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19 de Dezembro de 2021 às 21:02

Marques Mendes: a Justiça não sabe lidar com processos mediáticos

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre a variante ómicron da covid-19, dos casos judiciais de Manuel Pinho e João Rendeiro, bem como do congresso do PSD e das eleições legislativas, entre outros temas.

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A PANDEMIA E A VACINAÇÃO
1. Estamos numa fase muito sensível: há certezas no terreno; há incertezas no horizonte; e há sinais positivos.
a) Certezas no terreno: estamos bem melhor do que há um ano, em internamentos, doentes em Unidades de Cuidados Intensivos e óbitos; estamos muito aquém das linhas vermelhas que estão traçadas; a testagem está a ser eficaz; a vacinação da terceira dose está finalmente em velocidade de cruzeiro.
b) Incertezas no horizonte: o efeito ómicron. Podemos ter 50% de infeções por esta nova variante no natal e 80% no fim do ano.
• Sabe-se que a nova variante é mais transmissível. O número de casos desta variante pode duplicar em 1, 2 ou 3 dias. O que é assustador. Mais casos levam inevitavelmente a mais internamentos. Se não for pela gravidade é pelo volume de casos.
• Mas ainda não se sabem com segurança duas coisas: primeiro, se a nova variante é ou não mais grave, embora os sinais não sejam os piores; segundo, e sobretudo, se as vacinas existentes são suficientes face a esta nova variante.

2. Entretanto, alguns sinais positivos de confiança:
a) A UE já está a encomendar vacinas "adaptadas" às novas variantes. É agir por antecipação. Positivo.
b) O Governo já acionou 38 acordos com o setor privado e social da saúde, para ter mais 400 camas disponíveis. É bom prevenir. Positivo.
c) A CM de Lisboa está a praticar em força a vacinação de proximidade (para lares, idosos e cidadãos com deficiência). Positivo.
d) Cabo Verde conseguiu que o seu certificado de vacinação seja reconhecido na UE. Bom para o turismo de Cabo Verde e Portugal.

RENDEIRO E PINHO
1. Manuel Pinho – Não falarei do processo e de aspetos jurídicos, como a caução multimilionária. Esses problemas resolvem-se nos tribunais, através de recursos, e não na televisão ou nos jornais. Mas há duas questões políticas essenciais:
a) Primeiro: a falta de explicações de Manuel Pinho. O ex-ministro continua sem explicar por que é que recebeu cerca de 15 mil euros por mês do GES enquanto esteve no Governo. Esta falta de explicação é inqualificável.
• Ninguém sabe se este recebimento é crime. Só os tribunais avaliarão. Mas há uma coisa que é certa: não é normal nem aceitável um ministro estar a receber dinheiro de um grande grupo económico. É até muito suspeito em termos de isenção e independência. Gera uma suspeita de promiscuidade, dependência e favor.
• Perante esta situação, é inexplicável o silêncio de Pinho. Como ex-ministro, ele deve uma explicação ao país. Tem essa obrigação política e democrática. Antes mesmo da explicação nos tribunais. O que sucedeu é uma anormalidade. Não explicar é um exercício de arrogância. Neste plano, Pinho é igual a Sócrates. Enquanto não explicar, Manuel Pinho não tem autoridade para criticar a Justiça.
b) Segundo: A Justiça não sabe lidar com processos mediáticos. Vejamos: esta investigação à EDP arrasta-se há quase uma década; a investigação sobre as PPP rodoviárias levou 11 anos; a Operação Marquês e o caso BES ninguém sabe quando chegam a julgamento; o caso Vistos Gold foi uma derrota para a Justiça; o caso Tancos para lá caminha. Um desastre. Juízes, procuradores, governo e partidos não sabem dar a volta a este desastre. Resultado: contaminam o resto da Justiça e dão força aos partidos radicais.

2. João Rendeiro – Uma excelente decisão do juiz sul-africano. Bem estruturada e fundamentada. Uma boa vitória para a justiça portuguesa. Espera-se que o Ministério Público apresente agora o pedido de extradição. A tempo e horas e de forma eficaz.

O CONGRESSO DO PSD
1. A proximidade do poder faz milagres. Une e agrega. O PSD vê a possibilidade de ganhar as eleições e o congresso foi o que se esperava – um congresso de confiança, unidade e mobilização.

2. O grande destaque, obviamente, foram os discursos de Rui Rio. Dois bons discursos. Sobretudo o de hoje [domingo]. Mais virado para o país.
• Rui Rio falou como líder da oposição e como candidato a PM. Como líder da oposição fez um discurso muito assertivo e eficaz. Provavelmente, o discurso de oposição mais eficaz que Rio fez até hoje. Foi certeiro e demolidor para o governo. Bem estruturado e com bons soundbites.
• Como candidato a primeiro-ministro foi claro nas ideias alternativas mas ausente nas propostas concretas: quer ser diferente na economia, nos impostos, na saúde, na educação e no ambiente. Mas faltam as propostas concretas. Julgo que é de propósito. Rio quer lançá-las em janeiro, já em tempo de debates, e não agora para não perderem impacto.
• Ideologicamente, foi um discurso de largo espetro: virado para o centro e para a direita. À direita, com a questão da seletividade nos apoios sociais, quer esvaziar o discurso do Chega. Ao centro, a aposta é em melhores salários, na redução fiscal e na valorização dos professores. Já se percebeu: é este o discurso que Rio vai usar na campanha eleitoral.

3. Outros destaques do congresso:
• Carlos Moedas – A melhor intervenção depois de Rio. Cada vez mais um político com carisma.
• Luís Montenegro – Uma intervenção oportuna e bem estruturada.
• Paulo Rangel – Foi humilde e genuíno. Em política é muito raro.
• Miguel Pinto Luz – Uma intervenção corajosa e um resultado excelente.
• Ana Paula Martins (Bastonária dos Farmacêuticos) – Uma boa conquista de Rui Rio à sociedade civil. Pena não haver mais.n

AS SONDAGENS
1. Foram várias as sondagens divulgadas esta semana. Todas reforçam a ideia que aqui deixei há duas semanas: está tudo em aberto para as eleições de 30 de janeiro. Tanto pode ganhar o PS como o PSD. Tanto pode ser primeiro-ministro António Costa como Rui Rio. O voto está muito imprevisível. O número de indecisos é grande. As pessoas estão a mover-se. O nível de incerteza é enorme.

2. E tudo porquê? Porque estas eleições são muito diferentes das de 2019. São , sobretudo, um referendo ao primeiro-ministro e ao Governo. Neste plano, há duas grandes diferenças em relação a 2019:
a) Primeiro: o cansaço em torno do Governo. Há dois anos, o Governo estava fresco e em alta. Agora, dois anos depois, uma parte grande do País está cansada do Governo e até do primeiro-ministro.
b) Segundo: o efeito da pandemia. As pessoas estão muito sensíveis, com os nervos à flor da pele, "irritadiças", maldispostos, cansadas de um pandemia tão longa. Se este cansaço pandémico se transformar em cansaço político, então a vida do PS será ainda mais difícil.

3. A este respeito, o primeiro-ministro apelou ontem, pela primeira vez de forma clara, a uma maioria absoluta. A causa é boa e é, provavelmente, o único discurso novo que o PS tem para oferecer nesta campanha. Julgo, porém, que é uma causa certa no tempo errado. Há dois anos era viável. Agora, parece-me tarde de mais. Falta frescura à mensagem e aos protagonistas da mensagem.n
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