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09 de Outubro de 2022 às 21:05

Acordo com parceiros sociais é a primeira grande vitória de António Costa

Marques Mendes, no seu comentário habitual na SIC, fala do acordo de concertação social, do Orçamento do Estado para 2023 e dos casos recentes com ministros.

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O ACORDO DE CONCERTAÇÃO SOCIAL

  • Politicamente, este acordo é bom para o país e para o Governo. Primeiro, é bom para o país. Em tempo de crise, de guerra, de grande ansiedade e incerteza, um acordo como este gera confiança na sociedade, até porque é um acordo plurianual. Depois, é bom para o Governo. Nestes seus primeiros seis meses de mandato, tudo tem corrido mal ao Governo. Esta é a primeira grande vitória de António Costa. Dá-lhe credibilidade, mostra abertura ao diálogo por parte da maioria absoluta e ajuda à paz social.
Quanto ao conteúdo do acordo, há quatro aspetos a destacar:
  • Salários. A grande novidade é a subida em 20% dos salários até 2026, Em 2023 – aumento de 5,1%; 2024 – aumento de 4,8%; 2025 – aumento de 4,7%; 2026 – aumento de 4,6%. Tudo com o objetivo de em 2026 Portugal convergir com a média salarial da UE em % do PIB.
  • Salário Mínimo Nacional. Chegará a 900€ em 2026. No próximo ano subirá já para 760€. Um acordo socialmente indispensável.
  • Apoio a jovens: criação de apoio anual à contratação de jovens qualificados com salário acima de 1,320€; aumento do benefício do IRS jovem; e, finalmente, a extinção do Fundo de Compensação do Trabalho ajudará os jovens. É que parte dos 600 milhões de saldo do FCT é destinada às empresas para apoiarem os seus jovens trabalhadores na habitação.
  • Apoios a empresas. Várias compensações (menos custos e mais deduções fiscais); baixas seletivas de IRC (salários e I&D); acelerar pagamentos do Estado a fornecedores(saúde); criação de apoios específicos para o sector agrícola; e finalmente um vasto programa de 3 MME para baixar o custo de energia das empresas. 
É um bom acordo. Mas é um acordo mais conjuntural que estrutural. Politicamente bom. Socialmente positivo, num tempo em que as empresas estão aflitas e os trabalhadores em desespero com a inflação. Mas em termos económicos, no plano da competitividade, nada muda. Falta-lhe ambição. Nada muda em termos estruturais. Quando crescermos, vamos continuar a crescer abaixo dos nossos concorrentes diretos, os Países do Leste. Mas é melhor ter acordo do que não ter.


O ORÇAMENTO DE ESTADO PARA 2023


Do que já se conhece, direi o seguinte: primeiro, é o OE de maior incerteza de que temos memória; segundo, é prudente e positivo no défice e na divida; terceiro, é arriscado na meta para o PIB; quarto, é irrealista na previsão da inflação; finalmente é arriscadíssimo no investimento, que o governo considera vir a ser o motor do crescimento em 2023. Assim:
  • Pontos positivos:
  • Redução do défice para 0,9% do PIB
  • Redução da dívida para110,8% do PIB
  • Estabilização da taxa de Desemprego 
  • Aumento do SMN (760€)
  • Actualização dos escalões do IRS
  • Dúvidas e Riscos:
  • Objectivo de crescimento do PIB tem risco. É variável que governo pouco controla.
  • Atingir inflação de 4% é objetivo ainda mais arriscado.
  • Aumento do investimento público é difícil. A execução dos fundos europeus está muito atrasada.
  • Reforço do Investimento privado não é fácil. A crise retrai investidores.
  • Vão surgir novas linhas de Capitalização de empresas. Só que a capitalização esbarra na burocracia do Banco de Fomento.
Nas circunstâncias que estamos a viver, tão importante quanto ter um OE prudente é falar verdade às pessoas. Ao contrário do que sucedeu nas pensões. A verdade, mesmo desconfortável, é sempre melhor que a ilusão. Espero que PM e MF expliquem com verdade o futuro: os riscos, as incertezas, os desafios, as medidas essenciais, o que se espera do Estado e de cada um de nós. 


OS APOIOS SOCIAIS


Começam esta semana a ser pagos os apoios aos pensionistas e às famílias por causa da inflação. Já vêm tarde, mas são indispensáveis: por uma razão social, por um imperativo de combate à pobreza e por uma razão política.

