Opinião
A retoma alemã?
A economia alemã – a maior economia europeia e o país que mais investe directamente em Portugal – merece (não só por estas duas razões, mas também?) ser seguida com atenção. Após seis meses de governação da coligação liderada por Angela Merkel, a verdade
Quando o número de desempregados teima em rondar os 5 milhões de pessoas, a Alemanha continua a procurar respostas para relançar a sua economia e um dos seus pontos fracos é, sem dúvida, o défice público.
De acordo com o Eurostat, em 2005 o défice público alemão atingiu os 3,3% do PIB. E isto «muito graças» a um sobrecarregado sistema público de Segurança Social e a uma má orientação das políticas públicas no que respeita à «gestão das idades» no mercado de trabalho. Num país envelhecido em que cerca de 18,5% da população total tem 65 e mais anos (e onde a idade legal de reforma tem sido os 65 anos), somente 39% das pessoas com idades entre os 55 e os 64 anos trabalham.
Além disso, a taxa de desemprego, sujeita a ligeiríssimas oscilações, permanece acima dos 11%. E a maioria dos economistas não acredita em melhorias significativas para lá das conjunturalmente registadas aquando do campeonato do mundo de futebol (segundo estimativas oficiais, este acontecimento deverá permitir a criação de 50.000 empregos provisórios e de 20.000 permanentes). O sector industrial, em particular, enfrenta tempos penosos e sujeita a uma forte concorrência internacional a produção regista sucessivas quebras. Muitas das empresas reestruturam no sentido do emagrecimento organizacional ou deslocalizam para outros destinos mais atractivos, nomeadamente para a Ásia e os países do alargamento europeu, o que implica o encerramento local de unidades produtivas e o consequente aumento do desemprego.
Neste cenário o FMI estima que o défice público alemão chegue este ano aos 3,8% do PIB o que, a confirmar-se, representa o quarto ano consecutivo em que a Alemanha atinge um défice público acima do limite exigido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento. Para além disso, o FMI prevê – e não obstante uma boa performance nas exportações – que em 2006 a economia alemã apresente um crescimento de apenas 1,5% do PIB (revisto em alta em Janeiro). E ainda assim o FMI mostra-se cauteloso e adverte para o facto de a retoma do crescimento alemão poder continuar desequilibrada se não se fizer acompanhar de uma aceleração do consumo (o que é difícil para as famílias com menor poder de compra, uma vez que o fraco crescimento do emprego e dos salários refreiam o consumo).
Acresce que também os dados relativos à captação de investimento estrangeiro não têm sido positivos: em 2004 e 2005 a Alemanha conheceu um desinvestimento, quer de países parceiros da UE, quer de países fora da União Europeia (UE).
Desde a sua campanha eleitoral Merkel elegeu como objectivo principal do seu mandato a redução da taxa de desemprego. Mas a verdade é que não se têm notado visíveis melhoras. Recentemente Merkel anunciou o reforço das sanções para os desempregados de longa duração que recusam emprego (podendo estes ser afastados do subsídio se recusarem três propostas de emprego no espaço de um ano) no âmbito do plano de reforma do mercado de trabalho intitulado «Hartz IV» iniciado por Gerhard Schroeder, que procura chamar os desempregados de longa duração ao mercado de trabalho.
Ora foi neste contexto que teve lugar, na semana passada, um Conselho Económico franco-alemão que pretende renovar as relações entre a França e a Alemanha no quadro da UE. Em cima da mesa estiveram as questões ligadas ao euro e às trocas económicas entre os dois países. Para os dirigentes políticos destes países – em situação semelhante, com um crescimento fraco, uma taxa de desemprego elevada e uma perda significativa de competitividade industrial imposta pela globalização – a cooperação bilateral parece estrategicamente imprescindível para dar um impulso não só às duas economias, mas também à consolidação da UE. E, perante a actual situação de bloqueio social e económico em que a Alemanha e a França vivem, será interessante observar a evolução da aliança entre estas duas economias, fundamental também para compreender o futuro próximo da economia europeia.