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China acusa EUA de "destruírem deliberadamente a ordem internacional"
Depois dos ataques baseados em ações concretas, a escalada na disputa comercial entre Pequim e Washington verificada esta terça-feira é sobretudo retórica. À acusação de manipulação cambial feita pelos EUA, a China reagiu acusando Washington de "destruir deliberadamente" a ordem internacional.
O diferendo comercial entre os Estados e a China transformou-se numa espécie de nova Guerra Fria em que a disputa por melhores condições comerciais já não esconde a competição pela hegemonia económica em curso.
Esta terça-feira, as autoridades chinesas acusaram, num editorial publicado no jornal oficial do Partido Comunista Chinês (PCC), os Estados Unidos de "destruírem deliberadamente a ordem internacional" com recurso ao "unilateralismo e protecionismo".
Mesmo sem nenhuma referência direta a Donald Trump, o editorial não passa ao lado do presidente norte-americano, acusado de estar de tal forma obcecado com as "regalias" dos EUA "ao ponto de destruir as regras internacional e o sistema internacional".
"A responsabilidade dos países grandes passa por assegurar ao mundo a estabilidade e segurança enquanto cria as condições e oportunidades para o desenvolvimento comum de todos os países", sustenta o editorial citado pela imprensa internacional.
Recorde-se que logo no primeiro mês de Donald Trump na Casa Branca, o presidente chinês, Xi Jinping, aproveitou a presença na cimeira de Davos para, depois de se assumir como defensor do multilateralismo e da ordem internacional dominada pela globalização, alertar para os perigos de uma guerra comercial, da qual ninguém poderia sair vencedor.
Aquelas acusações surgem um dia depois de os Estados Unidos terem classificado a China de "manipulador cambial" na sequência da decisão do banco central chinês que ontem desvalorizou para mínimos de mais de 10 anos o yuan (para um patamar abaixo de sete yuans por cada dólar), no que foi uma resposta ao anúncio de mais tarifas sobre os bens chineses anunciada por Trump.
O líder do tesouro americano, Steven Mnuchin, defendeu que Pequim manipula a sua moeda para "obter ganhos concorrenciais injustos no comércio internacional". Mnuchin revelou ainda que Washington vai requerer ao Fundo Monetário Internacional que tome as ações necessárias para "eliminar" essas vantagens concorrenciais alcançadas através da desvalorização da divisa chinesa.
Já esta terça-feira, o Banco Popular da China rejeitou as acusações feitas pelos EUA, que "lamenta profundamente".
O governador do banco central, Yi Gang, assegurou que a China permanecerá fiel ao cumprimento do sistema cambial assente no mercado e "não irá envolver-se numa depreciação competitiva" do yuan nem enquanto arma para lidar com "perturbações externas tais como disputas comerciais".
A desvalorização do yuan repercutiu-se com intensidade nos mercados na sessão desta segunda-feira. As bolsas europeias caíram para mínimos de dois meses, Wall Street registou a pior sessão de 2019 e os juros das dívidas apresentaram um movimento de quedas acentuadas com os investidores a apostarem em ativos considerados seguros perante a perspetiva de escalada na disputa EUA-China.
Entretanto, para minimizar os efeitos daquela medida, o banco central da China revelou estar a colocar títulos de dívida emitidos em yuans, decisão que ajuda a travar a depreciação da moeda.
Além da desvalorização da moeda, a China ordenou ainda a suspensão da compra de bens agrícolas americanos por parte das estatais do país. Tendo em conta que o volume (e montantes) das exportações chinesas para os EUA é substancialmente maior do que as exportações americanas para a China, a capacidade de retaliação chinesa ao nível comercial fica muito aquém daquela que é detida por Washington, pelo que o recurso à desvalorização cambial é a "bala de prata" das autoridades chinesas.
Recorde-se que depois das negociações terem atingido novo impasse na semana passada, quando Trump anunciou a imposição de uma taxa agravada de 10% sobre bens chineses no valor de 300 mil milhões de dólares, acusou também Pequim de não estar a respeitar o compromisso de reforço das importações de produtos do setor primário americano, em particular de soja.
Para superar um dos vários bloquios negociais já verificados nestes cerca de 13 meses de disputa comercial efetiva, Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, acordaram o reforço de compras de bens agrícolas americanos e a prossecução de reformas económicas (em especial no sentido de garantir reciprocidade às empresas americanas) por parte da China.
Já enquanto candidato presidencial, Donald Trump definia como uma das suas prioridades acabar com o défice comercial que os EUA têm relativamente à China, país que já então acusava de manipular artificialmente a moeda para tornar as suas exportações competitivas, subvertendo assim as regras do comércio internacional.
Perante um eventual cenário em que os Estados Unidos viessem a posicionar mísseis de médio alcance na região, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Fu Cong, garantiu que Pequim seria obrigada a adotar as "contra-medidas" necessárias.