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Opinião
23 de Outubro de 2016 às 21:05

Notas da semana de Marques Mendes

A análise de Luís Marques Mendes ao que marcou a última semana da vida nacional e internacional. Os principais excertos da sua intervenção na SIC.

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OS VENCIMENTOS NA CGD

 

  1.      Nestas matérias, há sempre radicalismo a mais e equilíbrio a menos.

a)     Uma posição radical é dizer-se que um gestor público não deve ganhar mais que o PM ou o PR. Ou seja: deve ser baratinho. Isto não faz sentido. Primeiro, porque a função política é radicalmente diferente da função empresarial e depois porque o barato sai caro.

b)     Outra posição radical é dizer-se: pague-se o que tiver que ser pago, mesmo sem limite, porque doutra forma não há gente capaz e competente. Cuidado! A Banca portuguesa nos últimos anos está cheia de gestores que eram principescamente pagos e que depois levaram os Bancos à falência ou próximo disso (e não foi só o BES).

c)      A minha opinião é outra. Tem de haver equilíbrio e bom senso. Pagar bem mas com equilíbrio. No caso concreto, eu teria preferido um vencimento mais baixo compensado com uma componente variável em função dos resultados e do desempenho.

 

  1.      No caso concreto não houve esse equilíbrio. Pelo que veio a público, o anterior Presidente da Caixa ganhava por ano cerca de 200 mil euros; e o actual irá ganhar mais de 400 mil. Eu diria que nem 8 nem 80.
  •        Primeiro, porque nem o Presidente actual é um Deus nem o anterior era o diabo. São ambos bons profissionais.
  •        Segundo, porque ninguém em lado nenhum, em cargo nenhum, em empresa nenhuma, tem, de uma ano para o outro, um aumento tão brutal como este.
  •        Terceiro, porque entre o 0 e o 80 há o 40, o 50 ou o 60. E dizer isto não é fazer demagogia. É apenas apelar ao bom senso.

 

  1.      Regime de excepção para a CGD. Mais grave, a meu ver, que a questão salarial é outra questão que até hoje ainda ninguém falou e que admito tenha passado despercebida a quase toda a gente. E que é esta:
  •        Os gestores públicos, todos eles, estão obrigados, no início de funções, a fazer três declarações: uma para o TC (declaração de rendimentos), outra para a PGR (sobre incompatibilidades e impedimentos) e uma terceira para a Inspeção Geral de Finanças (sobre participações que detenham em qualquer empresa). Isto aplica-se a todos os gestores públicos.
  •        Pois bem, através do DL 39/2016, de 28 de Julho, o Governo "desobrigou" os gestores da Caixa destas três exigências. Apesar da linguagem hermética do DL, é isso, na prática, o que lá está.
  •        Aqui chegados, de duas uma: ou isto é um lapso e tem de ser corrigido, ou isto é intencional e é gravíssimo.
  •        Gravíssimo, porque foi omitido até hoje por quem fez a lei; gravíssimo que passemos a ter um regime de excepção para a Caixa que ninguém compreende; gravíssimo porque é trocar a transparência pelo secretismo, o escrutínio pela opacidade.
  •        Alguém tem de explicar isto e com rapidez.

 

 

A APROVAÇÃO DA DBRS

 

  1.      Houve esta semana duas boas notícias para o Governo e para o país.
  •        Primeiro, as declarações de Mario Draghi, a exprimirem que globalmente Portugal vai na direcção certa, em termos financeiros;
  •        Segundo, e mais importante, a decisão da DBRS de manter o rating de Portugal. Esta é a única agência que nos protege. Se baixa o rating estamos perdidos. Perdemos o acesso ao financiamento do BCE.

 

  1.      Mas não há bela sem senão. A decisão da agência canadiana é muito positiva mas tem uma limitação. Uma espécie de espada em cima das nossas cabeças.
  •        É que um responsável da Agência disse ao Observador que hoje não há problemas. Mas, se os juros da dívida a 10 anos ultrapassarem os 4%, então sim, o rating pode cair. E os juros estão hoje ligeiramente acima dos 3%.
  •        Ou seja, convém não abusar da sorte. Esta "espada" em cima das nossas cabeças deverá ser vista como um incentivo. Um incentivo a fazer três coisas: cumprir os objectivos do défice; colocar a economia do país a crescer; realizar reformas económicas que promovam a confiança e reduzam o clima de incerteza.

 

A POLÉMICA PSD/RUI MOREIRA

 

  1.      O Presidente da Câmara do Porto pediu aos partidos que simplificassem e desburocratizassem o processo relativo às candidaturas independentes às eleições autárquicas. Aparentemente um pedido normal e razoável. Todos os partidos, mais coisa, menos coisa, concordaram. O único que discordou foi o PSD e houve uma troca de acusações pouco cordial entre Rui Moreira e Passos Coelho.

