Opinião
A Estratégia enviesada no Médio Oriente
As guerras não acontecem porque existem armas. As guerras dão-se quando se acredita que os conflitos só acabam quando um ou uns eliminarem o outro ou os outros.
O Iraque foi invadido por uma primeira causa invocada, a existência de armas de destruição massiva e aconteceu o que se está a ver: há guerra e não havia armas. O Hezbollah já foi mandado desarmar por duas vezes pelas Nações Unidas e é evidente para todos que não vai desarmar, até porque as armas que possuem não são dele, são de quem lhas dá - a Síria e, além do Irão, o mercado «negro» de armas. Toda a gente sabe disto! Como também já se pensa que o Irão vai resistir às sanções das Nações Unidas, construir a sua arma atómica, o que não signifique que seja capaz ou tenha vantagem em alguma vez a disparar.
A sucessão de erros dos países ocidentais que lideram a «actuação» do Ocidente no Médio Oriente, digamos assim, tem sido estimulante de tudo o que é mau, desde o terrorismo à estratégia da hipocrisia política praticada por todos os interessados e participantes no conflito, com efeitos na vertente militar e nos seus redundantes sacrifícios humanos.
A ONU e a comunidade internacional têm de adoptar, de uma vez por todas, alguns princípios basilares de uma convivência de Paz, que passam por aceitar que o Mundo pertence aos homens e às comunidades humanas onde quer que estas vivam e que a sua organização política, em Estados, é um desejo/sentimento sempre respeitável por todos. Assim, discutir se Israel tem direito a existir é entrar na lógica dos que dizem que se este Estado foi constituído por causa (ou má consciência) do Holocausto, então que o tivessem instalado na Alemanha ou no país que tem mais judeus no mundo - os EUA - ou, ainda, num sítio de onde não houvesse que desalojar ninguém. Este argumento é logicamente imbatível. Só que Israel já existe, e, tal como a Palestina, têm - hoje – o direito de existir os dois. A realidade, porém, com a responsabilidade de ambos, opõe-se ao reconhecimento mútuo deste direito, sem reservas.
É evidente, para o meu ponto de vista, que a melhor solução para os palestinos e para os israelitas seria viverem ambos no mesmo espaço. Mas também é evidente a impossibilidade de dois Estados políticos terem, além de duas nações, o mesmo território. Todavia, esta fórmula nunca experimentada no Mundo, até ao momento impossível (?), seria a que melhor respondia aos atentados sobre os direitos humanos dos deslocados, eliminaria as doutrinas expansionistas de algumas forças políticas de Israel, construiria uma solução só dependente da vontade das populações, independente dos interesses estratégicos dos Americanos e dos americano-dependentes, do Irão e doutros interesses políticos em jogo e disputa no Médio Oriente. Porém, se as duas nações não podem viver no mesmo espaço, pelo menos que se criem as condições para que o possam em espaços contíguos. Esta, a obrigação que se impõe à comunidade internacional, a concretizar sob a liderança da ONU.
As últimas resoluções da ONU, inspiradas por Bush e Chirac, do cessar fogo e do afastamento do Hezbollah da fronteira e do seu «pouco claro desarmamento» continua nos erros do passado, numa estratégia que confunde a vontade de fazer a guerra com a existência de armas necessárias para a fazer. Dá vontade de lhes dizer que uma guerra não é uma omeleta. Estas, sim, só se fazem com ovos. As guerras surgem onde quer que haja a vontade de as fazer, com um frasquinho de líquido apropriado e um tubo de pasta de dentes (devidamente recheado) que passe o controle do aeroporto e, mais importante, a vontade de morrer para matar, no atentado terrorista. O Inimigo é a vontade, que está na cabeça de seres humanos, capazes destas desumanidades.
Na resolução das Nações Unidas nada é dirigido a este elemento psicológico, nem a outros, de sentido oposto. O julgamento que cidadãos ocidentais fazem sobre algumas tradições religiosas islâmicas, como as que se traduzem na mutilação genital feminina, pode constituir um tal motivo de revolta que os leva a desculpar todos os excessos de Israel em termos expansionistas e de desproporção das suas reacções bélicas contra islâmicos. Estas diferenças civilizacionais são poluidoras dos julgamentos, interferem nas opiniões públicas e condicionam as políticas. As comunidades políticas internacionais e a ONU persistem em enganar-se, ignorando a existência destas realidades, com argumentos de recusa dos «incivilizados conflitos civilizacionais».
Estamos num ambiente político internacional sobre o Médio Oriente de extrema complexidade. Nenhum dos actores mais intervenientes fala claro. Estamos no esplendor da ‘estratégia indirecta’. Israel ataca o Hezbollah mas sabe que é a Síria e o Irão que o armam. Exige-se que o Líbano limite a sua acção mas sabe-se perfeitamente que não tem poder para isso e se tinha alguma vontade perdeu-a com a intervenção de Israel. Os maiores interessados nas acções e situações subsequentes a este conflito não entraram em guerra: os EUA, o Irão e a Síria, para não chegar à Arábia Saudita e ao Egipto. Interessados no catastrofismo da situação por ambições e estratégias políticas nunca reveladas publicamente nem publicamente assumidas, aqueles países agem numa hipocrisia política que tem de ser rechaçada pelas opiniões públicas esclarecidas do Mundo.