Opinião
Os contribuintes
Alude-se, frequentemente, que há contribuintes a perder direitos. Somos avessos a que, por razões extrafiscais, se beneficiem fiscalmente uns cidadãos em detrimento de outros, mesmo tratando-se de reformados, deficientes, autores, inventores, profissionai
O princípio da igualdade (cf. art. 13º da Constituição) não deveria subverter-se. O auxílio a pessoas carentes competirá aos ministérios e serviços específicos mas não à fiscalidade, que deve assentar em leis com abstracção e generalidade, excluídas de particularismos, excepções, complexidades e instabilidade1.
Mantém-se, há vários decénios, arbítrios fiscais, pseudo direitos, ditos adquiridos, mas desajustados, criados por legislação favorecedora de uns em relação a outros, por motivos não inteiramente transparentes, ou (pelo menos) algo controverso. O actual primeiro-ministro e o seu Governo têm procurado suprimir, ou reduzir, desigualdades e diferenças de tratamento fiscal, o que não é fácil, a ponto de, contrariamente, se verificarem retrocessos ou alterações a medidas inicialmente anunciadas.
A lei fiscal (como as demais) tem de ser genérica e abstracta, atingindo todas as categorias de contribuintes.
Os défices orçamentais estruturais seriam de mais fácil eliminação caso se eliminassem exclusões de impostos, concedidas a certas categorias de pessoas ou situações, acabando com os excessivos sigilos, recursos a offshores, a declarações e atestações incorrectas, eventos estes frequentes e, de modo geral, do conhecimento de quase todos nós.
Assuntos como estes são demasiado sérios e difíceis de contrariar, não sendo fácil optar por soluções radicais – o Estado tem de medir efeitos de suas acções. Seria seu dever olhar em particular para os desprotegidos e ameaçados, acabando com os favorecimentos de certos contribuintes, que continuam em matéria de impostos a não pagar o devido, sobrecarregando-se, por isso, os demais.
A equidade fiscal impõe que não se favoreçam, indevidamente, uns contribuintes em detrimento dos demais. Seria bom suprimir leis excessivamente garantísticas e complicadas que acabam por acarretar desigualdades, dando protecção aos que dispõem de mais meios para utilizar soluções sigilosas, declarações falsas de residências (etc.).
O Direito Fiscal, sob pretextos interesseiros de alguns ou por via de redes de cumplicidades e de pressões de outros, na base de regulamentações algo discutíveis e demagogicamente aprovadas, conduziu a soluções reprováveis.
O que fazer? Eliminar o que está mal e não fingir que se faz, deixando tudo na mesma. O cepticismo e a incredibilidade são grandes, mas há que não desistir, estar atento aos sinais e actuar. Talvez seja bom incutir esperanças de que é possível morigerar, melhorar as situações em relação ao que está mal, desvelando se o que se oculta é ilícito ou ilegal.
Compete ao Estado, aos legisladores e aos portugueses em geral, à opinião pública, aos partidos políticos, pugnar por trazer à Fiscalidade os muitos milhões de euros que fogem à tributação e que geram descontentamentos e reacções de quem cumpre suas obrigações fiscais.
1 Cf. o nosso A Tributação dos Rendimentos, Almedina, em especial, págs. 24 e segs.