Opinião
Estruturas com pés de barro
Há trabalhadores que são especialistas na sua acção e garantem resultados, mas não têm condições para responder a novos desafios. Qualquer mudança é entendida como uma ameaça inultrapassável.
Na sociedade actual revela-se fácil apontar críticas aos modelos de gestão das organizações, às características dos seus efectivos, às condições em que os trabalhadores exercem a sua acção, à conjuntura e, ainda, às opções políticas no que ao trabalho se refere.
Assim, o verdadeiro desafio consiste, presentemente, em reflectir sobre algumas das fragilidades estruturais com que as organizações são confrontadas e nos seus impactos em termos de gestão de pessoas. Revela-se urgente investigar e investir nos alicerces das organizações, abolindo as barreiras que directa ou indirectamente podem condicionar o sucesso numa altura em que tanto se fala da necessidade de competitividade e eficiência.
Se, por um lado, procuram-se trabalhadores flexíveis, cuja força esteja centrada não só na qualidade do desempenho mas também na sua capacidade de se adaptarem a novas circunstâncias e integrar de forma positiva novas experiências e desafios; por outro, verifica-se que poucas foram as organizações que investiram na polivalência funcional dos seus trabalhadores.
A formação ancorada em modelos de treino mais ou menos funcional foi, na maioria dos casos, entendida como forma das organizações superarem as suas limitações decorrentes da desactualização do trabalhador face à evolução da tecnologia, tendo pouco mais sido feito.
Numerosos trabalhadores dedicaram toda a sua vida a uma organização e muitas das vezes a uma função. A sua evolução centrou-se no desenvolvimento de uma crescente eficiência no desempenho das suas tarefas habituais.
Tais trabalhadores são especialistas na sua acção e garantem resultados, mas não têm condições para responder a novos desafios e qualquer mudança é entendida como uma ameaça inultrapassável.
Esta realidade conduz a que, actualmente, muitas organizações tenham uma estrutura com "pés de barro", ou seja, a sua base produtiva seja constituída, maioritariamente, por trabalhadores envelhecidos, formados na escola do saber fazer, com baixa capacidade competitiva e frequentemente desmotivados e assustados com as medidas e desafios que a actualidade lhes impõe.
Embora a formação consista num dever legal, nem sempre o empregador e o trabalhador reconhecem as vantagens da sua utilização e o imperativo da sua actualização.
Neste âmbito, diferentes perspectivas coexistem. Não sendo contraditórias, encerram planos de acção diferentes e impõem motivações, custos e resultados diversos.
A formação pode ter um propósito reactivo quando decorre de uma necessidade presente, imposta, geralmente, pela adopção de novas tecnologias ou novas formas de estruturar a acção.
Por outro lado, pode ser proactiva, na medida em que visa criar respostas e soluções para necessidades futuras. Esta última perspectiva, resulta, frequentemente, de opções de reestruturação funcional ou adopção de novas configurações organizacionais.
A primeira perspectiva (formação reactiva) é a mais tradicional, configurando, frequentemente, uma formação de tipo treino, mais orientada para a aprendizagem, para a acção e desenvolvimento de capacidades e eficiência do desempenho. A segunda perspectiva (formação proactiva) encontra-se mais direccionada para o desenvolvimento de competências individuais de longo prazo.
Como se infere da análise das organizações nacionais, os modelos tradicionais são mais facilmente integrados na gestão táctica de recursos humanos, enquanto os modelos de desenvolvimento de competências apelam a modelos de gestão estratégica de recursos humanos.
Os modelos tradicionais emergem de um quadro de necessidades imediatas ou facilmente identificáveis no desempenho organizacional e surgem como um custo complementar à decisão de adopção de novas tecnologias. Os modelos de desenvolvimento de competências obrigam, por sua vez, a uma reflexão prospectiva das condições de evolução de mercado e posicionamento futuro da empresa.
