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Patrões do Minho lançam grito de alerta: “Portugal continua à bolina dos ventos, sem rumo definido”

“Andamos sempre atrás do prejuízo. Somos bons a pedir dinheiro a Bruxelas para depois, apressadamente, atirar dinheiro de helicóptero pelos serviços públicos convencidos que é suficiente para resolver os problemas da saúde, do ensino ou da justiça. Falta visão. Falta estratégia. Falta qualidade nas lideranças”, considera a AEMinho.

António Costa e Ricardo Costa, presidente da AEMinho.
Rui Neves ruineves@negocios.pt 04 de Setembro de 2023 às 15:55

Numa longa carta ao país, em formato comunicado, a Associação Empresarial do Minho (AEMinho) arrasa a situação socioeconómica em que se encontra Portugal e considera que "a redução efectiva e concreta da carga fiscal é uma emergência nacional", apelando à redução da que incide, por exemplo, sobre os trabalhadores mais jovens, e que "não faz sentido", na fiscalidade empresarial, termos impostos com pagamentos por conta. "É tempo de termos um pacto dos partidos do arco da governabilidade para uma política fiscal coerente, justa e duradoura", defende a organização patronal liderada por Ricardo Costa:

 

"A Associação Empresarial do Minho (AEMinho) vê com grande preocupação e apreensão a continuação do modelo fiscal adotado em Portugal que é, indubitavelmente, um dos maiores fatores de estagnação e atraso no desenvolvimento do país, representando em simultâneo um fator de enorme preocupação social, pela injustiça que representa e pelas dificuldades que cria aos portugueses e às empresas portuguesas.

 

Portugal tem uma arquitetura fiscal complexa e, para além disso, completamente desajustada da qualidade dos serviços e garantias que deviam ser assegurados pelo Estado.

 

Não temos um Sistema Nacional de Saúde eficaz, nem capaz. A justiça não é célere. Poucos são os portugueses que acreditam na viabilidade da Segurança Social. O ensino em Portugal está decrépito e, considerando o número de professores que se prevê aposentar-se nos próximos anos, antecipa-se o colapso do ensino básico e secundário. Não há habitação para jovens, nem para não jovens. A tão propalada ‘geração mais qualificada de sempre’ ou emigra ou tem de viver em casa dos pais em média até aos 33 anos.

 

Não há uma estratégia para atrair investimento. Não há uma estratégia, não há sequer um plano, para fixar a ‘geração mais qualificada de sempre’ no nosso país. Depois dos jovens talentos saírem, o país promete-lhes 5 anos de vantagens fiscais.

 

Andamos sempre atrás do prejuízo. Somos bons a pedir dinheiro a Bruxelas para depois, apressadamente, atirar dinheiro de helicóptero pelos serviços públicos convencidos que é suficiente para resolver os problemas da saúde, do ensino ou da justiça.

Falta visão. Falta estratégia. Falta qualidade nas lideranças. O país continua à ‘bolina dos ventos’. Sem rumo definido.

 

Apesar da força do nosso turismo, a economia dá sinais de abrandamento ou até estagnação. As taxas de juro estão a asfixiar as famílias portuguesas e a acabar com a réstia de esperança dos jovens comprarem casa e se fixarem em Portugal.

 

Às empresas, os governantes pedem que exportem, criem valor e aumentem os salários. Temo-lo feito. Reconhecido por todos. Temos de ser mais a fazê-lo e temos de conseguir fazê-lo mais rápido. Estamos a fazer a nossa parte.

 

O que é que nós temos do Estado?

 

Uma propositada dependência dos subsídios e a nona maior carga fiscal da OCDE. Na lista dos 38 países da OCDE, Portugal surge em 9º. lugar na tabela que avalia a carga fiscal sobre o trabalho. Os portugueses são dos que pagam mais impostos.

 

Em 2022, a carga fiscal subiu pelo quarto ano consecutivo e este agravamento foi mais pesado para as famílias de menores rendimentos. Um casal com dois filhos e um salário de 1.500 euros brutos entregou ao Estado 15% do que ganhou. Há 12 anos, descontava 8,8%.

 

O relatório da OCDE, divulgado em abril, diz que Portugal aplica impostos de forma arbitrária e sublinha que seria importante adoptar políticas que suavizem os efeitos do agravamento fiscal.

 

Sobre a preocupação do Estado em garantir uma receita fiscal em crescendo, veja-se que a mesma aumentou cerca de 15% só no ano de 2022, para um valor inaceitável de 36,4% do PIB.

 

Até julho de 2023, a receita fiscal do Estado já aumentou 9,2%. Isto é um claro fator de subdesenvolvimento e de injustiça fiscal que representa uma despreocupação do Estado com o desenvolvimento do país, focando-se antes na garantia de manutenção da avassaladora máquina do Estado numa clara estratégia de gestão eleitoral, tendo em conta o número de beneficiários diretos do Estado ou do Orçamento do Estado.

 

Mesmo a estratégia de investimento na Economia, tal como vimos com as opções do PRR, centra-se na dependência da economia da contratação pública ou de projetos de natureza pública. É uma gestão claramente eleitoralista que, infelizmente, tem sido alimentada por sucessivos governos, com algumas exceções.

