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23 de Outubro de 2006 às 13:59

O indispensável envelhecimento activo

Na sequência de um acordo assinado entre o Governo e os parceiros sociais (à excepção da CGTP), o Conselho de Ministros aprovou no dia 12 de Outubro a Lei de Bases da Segurança Social e um conjunto dos diplomas que propõem reformar o sector.

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As linhas estratégicas desta reforma prevêem a introdução de um factor de sustentabilidade para efeito do cálculo das pensões ligado ao aumento da esperança média de vida e marcam, no seu conjunto, um assinalável "virar de página" nas políticas sociais promovendo, pela primeira vez, o envelhecimento activo. 

Como é sabido, a generalidade dos países ocidentais, em particular os europeus, confronta--se actualmente com o problema da sustentabilidade financeira do sistema público da Segurança Social, ameaçada por dois factores principais: a evolução demográfica e a saída precoce de muitos trabalhadores do mercado de trabalho.

Desde logo porque, no plano demográfico, estes países enfrentam uma inédita diminuição da taxa de natalidade acompanhada de um aumento da esperança média de vida. E se a taxa de natalidade preocupa pelas suas repercussões na configuração da população activa, o envelhecimento da população parece ser ainda mais inquietante. Por exemplo, de acordo com as estimativas do Eurostat – e considerando já factores como a natalidade, a mortalidade e os fluxos migratórios –, espera-se que em 2050 países como Portugal registem uma das percentagens mais elevadas de pessoas com mais de 65 anos (e, pelo contrário, uma das mais baixas de pessoas até aos 64 anos) da União Europeia (UE). Perante um cenário de acentuada diminuição de população activa, os especialistas alvitram a necessidade de assegurar um imprescindível crescimento populacional através de uma de duas soluções: a primeira passa por desenvolver políticas que permitam recuperar a taxa de natalidade, nomeadamente mediante a concessão de benefícios fiscais e outros incentivos às famílias; a segunda pelo incentivo à imigração. 

Depois porque, paralelamente a estes fenómenos demográficos de diminuição da natalidade e do aumento da esperança de vida, algumas das políticas públicas de emprego (por exemplo, que visavam baixar a idade de reforma) e das opções de gestão de recursos humanos desenvolvidas no mercado de trabalho (por exemplo, o recurso frequente à figura da revogação por mutuo acordo) que convidam os trabalhadores na meia-idade a retirar-se precocemente, têm contribuído para o desequilíbrio financeiro dos sistemas públicos de segurança social. De facto, e mormente nas últimas duas décadas, a aceitação destas políticas e destas opções de gestão transformou muitos trabalhadores na meia-idade em beneficiários de reformas e/ou do subsídio de desemprego, onerando fortemente o sistema.

De momento, a situação é de tal forma grave que a Comissão Europeia (CE) estima que, até 2030, na UE a população activa reduza em 20 milhões de pessoas e que a população idosa com mais de 80 anos cresça em 15 milhões de pessoas. Segundo os dados da CE – se se considerar a globalidade dos aspectos económicos, demográficos e financeiros –, os países que têm uma situação de risco mais elevado são Portugal (onde se estima que o endividamento público possa chegar aos 528%), Hungria, Grécia, República Checa, Eslovénia e Chipre. 

Ora, no caso de Portugal, e considerando que pode estar em causa a falência do sistema público de segurança social, a reflexão sobre esta temática é sobremaneira premente. E – como tive a oportunidade de alertar em artigo publicado no n.º 14/15 da revista Sociedade e Trabalho, do Ministério da Segurança Social e do Trabalho, 2001 – o envelhecimento da sociedade europeia convoca, com urgência, a uma mudança de paradigma laboral. Existe uma "outra via", para além do incremento da natalidade e da imigração, que passa por alterar mentalidades. A maioria das pessoas com 55 anos de idade ou mais permanecem vitais e, se pretenderem continuar a trabalhar, é preciso que os empregadores olhem de forma positiva, e sem preconceitos, a sua manutenção e/ou o seu regresso à vida activa. Por exemplo, a Holanda foi paradigma desta inversão de mentalidades. Desde 2001 que a contratação de trabalhadores seniores está em crescimento e numerosas empresas – que há alguns anos se recusavam empregar estes trabalhadores – reconsideram agora a sua política de recrutamento. Por outro lado, muitos trabalhadores com 55 ou mais anos mostram-se disponíveis para se manterem no activo, quer a tempo completo, quer a tempo parcial.

Por tudo isto, e no seu conjunto – aliás, como foi há dias reconhecido pelo comissário europeu dos assuntos económicos e financeiros, Joaquín Almunia –, as medidas adoptadas pelo governo de José Sócrates em matéria de políticas de envelhecimento activo, porque necessárias e urgentes, representam um assinalável reforço na sustentabilidade do sistema público de Segurança Social.

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