Em suma, a formação tradicional tende a ser considerada como um custo associado à necessidade de modernização da empresa, emergindo a partir desta como opção táctica para garantir a adequação dos seus recursos humanos actuais. A perspectiva estratégica da formação que visa o desenvolvimento de competências mais do que capacidades, em vez de uma perspectiva de custo, orienta-se por uma lógica de investimento com retorno diferido no tempo.
Neste ultimo caso, embora possa ser uma responsabilidade assumida pela organização, a sua gestão passa por uma repartição de responsabilidades entre a organização e os trabalhadores.
Constituindo uma estratégia de futuro, as iniciativas de desenvolvimento, frequentemente, emergem da iniciativa e interesse dos próprios trabalhadores, cabendo à organização identificar, avaliar e apoiar estas iniciativas no sentido de as potenciar como mais-valias futuras.
Tal processo apoia a retenção de talentos, permitindo maior poupança de custos com o recrutamento, selecção e formação de novos trabalhadores e garante à empresa condições de competitividade para futuro.
De igual forma, ao dar uma perspectiva de futuro e ao capacitar os trabalhadores, actua no sentido da motivação e envolvimento nas estratégias de compromisso de desenvolvimento da empresa.
Face ao exposto, resulta evidente a importância de alinhar as condições de desenvolvimento dos trabalhadores com os objectivos organizacionais de longo prazo. Além de que, "as constantes mudanças operadas no mundo do trabalho recomendam a necessidade continua de formar, re-formar e transformar as competências e conhecimentos dos colaboradores de uma empresa". Cada vez mais, a formação revela-se ser "um bom investimento, tanto a nível individual como organizacional e mesmo nacional" 1.
TOME NOTA
1. É urgente investigar e investir nos alicerces das organizações, abolindo as barreiras que directa ou indirectamente podem condicionar o sucesso;
2. Poucas foram as organizações que investiram na polivalência funcional dos seus trabalhadores;
3. Actualmente, muitas organizações têm uma estrutura com "pés de barro";
4. A formação pode ser reactiva ou proactiva, sendo que esta última actua no sentido da motivação e envolvimento nas estratégias da empresa;
5. O desenvolvimento dos trabalhadores e os objectivos organizacionais de longo prazo devem estar sempre alinhados.
1 Cfr., Gomes, Jorge F e outros (2008), Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano, Lisboa, Edições Sílabo.
*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt
** Docente Universitária
acsd.duarte@gmail.com
Assim, o verdadeiro desafio consiste, presentemente, em reflectir sobre algumas das fragilidades estruturais com que as organizações são confrontadas e nos seus impactos em termos de gestão de pessoas. Revela-se urgente investigar e investir nos alicerces das organizações, abolindo as barreiras que directa ou indirectamente podem condicionar o sucesso numa altura em que tanto se fala da necessidade de competitividade e eficiência.
A formação ancorada em modelos de treino mais ou menos funcional foi, na maioria dos casos, entendida como forma das organizações superarem as suas limitações decorrentes da desactualização do trabalhador face à evolução da tecnologia, tendo pouco mais sido feito.
Numerosos trabalhadores dedicaram toda a sua vida a uma organização e muitas das vezes a uma função. A sua evolução centrou-se no desenvolvimento de uma crescente eficiência no desempenho das suas tarefas habituais.
Tais trabalhadores são especialistas na sua acção e garantem resultados, mas não têm condições para responder a novos desafios e qualquer mudança é entendida como uma ameaça inultrapassável.
Esta realidade conduz a que, actualmente, muitas organizações tenham uma estrutura com "pés de barro", ou seja, a sua base produtiva seja constituída, maioritariamente, por trabalhadores envelhecidos, formados na escola do saber fazer, com baixa capacidade competitiva e frequentemente desmotivados e assustados com as medidas e desafios que a actualidade lhes impõe.
Embora a formação consista num dever legal, nem sempre o empregador e o trabalhador reconhecem as vantagens da sua utilização e o imperativo da sua actualização.
