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01 de Novembro de 2020 às 21:25

Marques Mendes: decretar o Estado de Emergência faz sentido

As habituais notas da semana de Marques Mendes no seu comentário na SIC. O comentador fala sobre a pandemia, o divórcio do Bloco de Esquerda no Orçamento e a geringonça nos Açores, entre outros temas.

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PANDEMIA – AS DECISÕES DO GOVERNO

 

  1. Primeiro, os números da pandemia. A situação continua a agravar-se:
  2. Número de infetados: continuamos num crescimento exponencial;
  3. Número de internados: já estamos bem pior que na primeira fase;
  4. Número de óbitos: ultrapassámos esta semana o recorde da primeira fase;
  5. A nossa situação na Europa: estamos a meio da tabela.

 

  1. As decisões do Governo: vão na direcção certa, correspondem a orientações que há uma semana aqui defendi, embora sejam tardias e talvez insuficientes.
  2. Primeiro: percebe-se que o PM tentou recriar um ambiente de consenso. Desde logo, envolvendo na decisão os partidos e os parceiros sociais. Ainda bem. O país precisa de unidade nacional. Não se combate uma pandemia sem diálogo, sem pedagogia, sem consenso e sem coesão social.
  3. Segundo: o Governo acordou, finalmente, para a gravidade da situação. Para a urgência de ACHATAR esta onda. Já o podia ter feito. A Alemanha, que não tem uma situação tão grave como a nossa, tomou medidas fortes mais cedo do que nós. O Hospital de Santo António já está no limite. Mas, enfim, antes tarde do que nunca.
  4. Terceiro: a grande decisão é o estabelecimento de critérios gerais e objectivos em relação aos concelhos de risco. Muito bem. O caminho é o dos confinamentos parciais e diferenciados, não o confinamento nacional e generalizado.
  5. Quarto: mesmo assim, acho que estas decisões sabem a pouco. Parecem insuficientes. Tem excepções a mais, fiscalização a menos e a responsabilidade cívica dos cidadãos tem dias.
  6. Quinto: falta a decisão do PR sobre Estado de Emergência. Eu antecipo a minha opinião: decretar o Estado de Emergência faz sentido. Primeiro, para dar segurança jurídica a muitas destas decisões. Segundo, para decretar o recolher obrigatório, sobretudo para evitar um cancro que tem proliferadoas festas nocturnas de jovens que são grande fonte de contágio. Finalmente, é necessário para dar tempo aos partidos para fazerem o que já deviam ter feito – uma alteração cirúrgica à lei para criar o Estado de Crise Sanitária, como Vital Moreira e outros constitucionalistas têm sustentado.

 

  1. O Governo não anunciou medidas económicas compensatórias para os sectores mais atingidos. É o caso da restauração e alojamento. Mas faz sentido que o faça em próxima oportunidade.

 

 

PANDEMIA – E OS DOENTES NÃO COVID?

 

  1. Esta semana, o INE divulgou um número surpreendente: no período da pandemia, entre 2 de Março e 18 de Outubro de 2020, houve mais 7.936 óbitos que na média do mesmo período dos últimos cinco anos (de 2015 a 2020). Como no mesmo período morreram 2.198 de Covid 19, temos aqui o seguinte dilema: por que é que morreram os outros 5.738 cidadãos? Será que morreram por falta de assistência médica? Será que morreram porque na primeira fase da pandemia quase só se tratavam doentes Covid e os demais foram discriminados? Ninguém sabe. Mas a dúvida é angustiante e a investigação é necessária.

 

  1. É por isto que temos de ACHATAR a onda, evitar a ruptura dos hospitais e impedir a discriminação dos doentes não Covid, como na primeira pandemia.
  2. Segundo as declarações do PM ontem, já só há 70 camas de UCI disponíveis para doentes Covid. Ora, este número pode esgotar-se em 2, 3 semanas. Então, para não prejudicar doentes não Covid, não seria prudente começar a instalar já hospitais de campanha?
  3. O Hospital de Santo António está quase nos limites. Outros para lá caminham. Para não prejudicar os doentes não Covid, não seria importante recorrer aos hospitais privados e sociais? Em tempo de pandemia, não pode haver preconceito!
  4. Centros de Saúde – Os médicos de família, além de andarem exaustos, passam horas e horas ao telefone em tarefas burocráticas a falarem com doentes Covid. Claro que assim há doentes que ficam a descoberto. Que não são tratados. É o próprio Presidente da Associação de Medicina Geral e Familiar que o diz. Não havia alternativa mais eficaz?

 

 

OE – O DIVÓRCIO DO BE

 

  1. O debate do OE foi dominado, sobretudo, pelo "duelo" entre o Governo e o BE. Como era previsível. Ficam para já duas sensaçõesa primeira, que o Bloco votou contra por oportunismo – para não ficar associado à crise económica e social que está instalada; a segunda, que o BE não está nada confortável com o voto contra que decidiu assumir. Está até muito preocupado.

 

  1. Mas atenção: agora perde o BE, no futuro pode perder o Governo.
  2. Primeiro: isto significa que já vai ser impossível cumprir toda a legislatura. Antes já era difícil, agora tornou-se impossível.
  3. Segundo: o desgaste do Governo vai passar a ser maior. O BE passa a ser oposição. E, a fazer oposição, o Bloco é mesmo eficaz.
  4. Terceiro: este acordo com o PCP é para este orçamento. Não é para os próximos. Vai ser muito difícil o PCP voltar a aprovar o OE daqui a um ano.

