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Schäuble: "Portugal deve manter anterior rumo. Mercados estão já nervosos"
"Encorajamos fortemente os nossos colegas portugueses a não se desviarem do rumo bem-sucedido que vinha sendo seguido", disse o ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble.
O ministro alemão das Finanças aconselhou o Governo de António Costa a não abandonar o rumo que vinha sendo seguido pelo executivo de Passos Coelho, afirmando que a anterior trajectória estava a ser "bem-sucedida", ao passo que a actual está a ter reflexos negativos nos mercados, com o acentuado agravamento dos indicadores que sinalizam as condições de financiamento do Estado e da economia portuguesa.
"Encorajamos fortemente os nossos colegas portugueses a não se desviarem do rumo bem-sucedido que vinha sendo seguido", disse Wolfgang Schäuble à chegada à reunião do Eurogrupo, que decorre esta tarde em Bruxelas. "Vemos que os mercados já estão a ficar nervosos", acrescentou, citado pela Bloomberg. "Estamos atentos aos mercados financeiros e Portugal deve estar ciente de que pode perturbar os mercados financeiros se der impressão de que está a inverter o caminho que tem percorrido. O que será muito delicado e perigoso para Portugal", terá afirmado o ministro alemão, agora citado pela Lusa.
Talvez seja preciso rever o OE
O ministro alemão falava hoje à chegada da reunião do Eurogrupo onde se avaliará a situação económica e orçamental de Portugal. O encontro surge num contexto de aversão generalizada ao risco, num dia em que a taxa exigida pelos investidores para deterem dívida portuguesa ultrapassou a barreira dos 4% pela primeira vez desde Março de 2014 e em que aumentam as preocupações sobre qual será a reacção da DBRS às medidas do Orçamento do Estado para 2016. A agência canadiana é a única que mantém Portugal em grau de investimento, o que permite à dívida portuguesa ser incluída no programa de compras do BCE. "Se a DBRS tomar alguma decisão que piore o rating da República, os efeitos serão drásticos e para já, nem gostaria de colocar essa hipótese", refere o director da gestão de activos do Banco Carregosa, Filipe Silva.
Em Bruxelas, antes de Schäuble falara o presidente do Eurogrupo. Jeroen Dijsselbloem disse que o governo português tem de estar "preparado para fazer mais, se tal se revelar necessário" de modo a evitar derrapagens nas contas do Estado e que a pressão dos mercados é "outra razão para [o governo] estar comprometido com a orientação das políticas económicas e as regras orçamentais europeias". Dijsselbloem desdramatizou, porém, o contexto em que se encontra Portugal, dizendo que o Orçamento português "não é o primeiro nem o único em risco de não cumprir as regras". O governo português, acrescentou, tem afirmado que está muito comprometido com o PEC e com as regras europeias. "Esse compromisso é muito importante, é um sinal de confiança, e esperamos voltar a ouvi-lo hoje", disse o também ministro holandês das Finanças numa referência a Mário Centeno.
Costa diz que não há razão para alarme nem para mexer no Orçamento
Em Lisboa, pela mesma hora, António Costa também desdramatizava a subida dos "juros" das obrigações emitidas pelo Tesouro português, considerando que se trata de um fenómeno global. "Ao longo de toda a semana, tem havido uma evolução dos juros no conjunto da Zona Euro, de que Portugal não é isento. Acho que há causas várias mas seguramente, hoje, a conclusão do Eurogrupo sobre a apreciação do Orçamento do Estado ajudará a reforçar a confiança", disse após uma reunião com deputados do grupo parlamentar socialista. "Estamos atentos ao que vai acontecendo", afirmou, ainda, o líder do Executivo. "A instabilidade é global, internacional, afecta mais uns países que outros. Estamos olhando atentamente para esta situação", dissera também pouco antes Maria Manuel Leitão Marques, no final da reunião do Conselho de Ministros.
O Eurogrupo está reunido esta tarde em Bruxelas, onde avaliará a situação portuguesa, na sequência da conclusão da missão de supervisão pós-programa e depois da adopção, na semana passada, do parecer da Comissão sobre o esboço orçamental para 2016.
