e especular um pouco sobre o que pode correr melhor e o que pode correr pior em relação a este cenário, assentando como base nos valores agora apresentados pelo Banco de Portugal.

Comecemos pelo que pode correr pior. Nesse aspecto, julgo que o que mais vulnerável existe neste quadro é o crescimento das exportações. É, aliás, o crescimento previsto para as exportações que leva a que se antecipe um crescimento positivo, ainda que diminuto, para o PIB, uma vez quer para a procura interna o Banco de Portugal continua a prever um crescimento negativo ou muito próximo de zero.

Será exequível um crescimento das exportações de bens e serviços da ordem dos 5%? Sem dúvida que sim, mas está longe de ser fácil. Isto basicamente por duas razões: o fraco crescimento que ainda se verificará na Europa e o alto valor que o euro parece manter em relação ao dólar (e há boas razões para a baixa do dólar dado o elevado défice externo norte-americano).

Em relação a este último aspecto, há quem diga que não é muito relevante, uma vez que a maior parte das nossas exportações são dirigidas a países que têm o euro como moeda ou como referência para as suas moedas. Infelizmente a questão não é assim tão simples.

O problema está em que, mesmo nesses países, competimos com exportações oriundas de países de fora da União Europeia e que têm o dólar como referência. E em certos sectores como, por exemplo, o turismo tal pode fazer uma diferença significativa. Por isso, sem pôr em causa a possibilidade de se atingir um crescimento de 5% para as exportações, diria que ele está claramente na banda das previsões optimistas.

Um outro aspecto que pode correr pior é o do défice orçamental. As contínuas dificuldades da situação económica podem levar em 2004 a cobranças de impostos ainda mais abaixo do previsto do que o que sucedeu no ano passado. Além disso, é provável que o crescimento do desemprego continue a ser muito elevado levando a um aumento correspondente das despesas de apoio aos desempregados.

O risco é que, com o objectivo de 3% do PIB como referência para o défice se vá, durante o ano, cortando mais as despesas de investimento público levando a um maior decréscimo da procura interna.

Em relação ao que poderá correr melhor, podemos olhar para a balança de pagamentos. Efectivamente, o défice da balança corrente mais balança de capital com o exterior (que nos dá o défice externo que realmente temos de financiar de forma não gratuita), embora descendo em 2003 devido à recessão, manteve-se ainda num valor demasiado elevado (cerca de 3% do PIB).

Principalmente tendo em conta, justamente, que se tratou de um ano de recessão em que as importações, devido à queda do PIB, se reduziram. O défice previsto para este ano é de cerca de 1,5% do PIB, um valor já aceitável e que pode ainda ser melhor se a descida do dólar vier a aliviar algumas facturas de importação nomeadamente a petrolífera (isto, claro, supondo que se não há uma quebra das exportações em relação ao previsto).

É importante mantermos um défice externo reduzido nesta fase - que provavelmente se prolongará durante alguns anos - de baixo crescimento, uma vez que, quando houver de novo um crescimento mais rápido, as importações irão crescer também ainda mais rapidamente arrastando consigo o défice. Acresce que a provável redução dos fundos estruturais a partir de 2007 irá reduzir o peso reequilibrador do saldo da balança de capital.

Tudo visto e ponderado não há razão para sermos muito pessimistas em relação 2004 a não ser (e não é pouco) no que respeita ao desemprego. Mas também não devemos esquecer que a recessão continua a espreitar no horizonte. Basta que as exportações não consigam atingir um crescimento razoável para termos de novo o PIB a recuar.

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