 

  1.      Julgo, sinceramente, que o PSD não andou bem.

a)     Primeiro, porque ao contrário do que foi dito, isto não é um fato à medida para Rui Moreira. Ele pediu uma melhoria da lei para todas as candidaturas independentes e não apenas para a sua.

b)     Depois, porque esta posição dá ideia que o PSD tem medo das candidaturas de cidadãos independentes, que está prisioneiro de uma lógica de aparelho partidário. Ora a verdade é que as candidaturas independentes são uma lufada de ar fresco na vida política.

c)      Finalmente, porque esta posição do PSD contraria a sua história e a sua doutrina. O PSD foi pioneiro nas candidaturas independentes. Como também nos referendos. O PSD sempre foi pela abertura à sociedade civil. Por uma competição leal entre os partidos e outras realidades vindas da sociedade. Em obediência e esta ideia importa não esquecer: a democracia faz-se com os partidos; mas a democracia não se esgota nos partidos. 

 

 

O INCÓMODO DO ORÇAMENTO

(à esquerda e à direita)

 

Esta semana ficou claro que o OE é um Orçamento incómodo. À esquerda e à direita.

  1.      À esquerda, percebe-se que este não é o Orçamento que o BE e o PCP desejavam. Este Orçamento causa-lhes desconforto. É a primeira vez que há um clima de tensão e de mal-estar na maioria. Basta ver as declarações de Louçã e Jerónimo de Sousa.
  •        Causa-lhes desconforto a redução do défice; a solução das pensões; a não eliminação da sobretaxa do IRS; a mudança do modelo económico, em que a alavanca do consumo é substituída pelo motor do investimento e das exportações.
  •        Numa palavra, à esquerda este Orçamento não uniu. Dividiu. Deixou marcas profundas. Divisões muito acentuadas. Se pudessem, o BE e o PCP votavam contra o Orçamento. Como não têm alternativa (porque não podem abrir uma crise política que podia dar uma maioria ao PS), os partidos da extrema-esquerda vão votar este OE contrariados. Disfarçam mas o incómodo está lá. Nada no futuro vai ser igual ao passado no reino da geringonça.

 

  1.      À direita, o incómodo também é grande. Em particular porque este OE rouba ao PSD a sua grande causa – a redução do défice. Onde se vê esse incómodo?

a)     Primeiro: nas críticas tão violentas de Maria Luís Albuquerque. Maria Luís Albuquerque até pode ter alguma razão nas críticas que faz. Só que aos olhos das pessoas não tem grande autoridade e credibilidade para criticar. Porque ela é o rosto dos cortes nas pensões e salários, dos aumentos de impostos ou da sobretaxa que antes das eleições de 2015 era para ser parcialmente devolvida e depois das eleições ficou inalterada. Pôr Maria Luís Albuquerque a criticar este Orçamento é mais ou menos como em 2011 pôr Teixeira dos Santos a criticar o primeiro Orçamento de Vítor Gaspar.

b)     Segundo: no anúncio que Passos Coelho fez, anunciando que desta vez o PSD vai apresentar propostas alternativas. A ideia é boa. Mas a pergunta que se coloca é esta: por que é que só agora mudou de posição? Por que é que não fez já isto antes? Fica a sensação de que esta mudança é feita a reboque do CDS.

c)      Em conclusão: à esquerda e à direita este é o OE da discórdia. E o mais irónico é que, não agradando a ninguém, este OE é provavelmente melhor que o anterior. 

 

 

AS AUDIÇÕES DE MARCELO AOS PARTIDOS

 

  1.      Estas audições permitiram tirar duas conclusões:

a)     A primeira é que, apesar do mal-estar existente, não haverá em princípio qualquer crise política em 2017, até às eleições autárquicas;

b)     A segunda é que a grande prova dos nove é daqui a um ano, a seguir às eleições autárquicas, no Orçamento para 2018.

 

  1.      Curiosa é a estratégia de António Costa e do PS. O PS anda eufórico porque acha que pode fazer os quatro anos de mandato e depois ganhar as eleições.
  •        Primeiro, porque considera que não há oposição e que Passos Coelho na liderança do PSD só o favorece porque representa a imagem do passado;
  •        Depois, porque tem o PCP e o BE no bolso e acha que eles têm medo de provocar uma crise;
  •        Finalmente, porque tem o apoio do Presidente da República, o que, segundo eles, lhes dá uma especial cobertura política.

 

  1.      Só o futuro dirá se este estado de euforia tem razão de ser. Em qualquer caso, há aqui algumas condicionantes a ter em atenção.

a)     Uma é a economia. E se a economia não cresce? Como é que se faz o OE para 2018, reduzindo o défice, aumentando salários e pensões, já sem margem para aumentar impostos? Difícil!

b)     Outra é as autárquicas. E se as autárquicas não correm assim tão bem quanto isso ao PS e ao PCP?

c)      A terceira é a liderança do PSD. E se o PSD muda de líder a seguir às autárquicas, como sucedeu no PS a seguir às Europeias, e vem um líder que nada tem a ver com a governação anterior? É um dado novo, como foi a substituição de Seguro por António Costa.

