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Ministra tem de se demitir se inquéritos ligarem mortes a greve do INEM

No seu habitual espaço de opinião na SIC, Luís Marques Mendes fala sobre os imigrantes, o caso INEM e o estado do Estado, entre outros temas.

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IMIGRANTES AUMENTAM POPULAÇÃO

 

  1. A notícia mais positiva da semana: segundo o INE, em 2023 Portugal voltou a aumentar a sua população. Há 5 anos que tal sucede. Por força da imigração. Se não fosse o efeito da imigração, estaríamos hoje abaixo dos 10 milhões de habitantes. O que seria um choque. Com menos pessoas, seriamos um país mais fraco e mais pobre.

 

  1. Os imigrantes são os mal-amados para alguns setores da nossa sociedade. Mas são absolutamente decisivos para Portugal.
  • O saldo natural há anos que é negativo. Em 2023 voltou a ser. A diferença entre nascimentos e óbitos é de menos 33 mil pessoas.
  • O que compensa este défice é o saldo migratório. Há 7 anos que o saldo migratório é positivo. O número de entradas em Portugal supera o número de saídas. Voltou a ser assim em 2023.
  • Em matéria de natalidade a situação é muito critica. Em 1973, há 50 anos, nasceram 172 mil bebés. Em 2023, 50 anos depois, apenas 86 mil, sendo que 25 mil são filhos de mães estrangeiras. Um mau retrato. Se excluíssemos a imigração, a realidade seria aflitiva: teríamos hoje apenas cerca de um terço dos nascimentos de há 50 anos. Como se vê, os imigrantes são essenciais.

 

  1. É preciso fazer esta pedagogia. Os imigrantes ajudam o País: a ganhar população, a criar riqueza, a rejuvenescer a sociedade, a reforçar a segurança social. E não fazem aumentar a criminalidade. Se os partidos moderados do arco da governação (PSD, PS e CDS) não fizerem esta pedagogia e deixarem o tema da imigração só para a direita radical, vão perder esta batalha. No plano cultural e político.

 

O CASO INEM

 

  1. Este foi o primeiro caso sério de desgaste do Governo. Humanamente foi uma tragédia. Politicamente, um exemplo de amadorismo.
  • Na semana passada tinha ficado claro para mim que a greve do INEM não devia ter acontecido; que os serviços mínimos deviam ter sido impostos e assegurados; que o Ministério da Saúde podia ter evitado a greve em tempo útil e não a evitou. Esta foi a tragédia humana: morreram pessoas e as pessoas não são números.
  • Esta semana foi o amadorismo completo. Vimos um presidente do INEM a fugir a dar explicações cabais, o que reforça a ideia de que não tem tarimba para o lugar e está na corda bamba; vimos uma secretária de Estado que foi desautorizada pela própria ministra, com intenção ou sem ela; e corremos o risco de ter uma ministra a prazo: basta que os inquéritos apurem que há um único caso de relação entre a greve e a fatalidade para que a ministra tenha de se demitir. Foi a própria a assumir essa responsabilidade. Em conclusão: é todo um Ministério fragilizado. E logo o Ministério da Saúde.

 

  1. Há, subjacente a tudo isto, um erro inicial: a saída de Fernando Araújo de CEO do SNS. Volto hoje a repetir o que já anteriormente disse: com esta saída, a ministra perdeu um escudo protetor. Claro que foi o próprio que se demitiu. Mas foi o Ministério que o empurrou para a demissão. Um erro absolutamente desnecessário.

 

O ESTADO DO ESTADO

 

  1. O caso INEM tem também uma outra dimensão. A dimensão estrutural: o Estado passa a vida a falhar, independentemente dos governos.
  • Os exemplos são mais do que muitos. Tivemos os fogos de Pedrógão. O Estado falhou. Tivemos o assalto a Tancos. O Estado falhou. Tivemos a fuga dos presos de Alcoentre. O Estado falhou. Temos agora o INEM. O Estado falhou. Sem falar da justiça, onde o Estado passa a vida a falhar. Há um falhanço geral do Estado.
  • Por que é que o Estado falha? Há muitos motivos. Até financeiros. Mas há um essencial: os governos não agem. Só reagem. Reagem quando há uma calamidade ou uma tragédia. Mas não agem por antecipação. Tratam dos assuntos mais mediáticos e conjunturais. Mas descuram as questões de fundo. Por medo de agir, incapacidade ou falta de tempo.
  • Terceiro, a lentidão e burocracia. Mesmo quando os governos têm vontade de agir, é tudo lento. É o caso do INEM: a ministra anunciou antes do Verão uma Comissão para propor um plano de reestruturação. Estamos em novembro e ainda não há comissão a funcionar. Se fosse no setor privado, já havia comissão e plano.
  • Quarto, a escolha dos gestores. Há pouco cuidado, sobretudo na escolha de pessoas experientes. Veja-se o atual presidente do INEM. Não tem experiência para liderar um serviço com esta complexidade. A falta de experiência é um drama.

 

  1. Tentando ser construtivo, aqui deixo duas sugestões. Se estivesse no lugar do PM, nomeava uma comissão independente para avaliar as áreas mais vulneráveis do Estado e propor pistas de soluções. É preciso ter uma visão global. E, se estivesse no lugar do PR, convocaria um Conselho de Estado (CE) para dar um empurrão a esta reforma do Estado. É preciso vontade política. Já vi CE menos importantes do que este poderá ser.

