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19 de Janeiro de 2025 às 21:28

Na relação custo-utilidade faz sentido ter uma Comissão Executiva no SNS?

No seu habitual espaço de opinião na SIC, Luís Marques Mendes fala sobre o que muda com Trump, o novo aeroporto e as eleições autárquicas, entre outros temas.

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O QUE MUDA COM TRUMP?

 

  1. Trump toma posse com o mundo muito dividido em relação ao seu mandato. Segundo uma mega sondagem internacional (28 mil inquiridos em 24 países do mundo) a divisão é grande: fora do Ocidente há grande otimismo em torno de Trump. Já na Europa e na aliada Coreia do Sul, o pessimismo é a nota dominante. O futuro dirá quem tem mais razão.

 

  1. O mais provável é que haja diferenças grandes entre o primeiro mandato de Trump e este que vai começar. O primeiro teve grande trapalhada, mas não teve grandes consequências (com exceção da redução fiscal e dos acordos de Abraão). Este pode ser bem diferente. Trump está mais profissional e tem uma legitimidade mais forte.

 

  1. Há, a meu ver, cinco áreas onde pode haver mais consequências:
  • Na imigração. Trump vai fazer deportações. Uma das suas primeiras decisões será certamente expulsar imigrantes. Isso vai ter consequências para a economia americana: falta de mão de obra. É nos EUA como na UE.
  • Na relação com a China. Vai ser uma relação fortemente musculada. E a relação musculada vai começar pela parte comercial: dificultar a entrada de produtos chineses. Com consequências: mais inflação nos EUA; menos PIB global.
  • Na relação com a NATO. Trump vai exigir que os europeus paguem mais para a NATO. Este aumento pode chegar a 3% do PIB. O que obriga a um esforço grande de financiamento. Não é de excluir que a UE venha a aprovar uma espécie de PRR para a defesa.
  • Na relação com a UE. Vai ser sempre uma relação tensa. No plano político e comercial. E a UE vai ter de definir a sua estratégia de intervenção. Vai ter de ser prudente, mas também firme. Não ligar tanto ao que Trump diz. Mas ser firme em relação ao que ele faz.
  • Na guerra da Ucrânia. Que Trump vai intervir ninguém tem dúvidas. As dúvidas são outras: quando o vai fazer e como o vai fazer. Vai agir já ou mais tarde? Vai anunciar já o fim do apoio à Ucrânia ou vai fazê-lo de modo gradual?

 

  1. Uma coisa é certa: Trump começa com uma vitória política. O cessar-fogo em Gaza é uma vitória institucional de Biden, mas é uma vitória política de Trump. O importante é que tenha acontecido. É um cessar-fogo precário e pode ser violado. Mas é muito melhor do que nada. Liberta reféns e leva ajuda humanitária a Gaza.

 

DEMISSÃO NA SAÚDE

 

  1. Depois da reportagem divulgada pela SIC, o diretor da Comissão Executiva do SNS, Gandra de Almeida, pediu a demissão. Fez bem. Não tinha alternativa.

 

  1. A ministra da Saúde vai agora escolher um substituto para Gandra de Almeida. Mas há uma questão de fundo que devia ser refletida: vale mesmo a pena ter uma estrutura como esta criada na parte final do governo anterior? Eu tenho as maiores das dúvidas.
  • Quando foi criada a Comissão Executiva do SNS, eu exprimi a minha discordância: primeiro, porque não via utilidade na sua criação; depois, porque entendia que esta nova estrutura ia ser fator de conflitos de competências com outras entidades e serviços do Ministério. É um pouco o que tem acontecido.
  • Todo este tempo volvido, a questão de fundo é esta: que utilidade prática teve, até hoje, esta nova Comissão Executiva? Alguém no país notou melhorias e benefícios? O SNS funciona melhor? Parece-me que não.
  • A sensação que fica é que se criou mais um serviço, mais uma estrutura, mais cargos, mais dirigentes e mais burocracia, sem qualquer mais-valia para o SNS, para os doentes, para os hospitais e para o país.
  • Talvez fosse ocasião de refletir sobre a real utilidade desta estrutura. Na relação custo-utilidade faz sentido ter uma Comissão Executiva no SNS? Este debate devia ser feito.

 

NOVO AEROPORTO

 

  1. Nesta questão, há três questões que surpreendem positivamente:
  • Primeiro, a rapidez com que o Governo respondeu ao relatório da ANA, de dezembro passado. O Estado não costuma ser tão célere. O que significa que há mesmo vontade de avançar com o novo aeroporto.
  • Segundo, o facto de ficar agora confirmado que na construção do novo aeroporto não haverá fundos do OE. O Governo disse-o e a ANA finalmente aceita. Muitos, legitimamente, duvidaram. As dúvidas desvanecem-se agora.
  • Terceiro, a circunstância de ter sido criada uma Unidade de Missão, no IMT, para acompanhar esta concessão e a construção do novo aeroporto. Um passo positivo. Não faz sentido que a concessão não seja acompanhada, escrutinada e fiscalizada.