 

No que se refere à complexidade do sistema fiscal, o que verificamos é uma teia fiscal assente em taxas e taxinhas, arquiteturas de incidências fiscais com inúmeros escalões, um procedimento assente no princípio da má-fé do contribuinte e na boa-fé do Estado no que se refere a cobranças das contribuições, o que não corresponde de todo à realidade, bem como uma impercetibilidade do sistema que pretende apenas beneficiar o Estado e retirar capacidade crítica aos contribuintes.

 

Atualmente, cada cidadão teria de ser um fiscalista esclarecido, para poder entender e atuar sobre tudo o que lhe é cobrado. Não podemos ter um sistema que se torna complexo para não ser escrutinado. É uma subversão completa daquilo que deve ser a relação do Estado com os cidadãos.

 

Temos um sistema de escalões que está completamente desajustado da realidade do país. Em Portugal, um contribuinte que aufira 2.740€ está num escalão elevado, com contribuições elevadas e, provavelmente, nem consegue arrendar uma casa ou constituir uma família estável.

 

Esta discrepância absurda entre a carga fiscal, o escalonamento das contribuições e a realidade socioeconómica do país, tem um impacto brutal nas empresas e na sua capacidade de contratar, ou manter trabalhadores motivados e realizados. Mais uma vez, é um caso de profunda injustiça fiscal e um fator de subdesenvolvimento da economia.

 

Por fim, a gestão da coisa pública. São constrangedores os exemplos que temos de maus governantes e maus gestores públicos, ao longo dos anos. Casos como a TAP, a CP, a gestão pública dos hospitais, entre outros, são exemplos cabais da incapacidade do Estado em gerir bem, com eficiência e com resultados que sirvam o interesse público.

 

Há que entender o que são as funções essenciais do Estado e não divergir para áreas de mero interesse político partidário, na distribuição de cargos e funções.

 

Está na hora de passarem da Poesia à Matemática

 

No que diz respeito ao sistema fiscal, a AEMinho considera que seria fundamental a adoção de algumas medidas com efeitos reais e imediatos, do ponto de vista da arquitetura fiscal em Portugal.

 

A redução efetiva e concreta da carga fiscal é uma emergência nacional. Falamos de uma redução significativa e efetiva, não falamos de reduções pontuais e insignificantes. Falamos de algo que tenha, de facto, impacto na vida dos portugueses e falamos, essencialmente, dos impostos e contribuições que incidem sobre o trabalho, a saber IRS e descontos para a segurança social.

 

Não podemos eternizar o falhanço que foi o esquema de segurança social adotado no passado, pressionando os trabalhadores com cargas de contribuições elevadas.

 

Mesmo o sistema tem de ser repensado, na medida em que, claramente, foi e é um fracasso do ponto de vista da sua sustentabilidade. Pensar num sistema no qual o contribuinte possa optar e assumir escolhas em matéria de contribuições, com a respetiva correspondência nas futuras pensões e assistência, seria um passo importante. Mais uma vez, evidenciamos que o Estado não gere melhor do que o privado, como aliás é evidente pelo estado em que se encontra a segurança social em Portugal.

 

Do ponto de vista do IRS, é urgente fazer com que ele reflita o tecido social em Portugal. Somos um país assente na classe média e os escalões de IRS deve refletir isso mesmo. Menos escalões, com uma incidência de contribuições nos rendimentos mais elevados e com menos incidência nos rendimentos mais reduzidos, mas com uma correspondência realista na situação económica e no seu impacto nos rendimentos.

 

Ou seja, não podemos considerar ricos, contribuintes que nem uma casa conseguem arrendar ou que não conseguem tão pouco fazer face à escalada inflacionista. Tem de existir um observatório que acompanhe e ajuste estas situações.

 

Redução de taxas. É imperativo que as taxas que nos são cobradas, muitas vezes quase sem que nos possamos aperceber, sejam reduzidas e muitas vezes eliminadas.

 

Não é sustentável nem próspera uma economia na qual se paga ao Estado para fazer tudo, mesmo e essencialmente o que nem consome recursos do mesmo, nem tem sequer relação com ele. É mais uma questão de lisura. Os cidadãos não se apercebem dos milhões de euros que pagam em taxas e taxinhas pelo poder que o Estado tem de complicar e maquilhar estes processos.

 

Fiscalidade empresarial. As empresas não podem ser o ‘Banco do Estado’. A quantidade de impostos, como os pagamentos por conta, que refletem um adiantamento daquilo que a empresa ainda não produziu, é profundamente imoral. Não faz sentido termos impostos com pagamentos por conta. Não é exigível que as empresas tenham a capacidade de adiantar dinheiro ao Estado.

 

As empresas têm um papel contributivo essencial e esta associação defendeu inclusive, em tempos difíceis, que as empresas contribuíssem na mesma proporção do Estado para a redução da carga fiscal sobre o trabalho. No entanto, perante o aumento enorme da receita fiscal já nem esta medida faz sentido.

 

O maior fator de desenvolvimento do país, a iniciativa privada, não pode ser sempre fustigada com uma carga fiscal que lhe retira competitividade, muitas vezes no mais elementar, contratar.

 

É tempo de termos um pacto dos partidos do arco da governabilidade para uma política fiscal coerente, justa e duradoura. Não podemos colocar a vida das pessoas e o desenvolvimento do país à mercê de calendários eleitorais e de conveniências político-partidárias.

 

Em matérias essenciais, Portugal precisa de uma estratégia e de um compromisso de longo prazo, estruturado e justo, que comprometa todos os atores políticos ou, na impossibilidade disso, pelo menos os que vão rodando nos cargos de governação do país."

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