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26 de Abril de 2005 às 14:59

A construção de um nome

Giovanni Montini e Albino Luciani.
Quem são ou foram esses senhores?

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Giovanni Montini e Albino Luciani.

Quem são ou foram esses senhores?

a) Avançados do Inter de Milão;

b) Expoentes do cancioneiro romântico italiano dos anos 50;

c) Piloto e co-piloto vencedores da primeira edição do Rali de Montecarlo;

d) Papas.

Acertou quem assinalou a opção «d». Albino Luciani foi, por escassos 33 dias, João Paulo I. Mas Giovanni Battista Montini foi - e por 15 animados anos - nada menos, do que Paulo VI - o homem que fez a Igreja que conhecemos hoje, com missas em vernáculo, com o padre de frente para os fiéis, etc. E, no entanto, só lhe sei o nome de baptismo porque o procurei na internet (e quando acabar de escrever este artigo já me terei esquecido outra vez).

Karol Wojtyla ainda é nome recente e, por isso, sonante, mas voltará para o limbo onde descansam (em paz, espero) os nomes dos Papas antes de se tornarem Papas, enquanto o nome de João Paulo II (tal como o de Paulo VI) terá que se aguentar enquanto a própria História se aguentar.

E o limbo onde descansam os nomes de baptismo dos Papas pode ser outro, mas é tão brumoso quanto aquele de onde historicamente têm surgido. Já sem falar de Giovanni Montini ou de Albino Luciani, pergunto quem tinha ouvido falar de Karol Wojtyla antes que ele se tornasse João Paulo II. Os Papas eram revelados ao mundo depois de terem sido nomeados (já, portanto, com o nome papal escolhido). O nome de baptismo só vinha à luz do mundo quando aquela figura, surgida dos mistérios de um conclave cardinalício, já era outra, de que o nome de baptismo não era senão mais uma das muitas curiosidades biográficas repentina e sofregamente divulgadas pela comunicação social - tais como ter sido professor, gostar de futebol ou ser filho de marceneiro. Fosse quem fosse, tivesse os gostos ou o nome que tivesse, era sempre, aos olhos do mundo, alguém surgido d´algum limbo, d´algum não-lugar (de fora, portanto, dos conflitos) para unir os católicos e levar a paz ao mundo.

Ratzinger é diferente. Eu, que não sou italiano nem alemão nem cardeal nem padre nem sequer católico (nem crente sou!), ouço falar dele há pelo menos 15 anos. Era o mauzão, o Torquemada que impôs um ano de silêncio obsequioso ao «teólogo da libertação», Leonardo Boff - que, por incrível que pareça, foi o primeiro a, há uns 10 anos, me desfazer o estereótipo do Ratzinger-Torquemada, ao descrevê-lo como um teólogo brilhante, cheio de humor, com quem ele, Boff, gostava de polemizar.

Ratzinger, enfim, não veio de fora, mas de dentro dos muitos conflitos de que se faz a Igreja. Feito de verdades ou de mitos, Ratzinger é o nome construído. Bento XVI ainda está por construir.

PS: Não sei se alguém notou que consegui escrever mais de 20 linhas sobre o novo Papa sem usar as palavras «conservador» nem «progressista».

PPS: Carros, rua!

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