Em norma o Eurogrupo segue o essencial da análise da Comissão Europeia, pelo que deverá "concordar" com a constatação de que as grandes linhas da proposta do Orçamento do Estado para 2016 estão "em risco de não cumprir as disposições do Pacto de Estabilidade e Crescimento" e instar Lisboa para que "adopte as medidas necessárias" para assegurar que o Orçamento de 2016 "ficará conforme". Por norma também, o responsável das Finanças do país visado – no caso, Mário Centeno - assume esse compromisso de evitar derrapagens perante os seus pares e o resultado é uma curta declaração, que é divulgada no final da reunião, na qual o Eurogrupo "saúda" essa iniciativa.
Défice ainda rondará limite de risco de 3%
Ao chegar ao encontro, Pierre Moscovici enquadrou o debate. "Depois de discussões construtivas e aprofundadas concluímos que o Orçamento de Portugal não está em contradição com as regras europeias mas apresenta riscos de não conformidade com o PEC. Vamos continuar a trabalhar estreitamente [com as autoridades portuguesas] para assegurar que os compromissos orçamentais são assumidos. Acreditamos que Portugal vai permanecer em linha com reformas destinadas a muscular a produtividade e criar emprego para os jovens", acrescentou o comissário responsável pelos Assuntos Económicos.
Avisos mais sérios vieram do vice-presidente da Comissão Europeia responsável pelo euro, segundo o qual, mesmo após as alterações exigidas por Bruxelas ao "esboço" original, o Orçamento português de 2016 continua em zona de alto risco. Em entrevista ontem à SIC, Valdis Dombrovskis qualificou de "arriscada" a estratégia de António Costa e de Mário Centeno; disse que o governo apenas "cumpriu o mínimo" para que o Orçamento não fosse considerado em "grave risco" de incumprimento das regras europeias (nesse caso, teria de ter sido formalmente devolvido a Lisboa) e que "não está garantido que, com este Orçamento, Portugal consiga corrigir o seu défice excessivo" – uma referência à possibilidade de, no final deste ano, o défice ficar acima de 3% do PIB. O governo inscreveu um défice de 2,2% na proposta de OE. Portugal tinha prometido um défice máximo de 3% em 2015, meta que não terá sido cumprida, em boa medida devido ao custo da resolução do Banif.
Risco de derrapagem: 155 milhões
Bruxelas começou por considerar que os planos orçamentais de António Costa corriam o "grave risco" de violar as regras europeias, e antecipava que estes levassem a um agravamento do défice nominal deste ano para 3,4% (e para 3,5% em 2017) e também a um agravamento do défice estrutural em 1,1 pontos percentuais. Com as novas medidas de austeridade entretanto propostas pelo governo a Comissão antecipa que possa registar-se uma melhoria do saldo estrutural entre 0,1 e 0,2 pontos, quando havia pedido uma correcção de 0,6 pontos no Verão passado (não foram divulgados números revistos para o défice nominal).
O governo, por seu turno, confia que, no plano orçamental revisto, o défice estrutural cairá 0,3 pontos e o nominal será contido em 2,2% do PIB. Quanto ao cenário macroeconómico, o previsão inicial de Mário Centeno enviada para Bruxelas assentava num crescimento de 2,1%, agora é de 1,8%, mas este número permanece acima da previsão de 1,6% da Comissão.
Novo exame em Maio
Uma nova avaliação à situação económica e orçamental portuguesa terá lugar em Maio, à luz dos números definitivos da execução de 2015 (que serão conhecidos no final de Março), das novas previsões macroeconómicas europeias (que serão actualizadas em Abril) e dos novos compromissos do governo sobre as medidas que tenciona tomar para concretizar a promessa de novas reduções do défice e da dívida públicos, designadamente para 2017 e 2018 (que terão de ser concretizados no âmbito da actualização do programa de estabilidade que o governo terá de entregar a Bruxelas até, o mais tardar, o fim de Abril). Se o exame nestas três dimensões for negativo, Portugal arrisca ficar sob vigilância ainda mais apertada e, no limite, pode enfrentar sanções.
(notícia actualizada às 15h00)