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29 de Maio de 2016 às 20:20

"Ex cathedra"

A cátedra é uma cadeira, mas não é uma cadeira qualquer, porque é a cadeira de um bispo. "Ex cathedra" designa os ensinamentos e instruções, roçando o infalível, emanadas da dita, ou melhor, daquele que tem o privilégio de nela se sentar.

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Nas escolas de gestão são os professores catedráticos, os mais sábios entre os sábios, a que os americanos, povo com menos História e menos inclinação para línguas mortas, chamam singelamente "chair professors". Na mesma linha chamam às primeiras figuras das empresas "chair men". É americana a defesa da tese de que o "chairman" de uma empresa de capital disperso não deve ser o seu CEO.

 

Entre nós, a doutrina tem-se dividido quanto à bondade de o "chairman" e o CEO serem a mesma pessoa. A favor da separação está o facto de esta solução deixar o CEO livre para se dedicar totalmente à sua função executiva, e contra o facto de ser uma solução mais cara por envolver dois profissionais e de os CEO serem pessoas de alta capacidade, portanto, capazes de fazer a sua função ao mesmo tempo que gerem os conselhos e avaliam e recompensam os respectivos membros. No entanto, mesmo os CEO de alta capacidade podem defrontar algumas dificuldades quando se dedicam a avaliar-se a eles próprios, e porventura ainda mais se confrontados com a difícil situação de terem má, ou menos boa, opinião da sua própria prestação.

 

Este assunto tem merecido ultimamente mais atenção a propósito da estrutura do conselho de administração da CGD. Na administração cujo mandato terminou com o ano de 2015 havia vingado a tese da separação, com um "chairman" e um CEO, estrutura que vários analistas vituperaram com base no facto de se tratar de uma empresa detida pela República. Para estes pensadores, a separação poderá fazer sentido numa empresa Berle-Means, ou não, mas numa empresa do Estado não terá razão de ser. Sem entrar em discussões sobre as vantagens de os Estados se dedicarem alegremente a deter e administrar empresas, a questão merece reflexão.

 

Aparentemente, os defensores da acumulação das funções de Homem da Cadeira e chefe executivo numa empresa da República entendem que, por a empresa ser da República, o exercício do poder deve ser concentrado numa só pessoa. A lógica, confesso, escapa-me. Concordo que as vantagens do exercício dos cargos de "chairman" e CEO por pessoas distintas sejam tanto maiores quanto maior a dificuldade de acompanhamento dos executivos por parte dos accionistas, e que portanto sociedades com accionistas controladores dedicados vivam bem com CEO na cadeira.

 

Não vislumbro é que a República possa ser entendida como um accionista controlador dedicado, ou seja, que os órgãos da República não tenham mais que fazer do que dedicar-se ao controlo de sociedades. Aliás, falando em órgãos da República, temos pelo menos quatro a considerar potencialmente quando se trata de acompanhar a gestão executiva de uma sociedade controlada pela República - o Parlamento, o Governo, o Ministério da Tutela e a estrutura ministerial encarregada de acompanhar especificamente a sociedade em causa.

 

A regra nacional, se existe, parece ser o Governo a nomear, pelo menos, o CEO ou, mais frequentemente, o conjunto da equipa executiva. Na Suécia, onde a Coroa controla cerca de cinco dúzias de empresas e é o investidor com mais peso na bolsa de Estocolmo, não é assim: o Governo nomeia o "chairman" e este o CEO. Cá por mim, ficaria mais tranquilo com Homens da Cadeira nas empresas controladas pela República Portuguesa. Idealmente, professores catedráticos. Isto das cadeiras não é para todos.

 

Professor Associado, IBS

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