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30 de Abril de 2010 às 11:46

Declarações de guerra versus defesa proactiva e cooperação

(Onde inevitavelmente se volta ao tema da crise financeira, da notação da S&P, dos nossos psicadélicos governantes, duma potencial meia-mudança de discurso e da aproximação Sócrates-Passos Coelho, enquanto se limpa o sangue derramado na bolsa com uma esfregona.)

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Confesso que na terça-feira apanhei um tremendo susto com as declarações do nosso inefável Teixeira dos Santos que, de Angola, se pôs a mobilizar o País contra os especuladores que atacavam o País. Como se sabe, as atitudes de machismo ibérico assarapantam os mercados e, por isso, temi para o dia seguinte incursões de guerrilheiros portugueses, comandados pelo apropriado ministro da Defesa, Santos Silva, espalhando sangue e vísceras de uns anónimos e indetectáveis personagens que especulam com a dívida portuguesa, em vez de nos ajudarem, como seria seu dever cívico, até para se fazerem mais umas imprescindíveis auto-estradas adjudicadas à Mota-Engil. Lembrei-me logo das proclamações bélicas, na semana passada, do ministro das Finanças grego, povo também com muita testosterona e barba rija, o qual prometeu vida dura e perdas terríveis aos famosos especuladores, com tanto sucesso que a dívida soberana grega passou para a notação de "lixo" pela S&P - e temi igual fado para "nosotros". Claro que quem manda no vocalista é o chefe da banda, Sócrates, o "caixeiro-viajante das grandes ilusões", que, no dia 28, foi afirmando que "estamos submetidos a um ataque especulativo sem fundamento", como se algum dia tivesse ocorrido um tal assalto bem sucedido sem bons motivos estruturais.

Diga-se que nada disto é singular, antes se repetiu em todas as crises financeiras sérias de que me recordo. Até fui recapitular o famoso descalabro da libra em 1992 para me voltar a surpreender com a arrogância néscia e ignorante de John Major e do chanceler Lamont, sempre desdobrando-se em vocabulário másculo e dinâmico. Até sustento a ideia de que a intensidade das declarações de bravado é directamente proporcional ao êxito dos ataques especulativos.

É que o paleio de chacha pode servir para o mercado interno, enchendo de brio os militantes do PS, mas o que convence os agentes do mercado são os actos e não as palavras, como sempre foi e a Irlanda exemplifica, e daí o meu susto pela aparente permanência do estado de negação dos nossos JS e TS, o qual, para levar ao extremo a "cassette" "la vie en rose", só necessita de uns óculos cor-de-rosa e aros metálicos, tipo John Lennon, e umas "passas".

Graças a Deus, a tenebrosa S&P, se calhar com algum exagero, fez-nos cair dois degraus para A-, ainda assim muito longe dos humilhantes Bs ("lixo") da Grécia, pois, se, por um lado, a dívida fica mais cara, esta gente só vai lá mesmo pelo cagaço, e a terapêutica, muito dura que já tem de ser, quanto mais tarde vier pior será. O orçamento para 2010 já foi a esquiva que vimos e o PEC só era para ter início em 2011. Veja-se o sentido de urgência desta malta do cimo, ainda mais em ambiente "fantasista" e demissionário.

Como disse Santos Ferreira, "se os mercados nos atacam foi porque nos pusemos a jeito" e, realmente, os mercados são assim mesmo, às vezes duros e hostis, mas não há economia próspera que funcione prescindindo deles. Não enfrentamos um tsunami nem um vulcão, não é a força da Natureza, mas é da natureza das coisas, e gritar contra isto é fátuo, idiota e destinado a desviar atenções do essencial. Não se modifica a natureza dos mercados; para modificar são, sim, as atitudes e as medidas correctamente protectivas.

Ora, neste dia em que escrevo, sentiu-se uma mudança do tom de JS e TS, incidindo agora na adequada defesa proactiva de colmatar os pontos que são causa e suporte da adversidade dos mercados , o que é muito bem vindo. Se estivéssemos num mundo de fantasia, num barco em plena tempestade marítima, com o Capitão Gancho ao leme e o Barrica em imediato, também os apoiaríamos, não é verdade?

Por outro lado, a cooperação de Passos Coelho ainda não tem substância, mas pode trazer um efeito multiplicador e credibilizante, na frente interna. E o facto é que a imprensa económica mundial, do Financial Times à Bloomberg, noticiou com destaque a reunião a dois, pelo que algum resultado externo positivo também poderá acontecer.

Finalmente motivos para algum optimismo para a recessão que terá que vir? (1)



NOTA - Escrito em 28/4, dia em que subimos a 3º no "ranking" da FIFA, pelo que, se calhar, não seria má ideia substituir Sócrates por Carlos Queiroz.

(1) E isto se a Alemanha passar os cheques.


Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença). fbmatos1943@gmail.com
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