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Marques Mendes acusa governo de esconder privilégios na Caixa

"O Governo colocou-se de cócoras perante os gestores. E não o devia ter feito. Pensou que ninguém descobria a marosca. E agora está metido num valente imbróglio", disse este domingo o conselheiro de Estado Luís Marques Mendes no seu espaço de comentário na SIC, a propósito do regime de privilégio para a CGD.

Luís Marques Mendes, advogado e comentador político, é o 9.º Mais Poderoso de 2016.
Negócios 30 de Outubro de 2016 às 21:08
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O comentador político Marques Mendes voltou, este domingo, a abordar a questão do regime de privilégio na Caixa Geral de Depósitos, que segundo o Governo dispensa os novos admistradores de apresentarem a declaração de rendimentos ou incompatibilidades. Segundo o conselheiro de Estado, "o Governo tentou esconder o regime de privilégio que criou para a CGD", o que considera "grave".

Marques Mendes afirma que este regime surgiu por três razões. "Primeiro: porque os gestores da Caixa pediram. Estão no seu direito"; "segundo: porque o Governo aceitou o pedido. E não devia ter aceitado. O Governo colocou-se de cócoras perante os gestores. E não o devia ter feito. Pensou que ninguém descobria a marosca. E agora está metido num valente imbróglio"; E terceiro: "António Costa tenta agora ‘tirar o cavalinho da chuva’, dando a entender que nada tem a ver com o assunto. É falso. Tudo isto foi feito porque António Costa concordou e sancionou".

 

"É que tudo isto foi feito às escondidas, de forma camuflada, para ninguém perceber", salientou o conselheiro de Estado, acrescentando que "o Governo escondeu este regime de privilégio de toda a gente – dos seus parceiros de coligação, da Assembleia da República e sobretudo dos portugueses".

 

As provas são claras, sublinha Marques Mendes nas suas notas da semana: "o Governo aprovou a 8 de Junho e Mário Centeno explicou à imprensa o que se pretendia fazer com o decreto-lei (DL). O que diz a imprensa do dia seguinte, invocando as explicações de Mário Centeno? Que o DL era para resolver o problema salarial. Nunca o Ministro fala em escrutínio. Conclusão: o Governo não agiu de boa-fé. Agiu com reserva mental. Desviou as atenções para a questão salarial porque sabia que, se contasse a verdade toda isso provocaria uma tempestade política. Por isso, durante quase três meses, nada se soube. Até a questão ter sido aqui levantada".

"Faz-me impressão que António Costa, que sabia tudo isto, que sancionou tudo isto, venha agora, quando isto cheira a esturro, dizer que ‘eu não tenho nada com isso’", afirma à SIC.

 

E faz sentido este regime de privilégio? "Não", responde Marques Mendes: "um regime de privilégio em questões de escrutínio é um golpe no Estado. Nos princípios do Estado de direito (resposta às alegações do Governo)".

 

E porquê? O antigo líder do PSD explica: "Primeiro: a desigualdade entre gestores. Por que é que há um regime de privilégio em matéria de escrutínio para a CGD e não também para a CP, a Carris, o Metro, ou qualquer outra empresa pública? Elas são todas diferentes – nos desafios, nas responsabilidades e até nos salários. Mas têm que ser iguais no escrutínio dos seus gestores. Por uma única razão: são, todas elas, empresas do Estado".

 

"Segundo: a Caixa responde perante o accionista. Diz o Ministro das Finanças: a Caixa já responde perante o Governo, enquanto representante do accionista. Logo, não é preciso mais escrutínio. Mentira pegada. Responde perante o accionista, como qualquer outra empresa pública, em matéria de gestão, desempenho e resultados. Mas no controlo de rendimentos e património, os gestores do Estado respondem, todos eles, perante uma entidade independente (o TC)".