 

  1. Em conclusão: há uma forte probabilidade de podermos ter uma crise política daqui a um ano, com o chumbo do OE para 2022. Por um lado, o Governo já está em escala descendente – aquilo a que eu chamo o princípio do fim do seu ciclo político; por outro lado, o seu desgaste vai acentuar-se, quer pelo cansaço do poder, quer pela crise pandémica, económica e social. Basta olhar para as sondagens. Como ainda hoje se vê na sondagem do JN/TSF – o PS em queda. Só não vê quem não quer ver!

 

 

ELEIÇÕES NOS EUA

 

  1. Além da sua capital importância, estas são eleições muito estranhas: primeiro, pela pandemia – tornou o desfecho deste sufrágio imprevisível; depois, pela importância do voto antecipado e por correspondência – nunca foi tão grande; finalmente, porque o mais provável, ao contrário do habitual, é não se conhecer o presidente eleito na madrugada eleitoral.

 

  1. Vive-se agora o trauma de 2016 – o falhanço das sondagens. Este trauma pode existir, sem dúvida: sondagens são sondagens e há um certo "voto envergonhado" em Trump. Mas não é provável que o erro se repita.
  • Primeiro, porque as empresas de sondagens corrigiram já vários dos erros de há quatro anos;
  • Depois, porque esta eleição é substancialmente diferente da anterior. É mais um referendo que uma eleição.

 

  1. Mesmo assim, é preciso ter em atenção: esta eleição decide-se Estado a Estado, através de Colégio Eleitoral. E a esse respeito há que ter em atenção:
  • Há cerca de 11 Estados duvidosos, dos quais 5 são absolutamente decisivos (Florida, Pensilvânia, Ohio, Carolina do Norte, Wisconsin).
  • Por isso, ambos os candidatos gastam os "últimos cartuchos" nestes 5 estados. Percebe-se que Trump está a tentar recuperar nos últimos dias. Utilizando a sua arma mais forte – os comícios presenciais. Mas fica a sensação de que já será tarde de mais. O número indecisos é baixo e milhões de americanos já votaram.

 

  1. O que muda se Biden ganhar? Várias coisas, desde o estilo à política. A mudança mais significativa é o relacionamento dos EUA com a Europa. Com Trump esta relação esfriou. Biden, ao contrário, aposta numa relação e mais próxima com os seus parceiros e aliados. É o que chama a "Liga Democrática" ou a "Frente Democrática" (EUA/UE) para enfrentar as novas ameaças. É todo um novo Roteiro para as Relações Transatlânticas. Por isso, Biden é considerado o "Candidato Europeu".

 

 

GERINGONÇA NOS AÇORES

 

  1. Grande surpresa nos Açores – Vasco Cordeiro, do PS, teve uma vitória com forte sabor a derrota. Perdeu a maioria absoluta e levou um forte cartão amarelo. José Manuel Bolieiro, do PSD, teve uma derrota com claro sabor a vitória. Não foi o mais votado mas pode conseguir formar uma coligação de governo.

 

  1. E agora? Haverá uma de três hipóteses, entre o surreal e o irónico:
  2. Uma geringonça à esquerdaVasco Cordeiro está numa posição semelhante à de Passos Coelho em 2015. Teve mais votos mas não consegue governar. E, se o conseguir, será com uma geringonça surreal – o BE, o PAN e o IL. Muito improvável.
  3. Uma geringonça à direita –José Manuel Bolieiro, ironicamente, está como António Costa em 2015. Não ganhou, mas pode fazer uma geringonça à direita. Uma coligação formal com CDS e PPM, apoiada pelo CHEGA, IL e até PAN.
  4. Se nenhuma destas hipóteses for viável, teremos novas eleições. O que é um problema sério para os Açorianos.

 

  1. Analiticamente falando, PS e PSD têm dois problemas:
  2. O PS está desesperado. Corre o risco de sair do poder depois de 24 anos seguidos de governação. Mas não pode queixar-se. Foi António Costa que abriu esse precedente em 2015, correndo com Passos Coelho.
  3. O PSD tem o problema do CHEGA e da IL. O problema do Chega não é um problema regional. Mas os seus reflexos no plano nacional, podem ser um problema. A questão do deputado da IL é diferente. Sabe-se que a IL não apoiará o PS. Mas apoiará a solução proposta pelo PSD?

Uma coisa é certa: estamos mais perto de uma geringonça á direita que á esquerda. O que, a suceder, goste-se ou não se goste, seria histórico.

 

 

MORTE VIOLENTA NO AEROPORTO

 

  1. Com a pandemia quase passou despercebido um relatório desta semana da Inspecção Geral da Administração Interna que relata uma situação gravíssima. Quase de vergonha nacional. Parece de Terceiro Mundo.
  2. Em Março deste ano morreu nas instalações do SEF, no Aeroporto de Lisboa, um cidadão ucraniano, por agressões brutais de inspectores do SEF, que depois encobriram a morte, simulando que foi uma morte natural.
  3. Se não tivesse sido a atenção do médico legista que percebeu que a morte foi violenta e não natural, tudo poderia passar despercebido – seguranças, inspectores e enfermeiros estavam todos orquestrados entre si para encobrirem o homicídio de que foram autores e cúmplices.

 

  1. O que dizer desta monstruosidade?
  2. Primeiro: que é um comportamento inqualificável. Um serviço do Estado, em vez de defender os cidadãos, mata-os. Pior é impossível.
  3. Segundo: que há um silêncio ensurdecedor da Direcção do SEF. Já devia ter falado, já devia ter censurado, já devia ter pedido desculpas, já devia ter dito o que foi feito para evitar situações futuras semelhantes.
  4. Terceiro: que se espera que os tribunais sejam firmes a punir os responsáveis deste crime hediondo.
  5. Quarto: que o Estado, mesmo antes do fim do processo, devia desde já, preventivamente, indemnizar viúva e filhos menores do cidadão ucraniano morto. Era o mínimo de humanidade e carácter que o Estado podia ter!
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