Opinião
“O mais provável é que Marcelo promulgue” Lei de Bases da Saúde
As notas da semana de Marques Mendes no seu habitual comentário na SIC. Marques Mendes fala sobre a possibilidade de Mário Centeno vir a ser o novo diretor-geral do FMI e sobre quem o pode suceder como ministro das Finanças, a promulgação ou veto da Lei de Bases da Saúde por Marcelo Rebelo de Sousa, a comissão de inquérito à CGD e o programa eleitoral do PS, entre outros assuntos
CENTENO NO FMI?
- Como se viu pelas declarações do PM à Rádio Observador, esta questão não estava nem está nos planos do Governo. Surgiu de surpresa. É um dado completamente novo. Mas atenção: há uma probabilidade séria de Centeno ir mesmo para o FMI. Não é ainda uma certeza. Mas é uma probabilidade muito séria.
- Se Centeno for para o FMI, há que dizer: é uma boa notícia para o próprio; é uma notícia prestigiante para Portugal; mas não é boa notícia para o Governo.
- Primeiro: porque António Costa "perde" o seu grande trunfo eleitoral. Muito do eleitorado moderado vota no PS mais por Centeno que por António Costa;
- Segundo: tem que encontrar um novo Ministro das Finanças e as soluções não abundam. Vieira da Silva, uma hipótese, está de saída; Mourinho Félix é competente, mas um Secretário de Estado que sobe a Ministro é sempre visto como solução de recurso; resta uma solução que, essa sim, será forte e credível: Elisa Ferreira, actual vice-governadora do Banco de Portugal.
- De resto, Elisa Ferreira, em teoria, pode fazer três lugares possíveis no curto prazo: é a mais que provável sucessora de Carlos Costa no BP em 2020; mas pode ser também Ministra das Finanças, se Centeno sair para o FMI; e pode ser Comissária Europeia, se Portugal ficar com os fundos e tiver que indicar uma mulher. E o mais curioso é que tem condições para fazer bem qualquer um destes lugares.
- Finalmente, a questão FMI acarreta uma outra consequência, em Bruxelas:
- Se Centeno continuar no Eurogrupo, a prioridade do Governo é a de tentar, como pelouro, a área do Orçamento ou Política Regional (Fundos) e o desejado é Pedro Marques para Comissário;
- Mas, se Centeno for para o FMI, tudo muda. Neste caso, ao que apurei, alarga-se o leque de pastas que interessam a Portugal. Nesse caso, podemos ter outra pasta, mais económica, e o Comissário já pode ser outra pessoa, com outro perfil.
MARCELO VETA LEI DE BASES DA SAÚDE?
- A Lei de Bases da Saúde foi finalmente aprovada anteontem. A questão que agora se coloca é: o PR veta ou promulga a lei? Uns dizem que promulgará. Outros, como Francisco Assis (Público de ontem) admitiu que vete.
- O que o PR fará não sei. Mas, se olharmos para o que Marcelo disse antes e para o que está vertido na nova lei, o mais provável é que a promulgue.
- O PR tinha sinalizado que faria um veto se a Lei de Bases proibisse as PPP na Saúde;
- Ora, a lei pode ter várias interpretações políticas (o PS faz uma, o PCP e o BE fazem outra). Mas, do ponto de vista jurídico – que é o que interessa para Belém – só há uma interpretação possível – a nova lei não fecha as portas às PPP.
- É isso o que diz expressamente a Base 25, mas sobretudo a Base 6 (a mais importante) – que o Estado pode recorrer ao sector privado e social, a título supletivo e temporário, quando tal se justificar.
- Ou seja: as PPP não estão juridicamente proibidas. Logo, em coerência, o PR deverá promulgar a lei.
COMISSÃO DE INQUÉRITO À CGD
- Acabou o Inquérito Parlamentar à CGD. Pela primeira vez com conclusões aprovadas por unanimidade. Este é um dos poucos momentos em que os deputados saem por cima. Prestigiaram-se e prestigiaram o Parlamento. Todos, da direita à esquerda, merecem uma homenagem – Cecília Meireles e Mariana Mortágua, que se destacaram, mas também Duarte Pacheco, João Paulo Correia e Paulo Sá.
- O que falta agora? A Justiça pronunciar-se. Como disse o relator da Comissão, o Deputado João Almeida, agora é o tempo de a Justiça falar. O MP está a investigar e tem de decidir se há ou não comportamentos criminosos – seja de directores, gestores ou devedores. Há ou não gestão danosa? Há ou não burlas? O MP tem de investigar.
- Espera-se é que o MP não leve nesta investigação o mesmo tempo que tem levado no caso do BES (que já vai em 5 anos de investigação).
- Agora, a pergunta que todos fazem: o que aconteceu pode voltar a acontecer? Eu diria: poder, pode. Mas é bastante mais difícil. Porquê? Sobretudo porque mudou a supervisão.
