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Líder catalão recusa esclarecer Rajoy sobre independência da Catalunha
Carles Puigdemont respondeu dentro do prazo exigido por Madrid, mas continua sem clarificar se o discurso feito no Parlamento catalão foi ou não uma declaração de independência desta região espanhola.
O tom é conciliador, mas falha a principal exigência feita pelas autoridades de Madrid: a de clarificar sobre se houve ou não uma declaração de independência na sessão parlamentar da passada terça-feira, em que Carles Puigdemont fez uma espécie de declaração simbólica de independência e de seguida suspendeu o seu efeito para dialogar com o governo central.
Na carta enviada esta manhã a Mariano Rajoy, publicada pela Catalunya Ràdio e pela RAC1, o líder do governo regional não respondeu directamente à questão, repetindo antes que "a prioridade do [seu] governo é procurar com toda a intensidade a via do diálogo". "Queremos falar, como o fazem as democracias consolidadas, sobre o problema do povo catalão que quer iniciar o seu caminho como país independente no contexto europeu".
"A suspensão do mandato político que resultou das urnas a 1 de Outubro [referendo] demonstra a nossa firme vontade de encontrar a solução e não o confronto", argumentou Puigdemont, disponibilizando-se para acordar "o tempo e as formas" como a Catalunha passará a ser uma república independente.
O polémico presidente do governo regional (Generalitat), que sucedeu a Artur Mas em 2016, falou ainda numa "proposta de diálogo sincera e honesta" e num prazo de dois meses para essas conversações com o envolvimento de "instituições e personalidades internacionais, espanholas e catalãs que expressaram a sua vontade de abrir um caminho de negociação".
Alertas de Barcelona aos prazos de Madrid
O requerimento formal feito na passada quarta-feira, 11 de Outubro, pelo primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, era um passo obrigatório e prévio para o governo central accionar o artigo 155 da Constituição espanhola, que, para restabelecer o "interesse geral", prevê a suspensão da autonomia, a demissão do actual governo catalão e a convocação de eleições antecipadas na região.
Essa mesma posição saída do conselho de ministros definiu ainda esta quinta-feira, 19 de Outubro como a data-limite para o governo catalão regressar à legalidade constitucional. O que deve ser feito mediante o não reconhecimento dos resultados do referendo independentista e aceitando a nulidade decretada pelo Tribunal Constitucional de Espanha relativamente à consulta popular e também às leis do referendo e da desconexão, aprovadas em Setembro pelo parlamento catalão.
Ora, na resposta enviada esta manhã dentro do prazo estipulado, que terminava às 10:00 (menos uma hora em Lisboa), Puigdemont mostrou-se "surpreendido" com a vontade evidenciada pelo conservador Mariano Rajoy, eleito pelo PP, de avançar com o artigo 155. E insistiu que a 1 de Outubro, entre uma "violenta actuação policial", mais de dois milhões de catalães deram ao Parlament o "mandato democrático de declarar a independência".
Na missiva de quatro páginas – em que duas servem apenas para anexar vários documentos, como a referida lei do referendo ou um relatório sobre as cargas policiais no dia da votação –, o líder político da Catalunha lembrou ainda os resultados das últimas eleições regionais, em que as forças independentistas obtiveram uma "maioria clara" de 47,7%, e somou o desejo da esmagadora maioria dos catalães de poder votar num referendo, para avisar as autoridades centrais que "aceitar a realidade é o caminho para resolver os problemas".
Puigdemont pede também a Madrid que "reverta a repressão contra o povo e o governo da Catalunha", dando o exemplo do congelamento das contas bancarias que impedem o governo local de "cumprir as suas obrigações para com as pessoas mais necessitadas", da censura na Internet e nos meios de comunicação, a violação do segredo postal ou a detenção de funcionários públicos. Avisando que a proposta catalã de diálogo "é sincera, apesar de tudo o que aconteceu, mas logicamente é incompatível com o actual clima de crescente repressão e ameaça".
O segundo pedido a Mariano Rajoy é para que seja realizada, "o antes possível", uma reunião que "permita explorar os primeiros acordos" entre os dois responsáveis políticos. "Não deixemos que se deteriore mais a situação. Com boa vontade, reconhecendo o problema e encarando-o de frente, estou certo de que podemos encontrar o caminho da solução", concluiu o presidente da Generalitat da Catalunha.
Ao mesmo tempo que é apertado por Madrid, o presidente do governo autonómico da Catalunha está sob crescente pressão dos aliados nacionalistas mais à esquerda. Na sexta-feira, 13 de Outubro, a Candidatura de Unidade Popular (CUP) dirigiu também uma missiva a Puigdemont a exigir a retirada da suspensão da declaração unilateral de independência (DUI).
A CUP, um partido de extrema-esquerda que apoia no parlamento catalão o governo protagonizado pela aliança soberanista Juntos pelo Sim, argumentou que a intenção do governo catalão de anunciar a DUI com efeitos suspensos para viabilizar um diálogo mediado com Madrid saiu gorada, pelo que defende o regresso a uma via de desobediência aberta face aos normativos constitucionais.
(notícia actualizada às 9:30 com mais informações da carta e contexto sobre a crise catalã)