Neste âmbito, diferentes perspectivas coexistem. Não sendo contraditórias, encerram planos de acção diferentes e impõem motivações, custos e resultados diversos.
A formação pode ter um propósito reactivo quando decorre de uma necessidade presente, imposta, geralmente, pela adopção de novas tecnologias ou novas formas de estruturar a acção.
Por outro lado, pode ser proactiva, na medida em que visa criar respostas e soluções para necessidades futuras. Esta última perspectiva, resulta, frequentemente, de opções de reestruturação funcional ou adopção de novas configurações organizacionais.
A primeira perspectiva (formação reactiva) é a mais tradicional, configurando, frequentemente, uma formação de tipo treino, mais orientada para a aprendizagem, para a acção e desenvolvimento de capacidades e eficiência do desempenho. A segunda perspectiva (formação proactiva) encontra-se mais direccionada para o desenvolvimento de competências individuais de longo prazo.
Como se infere da análise das organizações nacionais, os modelos tradicionais são mais facilmente integrados na gestão táctica de recursos humanos, enquanto os modelos de desenvolvimento de competências apelam a modelos de gestão estratégica de recursos humanos.
Os modelos tradicionais emergem de um quadro de necessidades imediatas ou facilmente identificáveis no desempenho organizacional e surgem como um custo complementar à decisão de adopção de novas tecnologias. Os modelos de desenvolvimento de competências obrigam, por sua vez, a uma reflexão prospectiva das condições de evolução de mercado e posicionamento futuro da empresa.
Em suma, a formação tradicional tende a ser considerada como um custo associado à necessidade de modernização da empresa, emergindo a partir desta como opção táctica para garantir a adequação dos seus recursos humanos actuais. A perspectiva estratégica da formação que visa o desenvolvimento de competências mais do que capacidades, em vez de uma perspectiva de custo, orienta-se por uma lógica de investimento com retorno diferido no tempo.
Neste ultimo caso, embora possa ser uma responsabilidade assumida pela organização, a sua gestão passa por uma repartição de responsabilidades entre a organização e os trabalhadores.
Constituindo uma estratégia de futuro, as iniciativas de desenvolvimento, frequentemente, emergem da iniciativa e interesse dos próprios trabalhadores, cabendo à organização identificar, avaliar e apoiar estas iniciativas no sentido de as potenciar como mais-valias futuras.
Tal processo apoia a retenção de talentos, permitindo maior poupança de custos com o recrutamento, selecção e formação de novos trabalhadores e garante à empresa condições de competitividade para futuro.
De igual forma, ao dar uma perspectiva de futuro e ao capacitar os trabalhadores, actua no sentido da motivação e envolvimento nas estratégias de compromisso de desenvolvimento da empresa.
Face ao exposto, resulta evidente a importância de alinhar as condições de desenvolvimento dos trabalhadores com os objectivos organizacionais de longo prazo. Além de que, "as constantes mudanças operadas no mundo do trabalho recomendam a necessidade continua de formar, re-formar e transformar as competências e conhecimentos dos colaboradores de uma empresa". Cada vez mais, a formação revela-se ser "um bom investimento, tanto a nível individual como organizacional e mesmo nacional" 1.
TOME NOTA
1. É urgente investigar e investir nos alicerces das organizações, abolindo as barreiras que directa ou indirectamente podem condicionar o sucesso;
2. Poucas foram as organizações que investiram na polivalência funcional dos seus trabalhadores;
3. Actualmente, muitas organizações têm uma estrutura com "pés de barro";
4. A formação pode ser reactiva ou proactiva, sendo que esta última actua no sentido da motivação e envolvimento nas estratégias da empresa;
5. O desenvolvimento dos trabalhadores e os objectivos organizacionais de longo prazo devem estar sempre alinhados.
1 Cfr., Gomes, Jorge F e outros (2008), Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano, Lisboa, Edições Sílabo.
*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt
** Docente Universitária
acsd.duarte@gmail.com
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