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Irlanda não quer concessões gregas e Espanha sinaliza que solidariedade está no limite

"Concessões são para países sob programa. Felizmente esse não é mais o nosso caso, nem quero que venha a ser", diz o ministro irlandês das Finanças. Já o seu colega espanhol alega que o seu país foi o mais solidário com a Grécia, sinalizando que pedir mais pode ser demais.

Getty Images
11 de Fevereiro de 2015 às 19:13
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O ministro irlandês das Finanças, Michael Noonan, afirmou nesta quarta-feira que se os países do euro oferecerem concessões à Grécia não procurará que estas sejam estendidas à Irlanda. "Concessões são para países sob programa [de assistência]. Felizmente esse não é mais o nosso caso, nem quero que venha a ser", respondeu aos jornalistas à chegada a Bruxelas, onde decorre uma reunião extraordinária de ministros das Finanças para tentar perceber o que quer o novo governo grego e definir um método e calendário de trabalho para enquadrar um novo compromisso entre a Grécia, os demais países e instituições europeus e FMI .

 

Tal como a generalidade dos seus colegas, Noonan queixou-se de ter "muito pouca informação" sobre os planos gregos. Quanto ao ponto de partida para um novo programa de assistência a Atenas, para substituir o da troika que termina no fim deste mês, o ministro irlandês convergiu também com os seus pares, ao afirmar que os compromissos assumidos pelo Estado grego e os procedimentos europeus têm de ser respeitados.

 

Já Luis de Guindos, ministro espanhol das Finanças, advertiu Atenas de que Espanha foi o país mais solidário com a Grécia, sinalizando que se Atenas pedir mais, pode ser demais. O ministro espanhol lembrou que custou caro a Madrid ir aos mercados para emprestar à Grécia em 2010, ainda antes do resgate à banca de Espanha, e que neste momento há 26 mil milhões de euros garantidos pelos contribuintes espanhóis em jogo, assim como uma forte exposição de empresas e bancos espanhóis ao país.

 

Esta tarde decorre em Bruxelas o primeiro encontro entre Yanis Varoufakis (na foto) e os outros 18 ministros das Finanças do euro. A partir de hoje, os títulos de dívida grega deixam de ser aceites como garantia pelo BCE.

 

O que separa Atenas de Bruxelas?

 

Após vários avanços e recuos, não é claro o que Atenas quer em concreto, mas é claro que quer qualquer coisa que possa ser apresentada como uma ruptura com o passado, pelo que diz que não negociará mais com a troika, nem seguirá a sua receita de ajustamento e, consequentemente, não pedirá a última fatia do empréstimo, globalmente avaliada em 7,2 mil milhões de euros. 

 

O novo governo grego quer ainda uma negociação a dois tempos: um acordo de transição para fazer a "ponte" entre o programa da troika que expira no fim deste mês e um "novo acordo global" - um "New Deal" - que, na sua expectativa, poderá ser concluído em Setembro, assente em "novas políticas para a Europa" e numa nova reestruturação dos cerca de 240 mil milhões de euros que a Grécia deve aos países e instituições europeias. Segundo a consultora Lazard, contratada pelo novo Governo, é preciso abater 100 mil milhões para trazer a dívida dos actuais 175% para 120% do PIB. Em Março de 2012, a Grécia já obteve dos credores privados o maior perdão de dívida de que há registo.

 

Yanis Varoufakis, ministro grego das Finanças, tem dito ainda que quer virar a página da austeridade, mas que, pelo menos neste acordo temporário, aceita prosseguir 70% das reformas preconizadas no programa troika. Quer ainda metas mais suaves: excedente orçamental primário (sem juros da dívida) de 1,5%, metade do previsto no Orçamento grego em vigor que, recorde-se, foi aprovado à revelia da troika que considera as suas metas e pressupostos irrealistas, tendo identificado um "buraco" de 1,7 mil milhões de euros (esta foi, aliás, a causa próxima da extensão do programa grego até ao fim deste mês, quando devia ter terminando em Dezembro de 2014).

 

Sobre o muito controverso tema das muito adiadas privatizações na Grécia, Varoufakis deu ontem indicações de que, afinal, a privatização do porto do Pireu pode prosseguir (as negociações com os chineses da Cosco estavam avançadas), mas no mesmo dia o ministro dos Transportes fez declarações no sentido oposto.

 

Quanto ao financiamento, diz que não quer receber a última tranche do programa da troika, mas quer o respaldo europeu para emitir mais oito mil milhões de euros em bilhetes do tesouro, ou seja, dívida de muito curto prazo. 

 

A resposta da Europa

 

Já os parceiros europeus insistem que programa de assistência em vigor é o ponto de partida, até porque está a produzir resultados. A Grécia voltou a crescer em 2014 e apresentou excedente orçamental primário, dando o primeiro passo para reconquistar autonomia financeira e prescindir de mais "muletas", argumenta Bruxelas.

 

Isso significa que o essencial dos compromissos e das metas acordadas entre o Estado grego e os governos europeus, a troco dos 240 mil milhões de euros emprestados, terá de ser cumprido, independentemente do nome que se possa dar ao novo contrato para substituir o programa da troika que caduca no fim deste mês. Anular dívida, como era a proposta inicial do Syriza entretanto abandonada, está fora de questão. Já estender mais os prazos de carência (15 anos), de reembolso (30 anos) ou descer juros (hoje, em 2%) dos empréstimos europeus, talvez.

 

Vários países europeus, com Espanha à cabeça, dificilmente aceitarão a negociação a dois tempos pedida por Atenas, porque isso significaria aceitar como dado adquirido uma nova crise marcada para o Outono – altura em que há eleições em Portugal e em Espanha, onde o Podemos (próximo do Syriza) lidera as sondagens.

 

Flexibilidade sim, mas pouca


Contudo, há abertura para alterar medidas, desde que não se comprometa a trajectória do país, havendo simultaneamente abertura para flexibilizar as metas orçamentais para acomodar mais despesa social destinada aos mais vulneráveis (a taxa de desemprego está a cair na Grécia, mas é a mais alta da Europa, em 24%). Em contrapartida, dificilmente haverá luz verde para Atenas voltar a adiar privatizações, essencial para abater dívida, e o novo governo terá de dar provas concretas de que a luta que promete contra a enorme e tradicional evasão fiscal no país não se fica pelo plano das intenções. Proposta de aumento no IVA na restauração e hotelaria, dos actuais 6,5% para 13%, pode regressar.

 
Sobre o financiamento, a extensão do actual programa por seis meses (como a Europa propusera em Dezembro) é possivelmente a base de trabalho mais viável para um compromisso em torno de um acordo de transição. Há 7,2 mil milhões por transferir (contando com FMI, cuja palavra neste novo arranjo entre europeus será também determinante), e ainda 11 mil milhões de euros, originalmente destinados à recapitalização dos bancos, que estão por usar. 

 

Esta opção é seguramente mais barata e certa do que financiar a Grécia com BT. A título de exemplo, o Tesouro grego emitiu hoje 1,13 mil milhões de euros em títulos que se vencem dentro de três meses, tendo prometido pagar os mesmos 2,5% de juros oferecidos hoje por Portugal e Espanha, mas por empréstimos a dez anos e trinta anos, respectivamente. Os empréstimos europeus custam neste momento à Grécia cerca de 2%, têm maturidade de 30 anos e foi acordado um período de dez anos de carência para o pagamento de juros.

 

 

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