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Luís Marques Mendes 04 de Agosto de 2024 às 21:01

Marques Mendes: Constituição de Medina como arguido na operação Tutti Frutti é um "exercício de gargalhada"

No seu habitual espaço de opinião na SIC, Luís Marques Mendes fala da guerra no Médio Oriente, da Venezuela e PCP, do rendimento dos portugueses e da entrevista do ministro das Finanças, entre outros temas.

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A GUERRA NO MÉDIO ORIENTE

 

  1. Há, pelo menos, quatro realidades muito claras no Médio Oriente:
  • A primeira é que Israel está a exagerar. Teve todo o direito a retaliar, mas há muito que ultrapassou os limites do razoável.
  • A segunda é que ninguém quer o cessar-fogo em Gaza. O Hamas não o quer e Netanyahu também não. Quem quer um cessar-fogo não assassina o negociador da parte contrária.
  • A terceira é que há que distinguir entre os interesses de Israel e os interesses do PM de Israel. Israel é um país soberano e tem interesses legítimos a defender. Netanyahu está a usar o seu cargo para prolongar a guerra. É que com um cessar-fogo ele vai ter de enfrentar eleições, correndo o risco de as perder, e vai ter de enfrentar a justiça, correndo o risco de ser preso.
  • A quarta é que ninguém tem capacidade de mediar conflitos. Os EUA estão num vazio de poder. As Nações Unidas são uma irrelevância.

 

  1. Em conclusão: um cessar-fogo em Gaza está cada vez mais longe; e um conflito regional no Médio Oriente está cada vez mais perto. O Irão não vai deixar de retaliar. É tudo muito preocupante.

 

A VENEZUELA E O PCP

 

  1. Aconteceu o que era previsível nas eleições presidenciais da Venezuela: uma fraude eleitoral do tamanho da Torre dos Clérigos. Por isso é que as autoridades se recusam a divulgar as atas das mesas de voto; por isso, é que têm sido feitas detenções em série de membros da oposição; por isso, é que até já ocorreram mortes de pessoas inocentes. E os países que reconhecem esta farsa eleitoral são os do costume: a China, a Rússia, Cuba, Síria, Bielorrússia, Nicarágua.

Nada disto é de estranhar. Uma ditadura é sempre uma ditadura. Mesmo quando finge que é uma democracia e aceita realizar eleições. Só que não são eleições livres. São um simulacro de eleições. Portugal já viu o mesmo em 1958, nas eleições em que participou Humberto Delgado.

 

  1. O que é de estranhar é a atitude do PCP, de saudar a falsa reeleição de Maduro. Com todo o respeito, o PCP parece que "enlouqueceu".
  • Perdeu a vergonha. Já não chegava o apoio a Putin na guerra da Ucrânia. Agora, é o apoio ao regime de Maduro: um regime que obriga milhões de venezuelanos a sair do país por falta de condições; um regime que condena a sua população à miséria; um regime que enche as prisões com os oposicionistas. Claramente, o PCP anda perdido. Até levou um puxão de orelhas dos comunistas da Venezuela: o PCP não sabe o que Maduro faz aos trabalhadores e sindicalistas? É a pergunta do PCV.
  • A seguir à falta de vergonha, vem a tendência do PCP para o suicídio. O PCP está a suicidar-se politicamente. A um ritmo impressionante. Nem os seus eleitores compreendem estes apoios ao regime de Putin e de Maduro É assim, com tanta cegueira, que o PCP vai cavando a sua sepultura.

 

RENDIMENTO DOS PORTUGUESES

 

  1. O INE divulgou dados sobre os residentes líquidos dos portugueses, município a município, relativos a 2022, que dão que pensar:
  • O rendimento líquido do contribuinte português (deduzido o IRS) é muito baixo: 10,679€ por ano; cerca de 890€ por mês.
  • Há discrepâncias enormes entre o litoral e o interior. Nos 5 municípios mais pobres (Tabuaço, Santa Marta de Penaguião, Cinfães, Valpaços e Resende), o rendimento médio por contribuinte é de apenas 625€ por mês. Bem abaixo da média nacional.
  • Nos 5 municípios mais ricos (Oeiras, Lisboa, Alcochete, Cascais e Coimbra), o rendimento médio já é praticamente o dobro: 1,266€ por mês.
  • A AML é um caso especial: Oeiras é o concelho mais rico; já o concelho da Amadora tem um rendimento médio 26% abaixo do de Oeiras. E há duas freguesias em Lisboa – Lumiar e Parque das Nações – onde os seus residentes têm rendimentos bem acima dos de Oeiras, o concelho mais rico do país.