A REVOLUÇÃO DA IA

 

  1. Em Portugal, são poucos os políticos que falam de inteligência artificial (IA). O que é uma pena: primeiro, porque esta é uma revolução inadiável; segundo, porque a IA é um contributo para a melhoria da produtividade, o nosso grande problema económico. Na Web Summit, o PM foi exceção. Prometeu para 2025 um programa em matéria de IA. A ideia surge em bom momento: a UE precisa de recuperar do atraso em relação aos EUA e à China. Vejamos:
  • No Top 10 dos países que lideram em IA, só há dois países da UE: França e Alemanha. Neste ranking, os EUA lideram, seguidos pela China, Rússia, Israel e Canadá; a França vem em 6.º lugar; a Índia e o Japão logo a seguir; a Alemanha em penúltimo lugar, com Singapura a fechar o TOP 10. A Europa está a falhar. E isso pode dever-se a falta de investimento e excesso de regulação, que muitas vezes é contraproducente e afasta o investimento.
  • Nos últimos 5 anos, a UE investiu em IA três vezes menos que a China e quase 6 vezes menos que os EUA. Nos EUA são já 73% as empresas que usam IA. Na UE são só 8%. A UE está a perder.
  • Este investimento é decisivo. Os estudos mais recentes indicam que até 2030 o PIB mundial vai ter um crescimento de 14% por força da IA. Com impacto de 26% na China e de 15 % nos EUA.

 

  1. Voltando a Portugal, julgo que devia haver duas grandes prioridades:
  • Primeiro, a aprovação de um plano para a introdução da IA na Administração Pública, generalizando a ideia que o ministro Castro Almeida está a aplicar na área dos fundos estruturais;
  • Segundo, um acordo de concertação social, com metas, calendários e incentivos à introdução da IA nas PME. O problema não são as grandes empresas. São as PME.

 

AUMENTO DE SALÁRIOS E PENSÕES

 

  1. A tecnologia melhora a produtividade. E a melhoria da produtividade faz aumentar os salários. É o que nos dizem, de resto, os últimos dados do INE, relativos aos salários no terceiro trimestre deste ano.
  • O salário médio nacional aumentou, em termos nominais, cerca de 6% relativamente ao mesmo período do ano passado. E em praticamente todos os principais setores da economia houve aumentos em termos reais. Um aumento médio, em termos reais, de 3,8% no terceiro trimestre. Um dado positivo.
  • Mas a novidade que o INE reafirma é esta: os melhores salários estão nos setores mais inovadores da economia. Aqueles que contam com maior intensidade tecnológica. Nos setores com mais alta tecnologia industrial, os salários estão quase 50% acima da média nacional. Outro dado bastante positivo.
  • O investimento tecnológico vale mesmo a pena. Torna as empresas mais competitivas. E faz com que o elevador social funcione de forma mais expressiva.

 

  1. As boas notícias chegam também aos pensionistas e reformados:
  • Vão ter provavelmente dois aumentos em 2025. Primeiro, um aumento segundo a fórmula prevista na lei (3,1% para as pensões e reformas mais baixas). E um aumento extra ou de caráter mensal (proposta do PS) ou um bónus excecional no Verão, à semelhança do que sucedeu este ano (proposta da AD).
  • Não é impossível que até à votação possa haver ainda um entendimento quanto à solução final. Como acabou de suceder na redução do IRC. Muita gente vaticinou um impasse ou um chumbo e tudo acabou por se resolver na base do bom senso.

 

AS NOMEAÇÕES NOS EUA

 

  1. Muita gente ficou surpreendida com as nomeações que Trump fez. Eu não fiquei surpreendido. Mas fiquei preocupado. Os EUA são uma referência democrática para o mundo. Um farol, sobretudo para o mundo ocidental. Ora, a imagem que agora passa é uma imagem má. Uma imagem de atropelo aos valores mais básicos da democracia. O que pode contaminar democracias mais frágeis pelo mundo fora.

 

  1. Vejamos alguns exemplos:
  • Elon Musk. Não vai para a Administração, mas vai mandar na Administração. Não está em causa o seu talento. Estão em causa, sim, os enormes conflitos de interesse que a sua nomeação suscita. Investiu milhões em Trump. Agora vai ser compensado em dobro, em triplo ou até mais. Na Europa seria um escândalo.
  • O novo Procurador Geral. O cúmulo da falta de decência política. Vai chefiar o departamento de Justiça alguém que tem no seu currículo várias questões com a Justiça. Incluindo suspeitas de abusos sexuais e de uso ilícito de fundos políticos. Falta de pudor.
  • A nova diretora nacional dos Serviços de Informações. Supervisiona as agências dos Serviços Secretos. Um cargo que exige um estatuto insuspeito. No caso vertente, a nova titular é marcada por várias ligações à Rússia.
  • O novo secretário da Saúde. Um negacionista das vacinas. De todas as vacinas. Um insulto à ciência. Talvez o caso mais grave em termos de serviço público.

 

  1. Nomes à parte, nas ideias não há surpresas, para já: forte aposta anti-China; retórica firme contra o Irão; política pró-Israel sem limites; continuadas reticências em relação à Europa e à Ucrânia.
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