Opinião
Na cauda da Europa
Uma notícia do passado fim-de-semana no Jornal Expresso deixou-me suficientemente curioso a ponto de a usar como introdução a este artigo.
José Carvalho, Cap Gemini Ernst & Young
Uma notícia do passado fim-de-semana no Jornal Expresso deixou-me suficientemente curioso a ponto de a usar como introdução a este artigo. A notícia baseava-se em dados obtidos no último relatório da Comissão Europeia sobre a Situação Social na União Europeia.
A curiosidade na leitura do artigo começou pelo facto dele mencionar aspectos relativos à educação/formação dos portugueses, comparando-os com os europeus e, acentuou-se quando comecei a verificar que em quase todos os indicadores, estamos na cauda da Europa Comunitária.
Curioso, só descansei quando descobri o tal estudo e, para que possam partilhar da minha preocupação deixo-vos aqui alguns indicadores relevantes:
Os indicadores deste quadro deixaram-me surpreso e, confesso, um pouco confuso. Por isso vou tentar analisá-los neste artigo. A primeira ilação que se pode tirar é a de que, a nível de processos educativos, o nosso país está mal. Uma taxa de 43% referente ao abandono escolar precoce, apenas 38% da população activa entre os 25 e 29 anos a ter completado o ensino secundário de nível superior e apenas 3% da população a manter processos formativos ao longo da vida, não é brilhante. Mas isso, também já o sabíamos e aliás, são os próprios governantes a admiti-lo. O que mais me espanta é a incapacidade que este país tem tido para solucionar este problema que é já crónico.
Analisando um pouco melhor os dados verificamos que o nível de desemprego em Portugal é baixo, se comparado com os seus pares da Europa Comunitária o que significa que as pessoas (em princípio) estão a trabalhar mas não têm, nem adquirem ao longo da sua vida profissional, competências que as ajudem a desenvolver o seu trabalho de uma forma qualificada. E isto constitui, sem dúvida alguma, uma enorme limitação num mercado tão competitivo como o actual.
Em paralelo constatamos ainda que, proporcionalmente, investimos mais que a média comunitária em educação. Mesmo tendo em atenção que partimos de um estádio muito atrasado em relação aos restantes países da Europa, a conclusão imediata que se tira é a de que não estamos a aproveitar adequadamente o investimento que realizamos. E, neste enquadramento, há que atribuir responsabilidades contudo, quando se fala em atribuir responsabilidades as opiniões dividem-se entre os que acham que a culpa é dos governantes e os que pensam serem as empresas as responsáveis. Afinal em que ficamos?
Na minha opinião a responsabilidade da situação em que nos encontramos, no que diz respeito à educação, é tanto do Governo como das empresas. Se o governo é responsável pela ineficácia do ensino escolar e académico, bem como pela forma como geriu ineficazmente muitos milhões de euros, provenientes da Comunidade para financiar acções de formação profissional, também as empresas são responsáveis por não considerarem como fundamental a rubrica da formação nos seus orçamentos anuais.
A Cap Gemini Ernst & Young preocupa-se com este problema a dois níveis: enquanto consultora dispondo de variadissimas ofertas na área de recursos humanos nomeadamente, Strategic HR Framework, Competency ModellingTM, Strategic Performance Management, Activity Based Management, Change Management, e Training, entre outras ofertas relevantes para o desenvolvimento de competências e qualificações dos colaboradores das organizações. Enquanto entidade empregadora, reconhecendo que o seu bem mais precioso são os recursos humanos, tenta na medida do possível aplicar as metodologias e práticas que implementa nos seus clientes.
Todas as práticas a que me refiro podem ser agregadas naquilo que designamos por um programa de Gestão Integrada do Capital Humano, em que a formação profissional com as suas várias componentes é um elemento fundamental. Assim acontece nos países nórdicos, curiosamente os que lideram em quase todos os indicadores. Uma adequada estratégia de formação deverá ainda alinhar os diferentes modelos organizativos com o modelo tecnológico subjacente.
Igualmente importante se torna alinhar o modelo de Gestão de Recursos Humanos/Competências face às necessidades de Formação, não esquecendo que um adequado processo de Gestão da Mudança, em que a Comunicação / Sensibilização assume um papel chave, é fundamental para o sucesso da formação.
Infelizmente estamos muito longe de tudo isto em Portugal e, enquanto o Estado não encarar o problema da educação como decisivo para a competitividade de Portugal a médio prazo, enquanto as empresas não entenderem que sem colaboradores qualificados não conseguirão sobreviver no competitivo mundo da União Europeia e, enquanto não se encararem os processos formativos no âmbito de um programa de Gestão Integrada do Capital Humano, continuaremos a viver na cauda da Europa com as consequências nefastas que daí advêm.
E, o mais grave, é que qualquer medida que se implemente neste contexto só produz efeitos a médio/longo prazo. Será que só nos resta esperar?
José Carvalho
Vice-President
Cap Gemini Ernst & Young
Artigo publicado no Jornal de Negócios – suplemento Negócios & Estratégia