 

  1. Há, para já, duas conclusões a tirar deste retrato:
  • A primeira é que há mesmo um problema de coesão dentro do país. Há uma grande diferença entre litoral rico e interior pobre. Não é novidade. A novidade é que passam os anos e as desigualdades não se corrigem.
  • A segunda é que em 2024 a situação pode melhorar. É que está a ocorrer este ano um alívio fiscal como há muito tempo não se verificava: na ordem de 1,5 mil milhões de euros. Mérito do governo anterior e do atual. O rendimento líquido das pessoas mais pobres vai ter uma melhoria sensível.

 

PRR ATRASADO

 

  1. A Comissão de Acompanhamento do PRR, presidida pelo académico e independente Pedro Dominguinhos, colocou o dedo na ferida: a situação do PRR é quase de emergência nacional, face ao estado preocupante ou critico de vários dos seus projetos.

 

  1. Há três verdades que são inquestionáveis:
  • A primeira: se Portugal perder um Euro do PRR será uma vergonha. Significa que não fomos capazes de aproveitar em pleno uma oportunidade histórica. Mas isso pode acontecer. A taxa de execução deixada pelo governo anterior foi escandalosamente baixa (21% em fim de março). É certo que já melhorámos bastante (32%de execução em julho). Mas o desafio continua a ser grande.
  • A segunda: temos dois anos apenas para aprovar 316 medidas e reformas. É um número brutal. Sem isso, Portugal não conseguirá receber os 12 Mil milhões de euros que ainda faltam. São muitas exigências para concretizar num tão curto espaço de tempo.
  • A terceira: para não perder fundos, é preciso tomar medidas excecionais. Vai ser preciso: reprogramar o PRR, substituindo investimentos; simplificar o regime da contratação pública; flexibilizar o recurso aos tribunais, incluindo provavelmente também a intervenção do Tribunal de Contas; recorrer até á Inteligência Artificial. Foi o Ministro da Coesão que o disse, e ele é um dos maiores especialistas em Portugal em matéria de fundos estruturais.

 

A ENTREVISTA DO MINISTRO DAS FINANÇAS

 

  1. O Ministro das Finanças deu uma boa interessante ao Público/RR. O maior destaque foi dado á ideia de que o desvirtuamento do programa do governo pode dar origem a eleições. Não me parece, porém, o ponto mais relevante da entrevista. Uma afirmação como essa faz parte da tática negocial do OE. Cada parte, em vésperas de negociações, faz a sua pressão. O mais importante são dois outros aspetos:
  • O primeiro é uma novidade em primeira mão: o OE para 2025 vai ter um novo excedente orçamental. É a primeira vez que o governo o diz, de forma categórica. E é um compromisso essencial. Voltar aos défices seria um suicídio político.
  • O segundo também é novo. O governo está aberto a negociar o IRS Jovem e o IRC, calibrando as duas medidas. Ao dizer isto, o MF está a desanuviar o ambiente negocial. Faz bem. São as duas questões mais críticas da negociação. O País precisa de Orçamento e não de crises políticas.

 

  1. Acresce que ficar sem OE e governar por duodécimos seria um desastre social. É preciso recordar as potenciais consequências:
  • Governar por duodécimos significaria que professores, polícias e militares não receberiam as melhorias de salários e de suplementos que foram acordadas para 2025.
  • Governar por duodécimos significaria que em 2025 não haveria aumentos na função pública.
  • Governar por duodécimos significaria que as autarquias locais não teriam aumentos de recursos.
  • Governar por duodécimos significaria que as Misericórdias, as instituições sociais e de apoio à deficiência não teriam quaisquer aumentos e atualizações de apoios em 2025.

 

MEDINA ARGUIDO: TUTTI FRUTTI

 

  1. Começo pela operação Tutti Frutti, que tem já vários arguidos, que envolve figuras do PS e do PSD e que respeita a eventuais negócios ilícitos no âmbito da CM de Lisboa. Para dizer duas coisas:
  • A primeira é um clássico: o atraso. Em sete anos de investigaçãojá devia haver pessoas julgadas. Afinal, não há uma única em vias sequer de entrar em julgamento.
  • A segunda é que não tenho grandes dúvidas de que houve muitas cunhas, favores, negócios e ilegalidades neste processo. Com envolvimento de figuras do PS e do PSD. Logo, apesar de atrasado, este processo deve ir por diante. Custe o que custar. Doa a quem doer. Deve fazer-se justiça.

 

  1. Já quanto a Fernando Medina, acho a sua constituição como arguido, pelos factos vindos a público, um exercício de gargalhada. Ninguém consegue levar esta decisão a sério.
  • Se Medina é constituído arguido por ter dado um subsídio a um clube desportivo, então há milhares de autarcas pelo país inteiro, de todos os partidos, que têm de ser constituídos arguidos. Haja bom senso.
  • Finalmente, como é que Fernando Medina é constituído arguido se a decisão de conceder tal subsídio foi de toda a vereação da CML e ele, no dia dessa decisão, nem sequer estava na reunião? Há decisões muito difíceis de compreender.
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