- Antes, a supervisão era do BP – burocrática e feita à distância;
- Agora, a supervisão é feita pelo BCE – imediata e intrusiva.
- O BCE está dentro dos próprios Bancos que supervisiona CGD, BCP e NB);
- Acompanha, audita e fiscaliza em tempo real. Pode até participar em reuniões do Conselho de Administração, dos Conselhos de Crédito ou de comissões especializadas.
- Esta mudança brutal na supervisão é uma garantia de confiança.
PROGRAMA ELEITORAL DO PS
- A apresentação deste programa tem duas novidades inesperadas:
- Primeira: a novidade de uma Revisão Constitucional – António Costa veio anunciar a intenção do PS de fazer uma revisão da Constituição para resolver o problema da criação de tribunais "especializados" em violência doméstica. Esta pode ser a oportunidade para uma revisão cirúrgica um pouco maior, para incluir, pelo menos, duas outras matérias – metadados e antecipação do calendário eleitoral. Por forma a que , no futuro, as eleições legislativas sejam feitas em Maio/Junho e não em Setembro/Outubro, e para que possamos ter orçamentos aprovados em Janeiro.
- Segunda: a novidade de um ataque à PGR e ao MP – A propósito da corrupção, António Costa desfere um ataque à PGR (por causa de alegada não aplicação de uma lei de 2002). Isto tem uma leitura óbvia – o PM está insatisfeito, para não dizer furioso, com o facto de o MP ter constituído arguido o ex-Ministro Azeredo Lopes. Decididamente o Governo convive mal com o MP – foi assim com Joana Marques Vidal e é assim com Lucília Gago.
- Depois, uma certeza – este programa eleitoral, que é bem estruturado, é feito e apresentado à medida do objectivo da maioria absoluta:
- Isto viu-se na apresentação. O PS foi apresentado como o partido charneira, capaz de dialogar com todos – dialoga à esquerda na Lei de Bases da Saúde; dialoga ao centro na legislação laboral.
- E vê-se no programa. A preocupação é com todos os temas sensíveis, prioritários ou que têm dado dores de cabeça ao PS: redução de impostos para a classe média; aposta no investimento público; reforço de verbas na Saúde; combate à corrupção; empenho no combate à violência doméstica.
- Do princípio ao fim, o objectivo é mesmo tentar a maioria absoluta.
PROGRAMA PARA A MAIORIA ABSOLUTA?
- Não sei se os programas ajudam muito a conquistar votos. O que sei é que, como tenho dito várias vezes, face aos resultados da governação e ao estado da oposição, há hoje uma dinâmica favorável a uma maioria absoluta.
De resto, ao que apurei, o JN do Porto publica amanhã uma sondagem da Pitagórica que é "explosiva" – "explosiva" porque é a primeira, nos últimos tempos, que dá o PS já claramente na maioria absoluta (43,2%); "explosiva" ainda porque dá o PSD com metade dos votos do PS (21,6%).
Antes de as pessoas irem para férias é uma boa notícia para o PS.
- A este respeito, repito o que disse há uma semana: o PS só depende de si próprio para obter a maioria. Só tem um obstáculo sério pela frente: a ausência de um clima de tensão e de mobilização na sociedade.
- Uma maioria absoluta exige um clima de tensão, para os eleitores se mobilizarem. Foi assim com Cavaco em 1987 (o derrube do Governo); foi assim com Cavaco em 1991 (o receio da instabilidade); foi assim com Sócrates em 2005 (a demissão do Governo Santana Lopes). Nesses três momentos havia tensão no ar.
- Agora, não há. O país está distendido, tranquilo, até anestesiado. Não há um factor de tensão e mobilização. Mas pode ser criado em Setembro, na campanha eleitoral.
FUMO BRANCO NA EUROPA
- Não há segunda oportunidade para criar uma primeira boa impressão. Ursula von der Leyen deve conhecer esta regra. O seu primeiro discurso causou muito boa impressão:
- Primeiro: foi clara no que disse e convincente na forma como disse;
- Segundo: foi inteligente ao "roubar" as grandes bandeiras dos socialistas europeus, no sentido de uma Europa mais social (porque precisa dos votos socialistas).
- É ainda cedo para concluir se estamos perante uma verdadeira líder. Nada de precipitações. Mas a verdade é que:
- Primeiro: ela ganha na gestão das expectativas. Começa com baixas expectativas e vai surpreendendo.
- Segundo: ela assumiu importantes compromissos (no plano institucional, social e do clima). Falta saber se vai ter força e apoio dos governos para cumprir. Atenção: na UE mandam sobretudo os governos.
- Terceiro: com a sua eleição voltou a ganhar força a ideia da reforma da Zona Euro. Se a nova presidente conseguir avanços nesta área já terá direito a um lugar na história.