Opinião
Bancos e "crédito malparado" - (XCV)
A Europa do euro permanece imobilizada e incapaz de libertar os mercados bancários de uma massa de activos improdutivos que, nalguns mercados, está a travar os fluxos de crédito bancário novo.
1. A Europa do euro está a despertar para a necessidade/urgência de uma solução que envolva os mercados bancários onde o problema do crédito malparado é mais agudo. De facto, têm-se multiplicado declarações reconhecendo que este problema, dada a sua dimensão - 920 biliões de euros de crédito improdutivo nos bancos do euro - permanece como uma ameaça para a estabilidade da própria Zona Euro. Andrea Enria, responsável pela Autoridade Bancária Europeia (EBA)(*), defendeu recentemente a criação de um veículo europeu para os créditos improdutivos (NPL)(**). Por seu lado Danièle Nouy, que preside ao Conselho de Supervisores do BCE, em entrevista recente, reconheceu a necessidade de criar a nível europeu um mecanismo especializado, a que chamou "gestor comum de activos"(***). Este actuaria de modo a compensar a inexistência de um mercado com liquidez, capaz de assegurar a formação de preços equilibrados para este tipo de activos. Apesar deste reconhecimento, a Europa do euro permanece imobilizada e incapaz de libertar os mercados bancários de uma massa de activos improdutivos que, nalguns mercados, está a travar os fluxos de crédito bancário novo, reduzindo deste modo a eficácia da própria política monetária. Questão que assume uma importância central, na medida em que, como resultado, o maior impacto das intervenções do BCE está a fazer-se sentir sobre as condições de financiamento do Estado e não sobre o financiamento da produção e do investimento privados.
2. Entre nós está a ser proposto o desenvolvimento de um "mercado secundário" para os activos malparados que se têm vindo a acumular nos nossos bancos. De modo a apoiar este desenvolvimento, é preconizada a constituição de empresas especializadas na intermediação de operações de colocação destes activos no mercado (AMC na sigla inglesa)(****). Estas propostas passam ao lado de dois tipos de questões que considero críticas: por um lado, sem a intervenção de um mecanismo do tipo referido por Danièle Nouy, estaríamos perante um mercado em que os preços seriam controlados pelos compradores, com fortes perdas potenciais para os vendedores/bancos; mas, por outro, estes créditos não são homogéneos e formam três blocos de natureza distinta: créditos à aquisição de habitação, créditos à construção e créditos a empresas. Enquanto o primeiro bloco deve ser resolvido com soluções que respondam a preocupações de natureza social, o tratamento do segundo pode, de facto, passar pelo desenvolvimento de um mercado especializado, desde que não se verifique um controlo dos preços pelos compradores. Já em relação ao crédito malparado de empresas economicamente viáveis, a negociação com os bancos deve ser articulada com programas dirigidos ao fortalecimento das suas estruturas financeiras e à reorganização dos seus modelos de gestão. O que pressupõe a intermediação de fundos e veículos especializados. Para ter impacto em tempo útil, o impulso inicial deste processo deveria ser dado por entidades capazes de mobilizar adequados recursos técnicos e financeiros, o que poderia ser assegurado pelo IFD em articulação, com o grupo financeiro público e com outras entidades públicas e privadas.
(*)EBA-European Banking Authority; (**)NPL - Non Performing Loans; (***) - Common european asset manager; (****) AMC - Asset Management Company.
Economista