Opinião
Passo à frente ou atrás?
(Onde o autor, desafiando as probabilidades e os maus augúrios sobre a nossa moeda de estimação, o euro, aposta que a Alemanha, no último momento, ajudará no resgate da Europa, mesmo incluindo os países debochados, entre os quais o nosso, até por instinto de auto-preservação. Mas também adverte que, se perder, não paga).
(Onde o autor, desafiando as probabilidades e os maus augúrios sobre a nossa moeda de estimação, o euro, aposta que a Alemanha, no último momento, ajudará no resgate da Europa, mesmo incluindo os países debochados, entre os quais o nosso, até por instinto de auto-preservação. Mas também adverte que, se perder, não paga).
Toda a gente adora odiar a Alemanha, a dona da bolsa, a quem se imputa o defeito genético dos credores empedernidos, os quais invocam o risco moral nórdico e protestante em desfavor da grandiosa alma sulista do perdão devido aos pecadores, mesmo de arrependimento duvidoso. Porém, com a consciência da boa fé intelectual, convém recordar que os descendentes do Grande Reich foram arrastados para o euro, com notória insatisfação por parte deles, como paga pelo consentimento para a sua reunificação, e que ficou bem assente que o espírito da nova moeda seria germânico, um subproduto do poderoso deutsch mark anti-inflacionista.
Diz-se muito, sempre na nobre arte de alijar responsabilidades, que o sistema foi mal parido e que a presente crise que tanto nos aflige advém desse pecado original. Poder-se-ia, pois, comparar a derrocada do euro à de um edifício construído contra os bons princípios da Física, ao qual seria fácil diagnosticar uma morte súbita mas afinal anunciada. Porém, com implacável rigor e frieza intelectuais, do género que cria inimigos e incomoda os circunstantes, eu pergunto se teríamos chegado a este purgatório se os países ajuramentados cumprissem o juramento e todos tivessem executado o Pacto de Estabilidade e Crescimento, para não falar da vergonha grega de baralhar os números e pedir impunidade.
Por que será que a Finlândia está sadia e vigorosa, mas a Grécia sofre de peste negra e Portugal de febre amarela, quando todos foram submetidos ao mesmo ambiente? Os adeptos da causalidade adequada, como eu próprio, respingam que com mais Katainens e menos Sócrates não estaríamos com os cobradores à porta a ver se temos dracmas, liras ou escudos que cheguem se o euro se desagregar. Como disse há dias o "Wall Street Journal", com sobriedade tecnocrática que os nossos garbosos políticos tanto abominam, demasiados governos europeus deixaram-se aprisionar por sectores públicos improdutivos e sindicatos poderosos e, na sede de ganhar eleições, distribuíram generosas regalias que destruíram a competitividade e construíram dívidas gigantescas.
Mas a verdade é que, mesmo que sem a gravidade da invasão da Polónia, as atitudes dos "krauts" de falta de solidariedade de passageiros do mesmo barco no mesmo mar encapelado, culminando com o desafio da Merkl à Grécia para abandonar a moeda comum, são, no final, prejudiciais para eles próprios. No dia em que escrevo, o acima citado "WST" aponta, muito obviamente, que grande parte da prosperidade e sucesso económico alemães se devem à sua adesão à moeda única europeia e que a imposição de duras medidas de austeridade a parte dos seus vizinhos podem ser mal avaliadas, repercutindo-se afinal contra ela própria.
O ponto de vista que aqui apresento é, pois, este: se a orgia financeira dos países ditos periféricos é o verdadeiro causador da crise, que não é sistémica mas se tornou sistémica, a verdade é que o justo tem parte dos seus interesses em comum com o pecador, pelo que o instinto de preservação passa pela salvação de todos para que cada um, individualmente, tenha redenção.
