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O filme de uma semana de nervos à flor da pele nos mercados

Banca europeia, China, Reserva Federal dos EUA, petróleo e, em Portugal, dúvidas sobre a evolução da dívida. Os receios dos investidores são mais que muitos e abateram-se de forma violenta sobre os mercados na última semana.

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13 de Fevereiro de 2016 às 10:00
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2016 está a ser mercado por alta tensão nos mercados. E esta semana foi o reflexo de todos os medos que ensombram os investidores. As acções dos bancos estiveram no epicentro do furacão, com o índice europeu do sector a afundar quase 6%. Os juros de dívida vista como mais arriscada dispararam, no caso de Portugal chegaram a atingir o valor mais alto desde Março de 2014, acima de 4,5%.

A elevada aversão ao risco levou as bolsas europeias a tombarem mais de 4% na última semana, agravando as perdas desde o início do ano para mais de 14%. E, um pouco por todo o mundo, os índices accionistas voltaram a pisar território "urso", em que desvalorizam mais de 20% face ao último pico atingido. O nervosismo foi grande, mas no final da semana houve alguns sinais de esperança, com os mercados a conseguirem conter alguns dos estragos.

A semana arrancou com os investidores a colocarem em causa a solidez de gigantes financeiros alemães. O Deutsche Bank sofreu a bom sofrer com as dúvidas dos investidores sobre a capacidade de pagar as taxas de cupão dos instrumentos de capital contingente (conhecidos como CoCos). Isto depois do banco ter reportado um prejuízo de 6,8 mil milhões de euros em 2015.

A pressão do mercado foi tal que obrigou o gigante alemão a fazer um comunicado a garantir que tinha capacidade para fazer face àqueles compromissos. Até Wolfgang Schäuble, ministro alemão das Finanças, teve de vir a terreiro defender o maior banco alemão.

Isto não são tempos para se ser um banco

Os receios sobre a banca não se circunscrevem ao Deutsche Bank. Gigantes como o Credit Suisse, o Société Générale e o Barclays cederam mais de 9% na última semana e acumulam perdas acima de 28% em 2016. Mas a que se deve uma preocupação tão grande sobre o sector financeiro?

"Não há uma resposta simples", explicou John Raymond, analista do Creditsights, ao Negócios. "As pressões chegam de um grande número de factores – principalmente dos dados macroeconómicos, dos reflexos negativos da regulação nos lucros dos bancos, alguns dos quais não são novos, mas que foram de repente colocados em foco nos mercados".

Os tempos não aparentam estar bons para os bancos. O presidente do Credit Suisse reconheceu mesmo que estes "não são bons tempos para se ser um banco". E quando os ventos não correm de feição aos bancos, o resto do mercado ressente-se.

Super-poderes dos bancos centrais colocados em causa

Como se não bastassem as preocupações sobre o sector financeiro, a actuação e eficácia dos bancos centrais aparenta estar a ser colocada em causa. A promessa de mais estímulos por parte do BCE trouxe acalmia de pouca dura e até a presidente da Reserva Federal do EUA, Janet Yellen, teve de se defender perante o congresso dos EUA, dizendo que não tem culpa da turbulência que se vive nos mercados.

A presidente da Fed apontou o dedo aos receios sobre a economia chinesa, a desvalorização do "yuan" e a queda dos preços das matérias-primas como as fontes de receios dos investidores. E quais os próximos passos na política monetária nos EUA? Yellen tenta fechar o jogo. O ciclo de subida das taxas é para manter de forma gradual, mas, ressalvou, "como é sempre o caso, o cenário económico é incerto".

Nos últimos anos, as políticas não-convencionais dos bancos centrais até têm segurado os mercados. Mas têm-se mostrado cada vez mais ineficazes nos últimos meses, o que obrigou o banco central sueco a cortar as taxas de juro para valores negativos. Isto depois do Banco do Japão se ter juntado ao BCE na lista dos bancos centrais com taxas de depósito negativas.