 

  1. Mesmo assim, há ainda aspetos relevantes a negociar:
  • O custo da obra: a ANA estima o custo em 8,5MM€, mas Governo quer reduzir.
  • O prazo de construção: a ANA estima 12 anos e meio (junho de 2037), mas Governo quer diminuir.
  • Alargamento da concessão: ANA quer mais 30 anos de concessão (até 2092), mas Governo não aceita.
  • Aumento das taxas aeroportuárias: ANA quer que tal aconteça entre 2026 e 2030, mas Governo quer ainda negociar. Ainda não é facto consumado.

 

  1. Em suma, apesar do que há ainda a negociar, a construção do novo aeroporto tornou-se irreversível.

 

CÂMARA DE LISBOA

 

  1. O Partido Socialista marcou a semana política com o anúncio de Alexandra Leitão como candidata à Câmara de Lisboa. Pessoalmente, não me surpreende a decisão. Há meses que apontei o nome da líder parlamentar como o mais provável a apresentar pelo PS.

 

  1. Aqui chegados, há três questões a avaliar:
  • Primeiro, a natureza da candidatura. Goste-se ou não se goste, é uma candidatura forte. Alexandra Leitão é a segunda principal figura do Partido Socialista.
  • Segundo, o calendário da candidatura. Há quem sustente, mesmo dentro do PS, que a candidatura surge tardiamente. Sinceramente, não me parece. Há quatro anos, Carlos Moedas apresentou a sua candidatura mais tarde: em março.
  • Terceiro, as consequências da candidatura. Alexandra Leitão tem uma característica curiosa: é uma política que não deixa ninguém indiferente. Mobiliza à esquerda os seus apoiantes. O que pode ser uma boa noticia para a frente de esquerda. E mobiliza à direita os seus adversários. O que pode ser uma boa noticia para Carlos Moedas. Tudo isto vai fazer com que esta seja uma eleição renhida e profundamente bipolarizada.

 

  1. Posto isto, importa sempre recordar: uma eleição autárquica é, sobretudo, um referendo ao presidente da Câmara que se recandidata. Um referendo ao seu estilo, ao seu comportamento e à sua obra. Seja com o PS ou com o PSD. Por outras palavras, mais do que a vitória ou a derrota da oposição, uma eleição autárquica é, sobretudo, a vitória ou derrota do presidente da Câmara que está em funções.

 

ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS

 

  1. A decisão do Partido Socialista em Lisboa vai ter duas inevitáveis consequências: vai fazer acelerar a decisão do PSD no Porto; e, em geral, vai dar uma nova dinâmica ao processo autárquico.

 

  1. Importa avaliar alguns casos relevantes das próximas autárquicas:
  • Confirmado está apenas o candidato do PS, Manuel Pizarro. No PSD, Pedro Duarte é o desejado. Mas é possível que surja também a candidatura independente de Filipe Araújo, o número dois de Rui Moreira na CM do Porto. Se PSD e independentes não se entenderem, a vitória de Pizarro torna-se mais fácil.
  • Gaia, outro grande concelho. Confirmado está, no PS, o nome do antigo secretário de Estado do Desporto João Paulo Correia. No PSD, o desejado das bases é Luís Filipe Menezes, embora o próprio tenha dito publicamente que não deseja regressar.
  • Cascais, outro caso importante. Confirmado está apenas Piteira Lopes, o vice-presidente da Câmara, candidato da coligação PSD/CDS. No PS, o mais provável é a candidatura do deputado Marcos Perestrelo. Haverá ainda uma candidatura independente, protagonizada pelo jovem João Maria Jonet.
  • Castelo Branco, um caso surpreendente. A Câmara é liderada pelo PS. O atual presidente, Leopoldo Rodrigues, recandidata-se. O PSD surpreende ao avançar com uma coligação atípica. Uma coligação com o Movimento SEMPRE, de cidadãos próximos do PS, coligação essa liderada por António Fernandes.
  • Braga, um distrito já definido e sem grandes surpresas. Do lado do PSD, avança o candidato João Rodrigues, atual vereador. Do lado do PS, um regresso: o de António Braga, antigo deputado.

 

A NATALIDADE

 

  1. Depois de dois anos de aumento, a natalidade voltou a diminuir em 2024. No ano passado, houve menos 1133 nascimentos que no ano anterior. Não é bom sinal.
  • Os três distritos com maior número de nascimentos são, por esta ordem, Lisboa, Porto e Setúbal. Não surpreende. São os maiores distritos e distritos do litoral.
  • Os três distritos com menos nascimentos são, por esta ordem: Bragança, Portalegre e Guarda. Sendo que em Portalegre e Bragança houve, em 2024, menos de 600 nascimentos. Esta informação não surpreende, mas inquieta. Desta forma, estamos a "afunilar" ainda mais o país, agravando as desigualdades entre litoral e interior.

 

  1. Há uma lição a tirar desta realidade: a imigração é importante, mas não dispensa uma política de fomento de natalidade. A imigração ajuda a compensar o baixo número de nascimentos, mas o país não pode abdicar de incentivar o aumento da natalidade.
  • O Governo não deveria descurar este caminho. Medidas como o aumento do número de creches; formas de melhor conciliação entre a vida profissional e pessoal; ou melhorias nos instrumentos de apoio à parentalidade são linhas de orientação que importa desenvolver e aprofundar.
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