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10 de Novembro de 2006 às 14:59

Bush e a "revolução democrata"

Depois de em 1994 Bill Clinton ter sido confrontado com a "revolução republicana"que conquistou o poder legislativo como nunca nos últimos 40 anos, George W. Bush vê-se confrontado com uma maioria democrata que tomou de assalto o Capitólio e os governos e

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George W. Terá a partir de agora de deixar de ignorar os congressistas e de os tolerar sorridente à sua mesa. Para já rolou a cabeça de Rumsfeld.

Uma recontagem de votos no estado da Virgínia é mais do que provável tendo em conta que os dois candidatos ficam separados por uma margem tão estreita onde o mais pequeno erro pode inverter o resultado. A lei do estado prevê a recontagem no caso de um candidato vencer com uma margem igual ou superior a um por cento. Em Montana a margem não foi muito diferente mas a vitória democrata colocou o Senado em empate.

A vitória dos democratas nestes dois estados é essencial para controlarem o Senado. Se republicanos e democratas ficarem empatados no Senado, o voto de desempate caberá ao vice-presidente Dick Cheney, um dos dois homens mais contestados pelos democratas (Donald Rumsfeld, secretário da Defesa é o outro). Nem isso, nem a anunciada demissão de Donald Rumsfeld, irá tornar mais fácil a vida de George W. Bush.

Independentemente da existência de uma maioria no Senado os resultados foram uma derrota pessoal de Bush. Os democratas conseguiram tornar as eleições intermédias num referendo à liderança do Presidente. Fizeram-no com tal eficácia que na última semana de campanha, quando tradicionalmente os candidatos querem a presença do Presidente, Bush ficou remetido a comparências nos estados seguros dada a demarcação clara que alguns candidatos – mesmo assim derrotados – fizeram. Os democratas insistiram numa campanha de colagem dos seus rivais a George W., mostrando filmes e fotos de Bush com os seus opositores. Ao mesmo tempo colocaram o Iraque na agenda eleitoral, a par com os escândalos de corrupção envolvendo figuras republicanas.

A política externa não é habitualmente um factor decisivo ou mesmo com grande peso na decisão dos eleitores americanos, todavia das sondagens à boca das urnas feitas por diferentes "media" norte-americanos revelaram por um lado que seis em cada dez eleitores se manifestaram contra a condução da estratégia no Iraque, porém os democratas não podem perder de vista nestas mesmas sondagens que quatro em cada dez eleitores afirmaram também estar a votar contra George W. Bush.

Nancy Pelosi, representante da Califórnia, a primeira mulher que com a maioria democrata irá assumir a presidência da Câmara dos Representantes, tirou de imediato partido deixando claro que é necessária uma mudança de estratégia e de política relativamente à intervenção americana no Iraque.

Este novo cenário no Poder Legislativo irá alterar substantivamente as relações entre o Capitólio e a Casa Branca. Mesmo com empate do Senado, George W. Bush não tem do outro lado da Pensilvânia Av., o parceiro passivo instituído pelos republicanos que permitiram ao Presidente concentrar poderes e tomar decisões unilaterais. Pelo contrário, os democratas que desde 1994 estiveram em minoria nas duas câmaras há muito que esperavam esta mudança pois os acertos de contas com a Casa Branca estão por fazer.

Bill Clinton conseguiu lidar bem com essa mudança por ter colocado a ênfase dos seus dois últimos anos de mandato em questões de interesse bipartidário, como os assuntos sociais e muito especialmente as leis orçamentais que permitiram a Clinton deixar a Bush um resultado orçamental altamente positivo. Clinton não teve de inflectir o essencial da sua governação uma vez que o envolvimento dos republicanos no processo decisivo e até na própria Administração era comum. George W. Bush poderá ter uma saída airosa para a questão iraquiana através do relatório que a comissão bipartidária está a elaborar e deverá entregar nas próximas semanas. Uma comissão presidida por um homem que se tornou notável na Administração de Bush (pai), o então secretário de Estado James Baker. Um amigo de longa data que mais de uma vez tem intervindo e socorro dos Bush.

Com a "revolução democrata" de 2006, além da reconquista da Câmara dos Representantes, dos governadores e do Senado, este com risco de empate, surgem perspectivas diferentes para as presidenciais de 2008.

Em Nova Iorque, a senadora Hillary Clinton liderou claramente a equipa democrata conseguindo uma esmagadora vitória no estado. Interessante o facto de ser evidente dos resultados que a antiga primeira-dama foi buscar votos em todo o espectro político, dos democratas liberais aos republicanos conservadores. Hillary Clinton desenha-se cada vez mais como uma forte candidata democrata à Presidência dos Estados Unidos em 2008, mesmo que para isso tivesse, como o fez, de inflectir a sua imagem liberal com um discurso apelativo até ao eleitorado conservador.
A estratégia política de George W. Bush e a sua incapacidade para controlar o orçamento contrastou vincadamente com a do seu antecessor Bill Clinton – de quem se dizia ser influenciado nas suas decisões pela mulher, Hillary. Essa associação e esse contraste são agora favoráveis às aspirações democratas de regressar à Casa Branca e às de Hillary Clinton de se candidatar.

O Presidente não tem muito para dar ao próximo candidato republicano. O "Great Old Party" (republicanos) viveu o pior ambiente eleitoral das últimas décadas e ao demarcarem-se do seu Presidente alguns candidatos republicanos revelaram a fragilidade política de Bush. Os dois últimos anos de um Presidente norte-americano têm no centro das preocupações a continuidade do partido na Casa Branca e George W. Bush o melhor que neste momento tem para oferecer é a tradicional política de "checks and balances" que caracteriza Washington. Uma imagem radicalmente diferente daquela que caracterizou as presidências de George W. Bush. Não é por acaso que os seus assessores se desmultiplicaram em declarações salientando que Bush sempre governou assim o Texas. Uma metodologia que Washington não conheceu.

Aos europeus resta agora prepararem a sua estratégia iraquiana pois seguramente não pretenderão ficar sozinhos no Iraque. Têm algum tempo. A retirada que Washington vai decidir será faseada, os democratas não irão cortar o financiamento às suas tropas. Os europeus terão também de rever a sua presença no Afeganistão. Iraque e Afeganistão vão ter de se desembrulhar com os Governos eleitos com o apoio norte-americano.

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