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Costa vai meditar sobre mensagem “rica e criativa” de Marcelo sobre apoios sociais
O primeiro-ministro garante que “não tem tempo a perder com crises políticas”, mas diz que a tese de Belém na promulgação dos diplomas que aumentam a despesa é “bastante inovadora do ponto de vista da ciência jurídica”.
Poucas horas depois de ver Marcelo Rebelo de Sousa contrariar a vontade do Governo e promulgar as três leis aprovadas no Parlamento que aumentam os apoios sociais aos pais em teletrabalho com filhos em casa, aos trabalhadores independentes e aos profissionais de saúde, António Costa referiu que "a mensagem do Presidente da República é particularmente interessante, inovadora e rica de conceitos".
Ressalvando que "não [tem] tempo a perder com crises políticas e absurdos do género", o primeiro-ministro resumiu que "o que, no fundo, diz de essencial naquela mensagem é que não há preto e branco (…) e expressamente que o Governo aplicará a lei na estrita medida do que está previsto no Orçamento". "É algo bastante inovador do ponto de vista da ciência jurídica e o Governo tem o dever de meditar nesta mensagem antes de decidir o que fazer", acrescentou.
Em declarações aos jornalistas no final da cerimónia de entrega do prémio IN3+ na Imprensa Nacional-Casa da Moeda, em Lisboa, António Costa referiu que essa meditação sobre se vai ou não recorrer ao Tribunal Constitucional irá demorar "o tempo que for necessário".
Questionado sobre o significado da expressão "rica" neste contexto, garantiu que não se trata de ironia. "A mensagem tem um conjunto de conclusões. É extensa. E o primeiro-ministro deve lê-la da primeira à última palavra. É rica, do ponto de vista de ser complexa, por ter vários elementos e ser também muita criativa", resumiu.
Sobre as condições de governabilidade, o chefe do Executivo socialista respondeu que "só estão em causa quando a Assembleia da República aprovar uma moção de censura ao Governo" e que "até esse dia o Governo está em funções". "Pela minha parte, tenho pouca disponibilidade para a ficção neste momento. Estou mais concentrado em coisas concretas, como assegurar que o plano de vacinação funciona a tempo e horas", concluiu.
Vital Moreira já veio considerar que Marcelo fez um "exercício de ficção constitucional", defendendo que, em caso de dúvida, "é obrigação do Presidente suscitar a fiscalização preventiva". Numa publicação no blogue "Causa Nossa", o antigo juiz do Tribunal Constitucional e ex-eurodeputado do PS escreveu que "não compete ao PR fazer 'interpretação conforme à Constituição' e refazer o alcance normativo das leis que lhe são submetidas para promulgação".
O que está em causa nesta polémica?
Em causa está, por um lado, um diploma que aumenta o valor do apoio à redução de atividade, na medida em que passa a calculá-lo com base na quebra de rendimentos registada face a 2019, antes da pandemia, e não 2020. A medida poderia beneficiar os mais de 100 mil independentes que já pediram o apoio à redução de atividade, aos quais se somará agora um novo grupo de pessoas dos setores do turismo, da cultura, dos eventos e dos espetáculos, no âmbito das alterações que entraram entretanto em vigor.
Há também um diploma que estende o âmbito das medidas excecionais para os profissionais de saúde no contexto da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com a covid-19; e outro que alarga o apoio aos pais a todos os que, tendo filhos com menos de 12 anos, tenham de faltar por causa do encerramento das escolas, ainda que as suas funções sejam compatíveis com teletrabalho. Também este diploma teve o voto contra do PS que, embora tenha alargado o subsídio, não aceitou ir tão longe quanto o Parlamento pretendia.
Esquerda apressa socialistas
Esta segunda-feira, 29 de março, a coordenadora do BE, Catarina Martins, apelou ao Governo para que faça chegar "o quanto antes" os apoios aos trabalhadores promulgados pelo Presidente da República, estranhando que o PS queira fazer agora o contrário do que fez durante a troika. Também o PCP já avisou António Costa que tem de cumprir as leis que reforçam os apoios sociais, em vez de andar a "poupar preocupado com os números do défice".
À direita, o presidente do CDS-PP valorizou a "decisão sensata e humanista" do chefe de Estado. Após acusar o Governo de "sofrer de apagões democráticos quando discorda da vontade do Parlamento", Francisco Rodrigues dos Santos apontou que "valeu a Portugal o seu Presidente, por ter acendido uma luz de esperança para muitos portugueses e por ter impedido mais um boicote governamental ao parlamento".
"O Governo deixou as pessoas para trás porque não acautelou os apoios sociais que eram necessários para fazer face a este período particularmente difícil. E no parlamento, incluindo naturalmente o grupo parlamentar do PSD, apresentámos propostas que entendemos virem a dar resposta a estas necessidades. (…) O Presidente da República veio dar razão ao Parlamento", reagiu à Lusa a deputada do PSD, Helga Correia.
(Notícia atualizada às 13:10 com as posições dos partidos)