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28 de Julho de 2006 às 13:59

O risco das longas eleições do Congo

Semanas atrás falámos aqui na tendência das Nações Unidas, e da Comunidade Internacional, em se retirarem das zonas criticas cedo demais.

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Esse é mais uma vez o risco que corre a República Democrática do Congo, Congo (K), se uma vez realizadas as eleições, objectivo dos 400 milhões de dólares investidos no processo, a força de manutenção de paz reduzir os seus efectivos e parte dos observadores retirarem antes de conhecidos os resultados - em Setembro.

O risco porém prolonga-se para além de Setembro. Conhecidos os vencedores das Presidenciais e a maioria parlamentar é necessário por em marcha um programa de estabilização e boa governação, que já está delineado pelo PNUD e num documento de estratégia para a redução da pobreza que deverá ser adoptado pelo novo Governo. Estima-se que serão necessários cinco anos para que este programa faça sentir os seus efeitos através do aumento de financiamentos internacionais interligados à responsabilização pelas despesas, transparência governamental e combate à corrupção.

As eleições para que Joseph Kabila conduziu o país serão as primeiras desde que Patrice Lumumba se tornou Primeiro-ministro em 1960 após um conturbado processo de independência.

Lumumba foi assassinado um ano depois, em 1985 Mobutu Sesse Seko, um obscuro sargento do exército colonial belga, promoveu um golpe de Estado. Os inimigos políticos e a oposição foram eliminados e o país governado com mão de ferro. Foram 40 anos de ditadura que favoreceram Mobutu, familiares e amigos (compatriotas e multinacionais) e tornaram o país potencialmente mais rico de África num dos mais pobres do Mundo.

A dimensão, riqueza e localização geoestratégica do Congo (K), fazendo fronteira com nove países, detendo 30 por cento das reservas mundiais de cobalto, na zona Leste junto do Uganda, Burundi e Rwanda, além de uma imensidão de recursos minerais, de água e floresta tornaram-no um alvo para os seus vizinhos. Só o sistema hídrico do país tem capacidade para produzir energia eléctrica para todo o Continente.

Com o final da Guerra Fria, Mobutu Sesse Seko deixou de ter qualquer interesse para Washington e outros aliados que passaram a ver nele um conhecimento incómodo. Laurent-Désiré Kabila, pai do actual Presidente levou a cabo, em 1977, um golpe de Estado, apoiado por outros países da região e empresas estrangeiras.

O novo Presidente não foi capaz ou não se empenhou o suficiente na mudança do clima económico, no combate à corrupção e no desenvolvimento do país. A inflação chegou a atingir em 2000, 511 por cento. Laurent-Désiré procurou limitar a influência do Rwanda e Uganda que a pretexto de combaterem a sua oposição armada invadiam frequentemente as províncias do Leste, as mais ricas.

A resposta às pressões dos seus vizinhos abriu aquilo a que se chamou a Primeira Guerra Mundial africana envolvendo Angola, Namíbia e Zimbabwe em apoio de Kabila contra o Uganda e Rwanda que se pretendiam apoderar dalgumas zonas das províncias do Leste, onde se encontra o cobalto e diamantes de grande qualidade.

Laurent-Désiré que fora acolhido triunfalmente em Kinshasa depondo Mobutu foi buscar para o Governo Etienne Tshisekedi, um arqui-rival de Mobutu. Em 1998 incompatibiliza-se com o seu PM e destitui-o retirando-lhe os direitos políticos e impondo um exílio interno.

O primeiro cessar-fogo foi assinado em 1999 prevendo uma partilha de poder entre as várias facções congolesas. O novo Governo foi apoiado por Angola Namíbia e Zimbabwe, contudo os combates continuaram no Leste do Congo (K). A estabilidade nunca se impôs apesar dos esforços das forças internacionais e da ONU procurando desarmar as milícias hutus, bunyamulengues, tutsis, etc.

Em Janeiro de 2001 Laurent-Désiré é assassinado e Joseph Kabila herda a presidência.

Dos 33 candidatos à Presidência da Republica Joseph Kabila é tido como o favorito. Porém de fora está Etienne Tshisekedi que inicialmente recusou participar nas eleições e convenceu milhões de pessoas a não se recensearem. Quando já era tarde Tshisekedi decidiu candidatar-se. A sua exclusão imposta por lei mas estudada certamente pelo próprio irá deixar uma margem de contestação ao vencedor que não garante qualquer estabilidade no país.

A demora no apuramento dos resultados também não será benéfica mas difícil de ultrapassar não pela extensão territorial mas pela ausência de infra-estruturas. As comunicações são praticamente inexistentes e dos 145 mil quilómetros de estradas só 2.500 são asfaltados. Acrescente-se a isto a insegurança, o clima, e as dificuldades geográficas naturais.

A segurança continuará a ser um problema muito para além das eleições garantidas por 17 mil capacetes azuis apoiados por uma força de dois mil homens da União Europeia; cinco mil observadores nacionais e 500 internacionais.  Efectivo cuja tendência será reduzir após as eleições ou no limite depois de conhecidos os resultados definitivos.

Uma certeza apenas: o acto eleitoral nas actuais condições é um exemplo da mobilização internacional e para a região. Uma dúvida: se a Comunidade Internacional vai garantir o sucesso do acto ou lavará as mãos depois dele ou da posse dos novos eleitos.

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