 

E prossegue: "Terceiro: o argumento da devassa. O argumento mais pitoresco que ouvi em defesa do privilégio da CGD foi a da devassa. Os gestores da CGD não apresentam declarações ao TC para evitar a devassa. Mas também há devassa nos políticos e ninguém vai acabar com as suas declarações de rendimentos. Também há devassa no segredo de justiça e ninguém vai acabar com ele. Em suma: este não é um argumento. É um pretexto para defender um privilégio".

 

Na opinião de Marques Mendes sobre o que deve acontecer agora, a melhor solução seria a de os gestores da Caixa tomarem a iniciativa e disponibilizarem-se a apresentar voluntariamente as declarações de rendimentos. Com mudança ou sem mudança ao decreto-lei do Governo.

 

Administradores da CGD já apresentaram declaração sobre participações noutras empresas

 

"António Domingues deve ser factor de solução e não de bloqueio. Primeiro, porque nesta matéria não lhe assiste razão; segundo, porque está a deixar passar uma imagem de arrogância que não é positiva; terceiro, porque está isolado (nem sequer o PS sustenta esta posição); e, sobretudo, porque um gestor competente também é para estes momentos complexos e tumultuosos e não apenas para os tempos normais. Até porque (e digo-o em primeira mão) eles próprios já apresentaram à IG de Finanças a declaração sobre as participações que detêm noutras empresas", afirmou o conselheiro de Estado este domingo.

 

"A solução alternativa está já em marcha. É a Assembleia da República alterar o DL do Governo. E neste momento BE, PCP, PSD e CDS estão unidos neste objectivo. E já não podem recuar. Uma coisa é certa: era bom desbloquear este assunto nas próximas 24 ou 48 horas", concluiu o comentador político. 


Este sábado, recorde-se, o BE apertou o cerco a António Domingues, ao defender que os salários de gestores públicos devem ser limitados ao ordenado do primeiro-ministro. A iniciativa avança na discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 2017.

 

No passado domingo, 23 de Outubro, Marques Mendes tinha já questionado o Governo sobre este regime de privilégio na CGD, que permite que os novos administradores tenham ficado isentados de obrigações de escrutínio a que estão sujeitos todos os outros gestores públicos, nomeadamente a entrega de declaração de rendimentos no Tribunal Constitucional, a entrega de declaração sobre incompatibilidades e impedimentos na Procuradoria-Geral da República e a entrega de uma declaração sobre participações que detenham em qualquer empresa – devendo esta ser enviada para a Inspecção-Geral de Finanças.

 

Para Marques Mendes, o facto de os gestores da Caixa deixarem de estar obrigados a entregarem a sua declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional "é gravíssimo". Nesse mesmo domingo, o militante do PSD admitia que tivesse sido "um lapso" e pedia que, nesse caso, fosse "corrigido".

 

No dia seguinte, o Ministério das Finanças respondeu, dizendo que o fim da obrigação de entrega da declaração de rendimentos ao "não foi lapso. O escrutínio já é feito". A Caixa "está sujeita a um conjunto de regras mais profundo,  como estão todos os bancos. (...) Os corpos dirigentes da CGD têm de prestar contas ao accionista e aos órgãos de controlo interno. Estão assim disponíveis para revelar essa informação ao accionista", adiantou nessa altura fonte oficial do gabinete de Mário Centeno ao Negócios.


No domingo passado, afirmou hoje Marques Mendes, "admitia que era um lapso. Nesta altura, tenho a certeza que não só não foi um lapso como tem também uma certa perversidade. (…) A decisão do Governo é incorrectíssima".


A posição das Finanças deixa claro que a decisão foi deliberada e permite subentender que o Governo não tem qualquer intenção de voltar a impor aquela obrigação. "A ideia é a CGD ser tratada como qualquer outro banco. Essa foi a razão para que fosse retirada do Estatuto do Gestor Público. Está sujeita a um conjunto de regras mais profundo,  como estão todos os bancos. Não faz sentido estar sujeita às duas coisas", justificou a tutela.


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