 

  1.      Duas coisas são certas, para já. Politicamente falando, o ano de 2017 vai ser marcado por duas realidades: as sondagens e as autárquicas.
  •        Todos vão trabalhar para as sondagens. Porque estar bem ou mal nas sondagens pode ajudar a abrir ou a evitar uma crise política.
  •        Todos vão esforçar-se a sério nas autárquicas. Porque do seu resultado pode decorrer ou uma crise do governo na maioria ou uma crise de liderança na oposição.

  

 

O ESTADO DA EUROPA

 

  1.      Tivemos esta semana mais uma Cimeira Europeia. Chegados ao fim, Chefes de Estado e de Governo não conseguiram entender-se sobre nada.
  •        Não se entenderam para aprovar um importante acordo de comércio com o Canadá; não se entenderam para um acordo sobre os refugiados; não se entenderam sobre sanções à Rússia por causa da Síria.
  •        O mais grave é que há um mês os mesmos Chefes de Estado e de Governo também não se entenderam na cimeira de Bratislava.
  •        Ou seja, duas cimeiras importantes, dois fracassos seguidos; este é o estado lastimável da Europa que temos – uma Europa parada, sem decisões, sem estratégia e sem liderança.

 

  1.      Por que é que isto sucede? Uma razão de fundo e outra institucional.

a)     Primeiro, porque quase todos os países estão a olhar para o seu umbigo, para os seus problemas domésticos, em desfavor do projecto europeu. Especificamente, os países maiores: a Itália está preocupada com o referendo que vai realizar e que pode levar à demissão do PM Renzi; a França está preocupada com as suas eleições presidenciais; a Holanda está preocupada com as suas eleições legislativas e a subida da extrema-direita; a Alemanha está preocupada com as suas eleições, a Sra. Merkel está cada vez mais fragilizada com a questão dos refugiados e pode ter que lidar no futuro com um governo a três (CDU/SPD/Verdes).

b)     Segunda razão: as mudanças institucionais do Tratado de Lisboa. O Tratado de Lisboa fez com que o papel dos Ministros dos Negócios Estrangeiros diminuísse de importância dentro da União Europeia.

  •        Os MNE deixaram de acompanhar os Chefes de estado e do Governo nas Cimeiras Europeias. E acabaram os chamados Conselhos de Ministros de Assuntos Gerais, onde se preparavam as Cimeiras Europeias.
  •        Isto fez com que a UE perdesse funcionalidade. E as consequências estão à vista de todos.

O FUGITIVO DE AGUIAR DA BEIRA

 

  1.      Passaram quase duas semanas desde que ocorreu o crime em Aguiar da Beira e o fugitivo continua a monte.

Uns dizem que há descoordenação na acção das polícias; os responsáveis dizem que não. Eu não sei se há descoordenação ou não. Mas uma coisa todos sabemos: as coisas não estão a correr bem e a imagem que passa revela algum amadorismo e falta de eficácia.

 

  1.      Onde se vê amadorismo e falta de eficácia?

a)     Primeiro: na desproporção entre meios e resultados. Há uma enorme afectação de meios à procura deste fugitivo; e há um insucesso enorme em resultados ao fim de 13 dias de operação. Não é caso único, é verdade. Mas não deixa de ser incomodativo.

b)     Segundo: na articulação de posições entre PJ e GNR. Sente-se que essa articulação existe agora; mas que durou vários dias a suceder. Fica a sensação de que os responsáveis subestimaram o fugitivo. Acharam que toda esta operação era mais fácil e que em 2, 3 dias tudo estaria resolvido. Ou seja, facilitaram. Só mais tarde se aperceberam do erro.

c)      Terceiro: na gestão da informação. Uma operação desta natureza deveria obrigar a que diariamente algum responsável fizesse um briefing com a comunicação social, até para evitar os media, ainda que sem intenção, pudessem às vezes prejudicar a operação. Nada disso sucedeu. É um enorme amadorismo.

 

  1.      Preocupação – Tudo isto suscita preocupações:

a)     Preocupação, porque um criminoso perigoso continua à solta;

b)     Preocupação, porque tudo isto desprestigia as nossas polícias;

c)      Preocupação, porque gera especulações. Se isto é assim com este criminoso, o que seria se se tratasse de um terrorista mais sofisticado e mais complexo?



NOTAS FINAIS

 

  1.      Um cumprimento a Jorge Moreira da Silva pela sua designação para um alto cargo na OCDE.

 

  1.      Um cumprimento aos responsáveis militares dos Comando. Perguntei aqui na semana passada pelo inquérito à morte de dois Comandos. A primeira resposta foi a notícia de dois processos disciplinares.

 

  1.      Uma pergunta inconveniente sobre a CPLP – Daqui a 8 dias (1 de Novembro) haverá uma cimeira da CPLP no Brasil. A primeira em que participa oficialmente a Guiné Equatorial. Só que há um problema de que ainda ninguém falou: a Guiné Equatorial ainda não ratificou os estatutos da CPLP. A pergunta é: como pode participar?

 

  1.      Assunção Cristas na CMTV. Começa amanhã um comentário semanal de Cristas na CMTV. Mais um passo para aprofundar a sua candidatura à Câmara de Lisboa.
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