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Dívida de Portugal apanhada no turbilhão Trump
As taxas das obrigações dispararam um pouco por todo o mundo após a eleição de Trump. Portugal não foi excepção, com os juros a chegarem ao valor mais elevado desde o Brexit. É um alerta de que o período de taxas baixas não irá durar para sempre.
As obrigações são uma das maiores vítimas nos mercados da vitória de Donald Trump nas eleições da semana passada. Um pouco por todo o mundo, o valor das obrigações afunda e as taxas de rentabilidade disparam. E já se questiona se a era Trump marcará o princípio do fim dos juros baixos.
A dívida portuguesa não passa ao lado desta tendência. A taxa a dez anos chegou a atingir esta segunda-feira os 3,682%, o valor mais alto desde o Brexit. A subida seria refreada para 3,541% no final da sessão. Antes das eleições nos EUA, a taxa era de 3,222%. Para já, o aumento aparenta não levantar grandes alarmes, segundo alguns analistas contactados pelo Negócios.
Financiamento difícil?
A escalada dos juros ocorre numa altura em que falta a Portugal um leilão de obrigações do Tesouro (OT) para completar o financiamento de médio e longo prazo do ano. Na passada quinta-feira, Cristina Casalinho havia referido ao Negócios que "ainda existe a possibilidade de realização de um leilão de OT até final do ano, assegurando regularidade de presença de mercado". Para o Commerzbank essa operação poderá avançar na próxima semana. Entretanto, esta quarta-feira há uma espécie de ensaio com uma operação de financiamento de curto prazo de até 1.500 milhões em bilhetes do Tesouro.
Mas se o plano de financiamento de 2016 está praticamente completo, o banco alemão levanta algumas preocupações sobre como se fará a gestão da dívida no próximo ano. "A reapreciação das obrigações dos governos da Zona Euro torna os 16 mil milhões de euros de obrigações previstos pelo IGCP a emitir no próximo ano uma tarefa mais difícil", refere David Schnautz, estratego do Commerzbank.
Já Paula Carvalho refere que ainda é cedo para tirar conclusões. "Por enquanto estamos longe de níveis preocupantes, ainda que o prémio de risco de Portugal esteja elevado comparativamente a outros periféricos", diz a economista-chefe do BPI.
No entanto, caso a tendência de subida persista, Paula Carvalho refere que "no limite, a escalada de juros pode ter implicações no plano de financiamento". Explica que "caso a pressão persista, pode levar ao adiamento do reembolso antecipado do empréstimo ao FMI, que se prevê que seja de 1,5 mil milhões de euros em 2017; e pode fazer aumentar o peso das emissões de curto prazo". Além do cancelamento do reembolso, o Tesouro pode ainda tentar apostar mais no retalho ou utilizar parte da almofada financeira.
Jean-Christophe Machado admite que "se esta tendência continuar, Portugal pagará mais para se financiar". Mas realça que "o plano de financiamento não deverá ficar ameaçado". E recomenda que "antes de si tirar quaisquer conclusões o melhor é esperar para ver o que Trump irá fazer, já que isso aparenta ser actualmente o principal foco dos movimentos no mercado".
Apesar da flexibilidade do financiamento, a DBRS, a única agência que mantém Portugal no radar do BCE, tinha alertado na última avaliação que "um período prolongado de taxas de juro elevadas podia impactar negativamente as dinâmicas da dívida".
O fim dos juros baixos?
Mas apesar de muitos analistas estarem ainda com uma abordagem de esperar para ver o que Trump realmente trará aos mercados, Paula Carvalho retira uma conclusão da evolução das taxas nos últimos dias: "A actual tendência recorda sobretudo que o contexto de juros muito baixos é temporário e que o regresso a uma fasquia mais elevada pode ocorrer mais cedo que o previsto".