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Salários: uma convergência impossível?

O índice de protecção do emprego em Portugal é, actualmente, ainda o pior entre 36 países da OCDE, apesar das melhorias sucessivas implementadas, por vários governos, nos últimos 10 anos.

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"O presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, deixou ontem em Lisboa, pedidos expressos para que  Portugal não só não anule as reformas feitas, como  aprofunde algumas, em especial a do mercado do trabalho."

 

Dos jornais de 8 de Abril de 2016

 

Foram divulgados, pela Comissão da UE, no início do corrente mês de Abril, a actualização, para 2015, dos valores dos salários horários praticados nos países da união.

 

O salário médio horário em Portugal, líquido das contribuições para a Segurança Social, era 10,5€, em 2015. Este valor representa 45% da média da UE a 15.

 

A consideração isolada deste valor impressiona. Mas, a sua compreensão só se atingirá com uma visão de longo prazo.

 

Há oito observações que devem ser sublinhadas:

 

1. O processo foi irregular e a tendência para a convergência é lenta e ténue;

 

2. O nível relativo dos salários agora divulgado (45% da média europeia) é idêntico ao verificado em 1975;

 

3. Nos últimos 55 anos (1960-2015), o maior valor atingido foi 55% no ano de 2009;

 

4. Entre 1960 e 2015 evoluímos 14 p.p.: de 30%, em 1960, para 45% em 2015;

 

5. Depois da crise financeira (2010-2015) o valor teve uma forte quebra de 10 p.p. Esta quebra foi antecedida de um aumento de 7 p.p. no período de influência do euro antes da crise (1999-2009). As perdas do período pós-crise ultrapassaram os ganhos do período pós-euro (48% em 1999, contra 55% em 2009 e 45% em 2015);

 

6. Notamos dois períodos de sólida convergência: entre 1961 e 1975 e entre 1985 e 1992. Ambos os períodos correspondem a fortes choques de política económica de abertura ao exterior (adesão à EFTA num caso e à CEE no outro). O período 1961-1975 registou um ganho de 16 p.p. e em 1985-1992 o ganho foi de 15 p.p.;

 

7. O período de 1999-2009 conheceu também alguma convergência (7 p.p.), mas de menor intensidade e menos sólida, baseada no empolamento do crédito e com perigo de rápida reversão como se verificou;

 

8. Os períodos de crescimento sólido do salário corresponderam a momentos de reformas económicas substanciais viradas para a competitividade externa.

 

Na actual situação, duas vias parecem atrair os nossos decisores de política económica: um novo fogacho daquele verificado em 1999-2009 ou um verdadeiro impulso como em 1961-1975 e 1985-1992.

 

Há um indicador a seguir, que nos mostrará, com segurança, por onde iremos: a política do mercado de trabalho. O índice de protecção do emprego em Portugal é, actualmente, ainda o pior entre 36 países da OCDE, apesar das melhorias sucessivas implementadas, por vários governos, nos últimos 10 anos.

 

Alguns já se conformaram com os salários baixos.

 

Outros julgam possível recuperar o processo de convergência, evitando os caminhos espinhosos e aspiram a soluções artificiais e transitórias, do tipo do verificado em 1999-2009.

 

Olhando para os últimos 55 anos, é muito forte a probabilidade da continuação da evolução errática dos salários relativos, conducente a uma incontornável permanência da divergência.

 

A menos que se aprenda a lição dos últimos 55 anos e se reoriente a política económica, tendo em atenção as melhores práticas dos nossos concorrentes e parceiros.

 

Economista e professor do ISEG


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