Uma razão social: proteger os mais frágeis da sociedade. Por causa da inflação, a vida das famílias mais pobres é um drama
. Vejamos:
  • O cabaz alimentar: desde o início da guerra o cabaz da Deco com 63 produtos essenciais já subiu 15%, o dobro da inflação prevista.
  • Acresce que há um conjunto alargado de produtos que subiram ainda mais. Sem esquecer o agravado custo da energia.
Mas há uma segunda razão que requer estes apoios: evitar o agravamento da pobreza. Vale a pena reter estes dois dados:
  • Entre 2016 e 2020 diminuiu entre nós o número de pessoas abaixo do limiar da pobreza. De um valor de 24,9%, em 2016, baixámos para 20% em 2020. A devolução de rendimentos ajudou.
  • Com a pandemia, a situação voltou a agravar-se. Em 2021, voltou a subir para 22,4% o número de pessoas em risco de pobreza. Com a economia de guerra o risco de novo agravamento é real.
  • Entretanto, na UE continuamos numa posição desconfortável. Somos o oitavo país em pior situação, acima da média europeia.
Além destas razões sociais, há também uma razão política que justifica estes apoios: evitar radicalismos e populismos na sociedade. Só há uma forma de o conseguir: promovendo a coesão social.  Em tempo de crise e de guerra mais se justifica um apelo à consciência social e à solidariedade colectiva.


AUSTERIDADE NOS SALÁRIOS


Segundo os dados revelados, cerca de 70% dos funcionários públicos voltarão a perder poder de compra em 2023. Terão aumentos abaixo da inflação que se espera para este ano e que se situará acima dos 7%.

A isto chama-se austeridade. Perda de poder de compra. Provavelmente por razões orçamentais não havia alternativa. O Estado tem limitações financeiras, por causa do défice e da dívida. E duvido que outro governo actuasse de forma muito diferente.


Mas esta decisão
levanta dois problemas: um problema para a Administração Pública; e um problema político para o Governo.
  • O primeiro problema tem a ver com a Administração Pública. Uma decisão como esta vai afetar sobretudo os quadros mais qualificados da função pública, designadamente médicos e professores. Aqueles que, em regra, são mais bem pagos no sector privado que no sector público. Assim, corremos o risco de continuar a perder os melhores para o privado. Desta forma, perde a Administração Pública e perde o país.
  • O segundo problema é político e tem a ver com o Governo: António Costa, quando chegou ao poder, prometeu acabar com a austeridade. Chegou mesmo a dizer que essa foi uma opção do governo de Passos Coelho. Ora, como se vê, está a  quebrar essa promessa. É o que sucede quando se fazem discursos demagógicos. A austeridade não é uma escolha dos governos. Ninguém aplica austeridade por prazer. Aplica-se austeridade por necessidade, não por opção agora e no ano passado. Começa a ser tempo de falar verdade aos portugueses. 


A TAP E OS MINISTROS


Nos últimos dias surgiram vários casos com alegados impedimentos ou incompatibilidades de Ministros. São todos eles diferentes entre si. Mas todos, em conjunto, dão uma imagem de desleixo e descuido.
  • Manuel Pizarro. A questão com a sua "sociedade" comercial não tem importância de maior. Mas se, ao entrar no governo, o Ministro tivesse deixado logo de ser sócio-gerente, o "caso" não tinha existido. É descuido.
  • Pedro Nuno Santos. O caso, diz o Governo, está esclarecido por um parecer do CC da PGR de 2019. Mas a lei foi, entretanto, alterada. Para ser coerente, o Governo devia pedir novo parecer da PGR ou uma atualização do parecer anterior. De qualquer modo, se ao entrar no Governo o Ministro tivesse alienado a sua quota de 1% na sociedade que detém com o Pai, era tudo mais fácil. Novo descuido. Estes dois casos, mais o caso Ana Abrunhosa, todos em conjunto, dão uma imagem pública muito negativa: negativa para o Governo e negativa para os políticos em geral.
O caso da "mudança" de frota da TAP é mais grave. É visto como uma afronta aos contribuintes, que "meteram" milhões na TAP, e aos trabalhadores, que tiveram de suportar cortes salariais.


A responsabilidade é dupla:
primeiro, do Governo, que desnecessariamente resolveu tornar a TAP pública, um erro descomunal; depois, da Presidente da TAP, que ainda não percebeu que não está a dirigir uma empresa, está a gerir um "barril de pólvora".




O 5 DE OUTUBRO


Uma celebração institucional com dois bons discursos
  • Carlos Moedas fez um discurso assertivo. Um claro discurso de oposição. Bem estruturado e bem fundamentado.
  • Marcelo Rebelo de Sousa fez um discurso oportuno, refletindo sobre o estado da democracia. Para sublinhar: não está em causa o risco de perder a democracia, como estava prestes a acontecer há 100 anos, mas a democracia exige cuidados, pedagogia e comportamentos credíveis.
Será que o PR está a pensar em nova dissolução da AR? Questionaram alguns. A minha resposta é esta: não me parece minimamente.
  • Primeiro, com uma maioria absoluta que se mantenha coesa, não parece haver qualquer condição para uma dissolução da AR. O que significa que a legislatura deve ir até ao fim.
  • Segundo, o cenário de, a meio da legislatura, em 2024, o PM sair do Governo para ir ocupar um cargo em Bruxelas parece-me hoje – ao contrário do passado – um cenário ultrapassado. O PM gostaria de ocupar um cargo europeu, até provavelmente teria condições de o alcançar, mas parece-me que já afastou essa possibilidade em definitivo, para evitar uma crise e a subsequente dissolução da AR.
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