Notícia
Costa cercado por duas "frentes frias" de Bruxelas
António Costa recebe dois pesos pesados da Comissão Europeia, preocupados com o rumo orçamental e das políticas económicas. Voltará a ouvir que há o risco de Bruxelas passar à fase mais dura, talvez das sanções, por causa de ambas.
Pela segunda vez em duas semanas, António Costa reúne-se nesta quarta-feira com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, que está em Lisboa para a tomada de posse de Marcelo. No dia seguinte receberá Pierre Moscovici, o comissário dos Assuntos Europeus, que também se reunirá com Mário Centeno.
Temas incontornáveis: a trajectória orçamental neste ano e no próximo e o rumo das políticas económicas. Ambas estão em risco de chocar de frente com as regras europeias e forçar a Comissão Europeia a accionar os mecanismos mais duros de vigilância e de avaliação quase contínuas – muito semelhante às missões trimestrais dos tempos da troika. No limite, existe o risco de Portugal inaugurar a fase das sanções, nunca testada. O tempo das grandes decisões está ao virar da esquina: Maio.
Em relação à trajectória orçamental, mesmo depois de quase mil milhões de austeridade adicional, Bruxelas ainda duvida que o Orçamento de 2016 contenha a margem de segurança mínima. Quer um "plano B" pronto a ser aplicado "quando" necessário, como havia sido decidido pelo Eurogrupo. Teme ainda que o Governo não consiga apresentar, até ao fim de Abril, uma programação orçamental assente em medidas credíveis que permita antecipar que o défice de 2017 será igualmente "claramente" inferior ao limite de 3% do PIB.
Sem essas garantias, Bruxelas terá de apertar o procedimento dos défices excessivos, no qual o país está mergulhado há largos anos por manter défices superiores aos 3% – ciclo que o anterior Governo prometera interromper no fim de 2015.
No plano das reformas económicas, ficou-se ontem a saber que Portugal manteve-se no grupo de cinco países com "desequilíbrios excessivos" no funcionamento da economia, o que levará a Comissão Europeia a apertar a vigilância sobre a forma como estão a evoluir as reformas estruturais. Elevado endividamento (público e privado) e o impacto da subida do salário mínimo no emprego são domínios que preocupa.
"Vale a pena notar que para os países com desequilíbrios excessivos, a Comissão Europeia pode activar o braço correctivo do procedimento a qualquer momento", advertiu esta terça-feira, em Estrasburgo, Valdis Dombrovskis, citado pelo Expresso. Questionado se Bruxelas está agora mais preocupada com Portugal, sublinhou que "o que é importante é que o país se mantenha em linha com a responsabilidade macro-económica e das políticas orçamentais".
Dívida em risco de ficar "fora de controlo"?
António Costa e Mário Centeno têm tomado "boa nota" das advertências de Bruxelas, que julgam, porém, injustificadas. Ainda nesta segunda-feira, o primeiro-ministro fez saber que não identifica os mesmos riscos que a Comissão, prometendo porém que "preparar-nos-emos para qualquer eventualidade, porque a nossa determinação de alcançar os objectivos previstos no orçamento é total".
Bruxelas avisava ainda que "sem esforços adicionais de consolidação orçamental e reformas estruturais favoráveis ao crescimento para salvaguardar a sustentabilidade das finanças públicas será muito difícil reduzir significativamente os níveis da dívida", que poderá ficar "fora do controlo". "Uma trajectória insustentável da dívida poderia ter um impacto muito adverso na estabilidade económica de Portugal e repercussões negativas para o exterior por via do risco soberano", acrescentava.
As taxas de juro da dívida pública não voltaram aos picos de Fevereiro depois de o Governo se ter comprometido com o "plano B". Mas em Bruxelas sublinha-se que a deterioração dos custos de financiamento de Portugal é real, mede-se pelo alargamento do prémio de risco face à dívida alemã e significa mais endividamento: a longo prazo, um aumento de 1% nos custos de financiamento do Estado significam um acréscimo de dois mil milhões de euros na factura anual dos juros.
17 DE MARÇO
Ponto de situação
A cimeira de 17 e 18 deste mês será dedicada à economia europeia e às orientações que devem ser seguidas pelos governos. Será uma primeira oportunidade para avaliar ao mais alto nível a situação de Portugal. No seio da Zona Euro, Itália, França e Grécia são, por motivos distintos, os outros países que mais preocupam.
FIM DE MARÇO
Contas de 2015
O INE divulga o défice de 2015. Passos Coelho assumira como "ponto de honra" um défice máximo de 3% do PIB, o que permitiria cumprir um dos critérios para Portugal iniciar a saída do procedimento dos défices excessivos. Mário Centeno confirmou que o indicador tinha condições para ficar abaixo 3%, descontando o custo do Banif. Mas o ministro das Finanças acabou por inscrever 3,2% no défice de 2015 quando apresentou a proposta de OE de 2016, onde prevê uma redução do indicador para 2,2%. Ontem, o PS falava já de desvio de "mais de mil milhões de euros"; o PSD respondeu que os socialistas estão a "inventar números" para desviar responsabilidades sobre a necessidade de um "Plano B" para 2016.
FIM ABRIL
Plano B
Mário Centeno comprometeu-se em 11 de Fevereiro no Eurogrupo em preparar "desde já" um conjunto de medidas para aplicar "quando necessário". Ficou estabelecido que esse "plano B" seria submetido à Comissão Europeia até ao fim de Abril. Pierre Moscovici vem agora falar com o António Costa e Mário Centeno sobre essas medidas. No entendimento das instituições europeias, mais medidas de austeridade sobre o Orçamento de 2016 (que só recebeu luz amarela de Bruxelas depois de mil milhões de austeridade adicionais face aos planos iniciais do governo) não é uma questão de "se" mas apenas de "quando", ao contrário do que tem dado a entender o governo.
Novo programa nacional de reformas e actualização do programa de estabilidade
Governo tem de apresentar o novo plano de reformas estruturais e, paralelamente, o novo programa de estabilidade, com dados sobre a execução de 2016, metas e medidas para anos seguintes, particularmente detalhadas para 2017.
MAIO
Bruxelas avalia e propõe recomendações e/ou sanções
Em função dos elementos e garantias recebidos dos governos e das novas previsões macroeconómicas, Bruxelas decide se – e como – aperta o crivo às políticas orçamentais e económicas dos Estados-membros. No caso de Portugal, será nessa altura que se perceberá se haverá necessidade de pôr em marcha um OE rectificativo e se Bruxelas avançará com proposta de acompanhamento mais apertado da governação em Lisboa ou, no limite, com sanções. Esse risco de sanções é maior no âmbito do "procedimento dos défices excessivos", mas também existe devido à reversão de medidas de política económica no quadro do "procedimento dos desequilíbrios macroeconómicos".