Todos sabemos que o eleitorado alemão abomina premiar os faltosos, bem sabendo que a sua parcimónia e sobriedade financeira de formiga é que vai subsidiar essas cigarras tontas e insensatas, e, pelos últimos números, são 75% do total que assim pensam. Mas há-se ser possível inverter a tendência: Para já, muito justamente está implantada a austeridade na Europa e mais ou menos assumido como desejável o reforço dos poderes da União Europeia sobre os Estados-membros em matéria orçamental, de modo a assegurar o rigor geral das finanças pública. Agora, da Alemanha, a bem de si própria, pois não conseguirá excluir-se das reverberações, espera-se que abandone a sua política "demasiado pouco demasiado tarde", e dê o passo atrás no rumo para o abismo que a Europa do euro tomou, mesmo que seja necessário anestesiar o seu eleitorado.
Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença).
fbmatos1943@gmail.com
Assina esta coluna semanalmente à sexta-feira
Toda a gente adora odiar a Alemanha, a dona da bolsa, a quem se imputa o defeito genético dos credores empedernidos, os quais invocam o risco moral nórdico e protestante em desfavor da grandiosa alma sulista do perdão devido aos pecadores, mesmo de arrependimento duvidoso. Porém, com a consciência da boa fé intelectual, convém recordar que os descendentes do Grande Reich foram arrastados para o euro, com notória insatisfação por parte deles, como paga pelo consentimento para a sua reunificação, e que ficou bem assente que o espírito da nova moeda seria germânico, um subproduto do poderoso deutsch mark anti-inflacionista.
Por que será que a Finlândia está sadia e vigorosa, mas a Grécia sofre de peste negra e Portugal de febre amarela, quando todos foram submetidos ao mesmo ambiente? Os adeptos da causalidade adequada, como eu próprio, respingam que com mais Katainens e menos Sócrates não estaríamos com os cobradores à porta a ver se temos dracmas, liras ou escudos que cheguem se o euro se desagregar. Como disse há dias o "Wall Street Journal", com sobriedade tecnocrática que os nossos garbosos políticos tanto abominam, demasiados governos europeus deixaram-se aprisionar por sectores públicos improdutivos e sindicatos poderosos e, na sede de ganhar eleições, distribuíram generosas regalias que destruíram a competitividade e construíram dívidas gigantescas.
Mas a verdade é que, mesmo que sem a gravidade da invasão da Polónia, as atitudes dos "krauts" de falta de solidariedade de passageiros do mesmo barco no mesmo mar encapelado, culminando com o desafio da Merkl à Grécia para abandonar a moeda comum, são, no final, prejudiciais para eles próprios. No dia em que escrevo, o acima citado "WST" aponta, muito obviamente, que grande parte da prosperidade e sucesso económico alemães se devem à sua adesão à moeda única europeia e que a imposição de duras medidas de austeridade a parte dos seus vizinhos podem ser mal avaliadas, repercutindo-se afinal contra ela própria.
O ponto de vista que aqui apresento é, pois, este: se a orgia financeira dos países ditos periféricos é o verdadeiro causador da crise, que não é sistémica mas se tornou sistémica, a verdade é que o justo tem parte dos seus interesses em comum com o pecador, pelo que o instinto de preservação passa pela salvação de todos para que cada um, individualmente, tenha redenção.
Todos sabemos que o eleitorado alemão abomina premiar os faltosos, bem sabendo que a sua parcimónia e sobriedade financeira de formiga é que vai subsidiar essas cigarras tontas e insensatas, e, pelos últimos números, são 75% do total que assim pensam. Mas há-se ser possível inverter a tendência: Para já, muito justamente está implantada a austeridade na Europa e mais ou menos assumido como desejável o reforço dos poderes da União Europeia sobre os Estados-membros em matéria orçamental, de modo a assegurar o rigor geral das finanças pública. Agora, da Alemanha, a bem de si própria, pois não conseguirá excluir-se das reverberações, espera-se que abandone a sua política "demasiado pouco demasiado tarde", e dê o passo atrás no rumo para o abismo que a Europa do euro tomou, mesmo que seja necessário anestesiar o seu eleitorado.
Advogado, autor de " Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença).
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