"À medida que são injectados mais estímulos no sistema, estes remédios têm efeitos mais fracos, requerendo uma dosagem maior para atingir os mesmos resultados", referiram os analistas do Rabobank, numa nota de investimento.

Os receios sobre a DBRS foram manifestamente exagerados?

No meio de tanta turbulência, os activos com maior risco tendem a ser despejados no mercado. As obrigações portuguesas que o digam. A taxa a dez anos subiu de 3,13% no início da semana e chegou a superar 4,5% na quinta-feira.

As chamadas de atenção de Bruxelas em relação ao orçamento português deram argumentos a alguns bancos de investimento para alertar que as medidas constantes no documento poderiam levar a análises negativas das agências de "rating", principalmente da DBRS, a única que segura Portugal num nível que permite ao BCE comprar dívida nacional. E previam que as obrigações portuguesas sofressem nas próximas semanas, aproximando-se daquilo que o Commerzbank considerou como uma "zona de perigo".

Estes receios incendiaram o mercado. E Schäuble aproveitou para lançar avisos: "Portugal tem de fazer tudo para responder à incerteza dos mercados". A pressão do mercado levou Mário Centeno a dar várias entrevistas a órgãos de informação internacionais para garantir aos mercados que o compromisso com a consolidação orçamental era forte e que era importante que os investidores entendessem essa mensagem.

Mas, no meio de tanta pressão, o que pensa afinal a DBRS? A resposta chegou no final da semana. "Neste momento, estamos confortáveis de que o nosso "Outlook" estável sobre Portugal é apropriado", referiu Fergus McCormick, responsável pelo departamento de dívida soberana da DBRS.

E a reacção do mercado não demorou a chegar. As taxas da dívida portuguesa afundaram 37 pontos para 3,734% na sexta-feira.

Sinais de esperança ou controlo de danos?

As notícias positivas ficaram reservadas para o fim. No último dia da semana, as acções da banca, a dívida portuguesa e as bolsas mundiais recuperaram.

O Deutsche Bank confirmou que iria recomprar dívida no valor de 4,9 mil milhões de euros, fazendo questão de enfatizar que "a forte posição de liquidez do banco permite recomprar aqueles instrumentos sem alteração no plano de financiamento de 2016". As acções dispararam mais de 10% e permitiram apagar as perdas sofridas na semana. Pelo meio, gestores de grandes bancos mundiais, como o JP Morgan, estão a aproveitar a fraqueza para comprar acções.

Um sinal de que, afinal, a situação financeira não é tão má como se receava ou que o gigante alemão está a tentar controlar danos? O tempo o dirá.

O índice europeu da banca ganhou 5,60% e o índice europeu Stoxx 600 avançou 2,91%. Mas num 2016 agitado nos mercados, as bolsas tanto mostram recuperações elevadas como têm quedas a fazer lembrar o pior da crise financeira de 2008. Uma espécie de efeito ioiô que indicia a elevada incerteza e falta de rumo dos mercados.

Também a dívida portuguesa está numa encruzilhada semelhante. Após António Costa ter admitido tomar mais medidas para satisfazer as exigências de Bruxelas e a declaração favorável da DBRS, a pressão aliviou. O veredicto final da agência canadiana ocorrerá apenas a 29 de Abril. Antes disso, ainda será colocada à prova com possíveis comentários que tanto a Moody’s como a Fitch poderão fazer em Março.

Para os mercados globais e também para a dívida portuguesa, o próximo mês poderá ser decisivo, com o mercado expectante para ver se Mario Draghi aumenta o arsenal utilizado para vencer a guerra pelo regresso à inflação e se essas munições são eficazes. Disso poderá depender um eventual contra-ataque dos "touros" (expressão que na gíria financeira é associada aos que acreditam na subida dos mercados, devido ao movimento de ataque do touro) ou se os "ursos" continuam a imperar.

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