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PS, PSD e CDS aprovam acesso dos espiões a dados pessoais 

Socialistas aliaram-se ao PSD e ao CDS para aprovarem na especialidade o novo Regime de Informações da República, onde se confere aos espiões o direito a aceder à um conjunto alargado de dados bancários, fiscais e de comunicações que permitem a localização de pessoas.  PCP apela a "sobressalto cívico" para travar proposta. 

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O novo Regime do Sistema de Informações da República, que vem alargar substancialmente os poderes dos espiões em matéria de acesso a dados de pessoas sob investigação, foi aprovado esta quinta-feira na comissão de direitos, liberdades e garantias da Assembleia da República. PS, PSD e CDS, que se aliaram na votação, consideram que o diploma não incorre em qualquer inconstitucionalidade, ao contrário do PCP, para quem há um atropelo grosseiro das liberdades individuais. 

 

A proposta de lei que esteve em discussão e votação partiu do Governo, mas a defesa das suas linhas mestras e dos seus méritos acabou por ficar maioritariamente a cabo do socialista Jorge Lacão. 

 

Logo para a intervenção inicial, foi o PS quem pediu a palavra para explicar o ponto mais mediatizado do diploma e, a julgar pelos diversos pareceres que foram entretanto entregues, também o mais sensível: trata-se do artigo 78º do referido regime, que confere aos espiões o poder de "aceder à informação bancária, a informação fiscal, a dados de tráfego, de localização ou outros dados conexos das comunicações" de suspeitos que esteja a ser investigados. Este acesso a dados tem de ser previamente validado por uma comissão de controlo prévio, constituída por três juízes do Supremo Tribunal de Justiça. 

 

Jorge Lacão sublinha que a disponibilização deste conjunto de informações, chamados de "metadados", não implica que os espiões passem a aceder ao conteúdo das comunicações – apenas terão acesso à informação sobre as mesmas, no âmbito de investigações para "prevenir a sabotagem, a proliferação, a espionagem, o terrorismo, a criminalidade altamente organizada de natureza transnacional e a prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de Direito democrático". 

 

Lacão sublinha ainda que só poderá haver acesso a dados relativamente a pessoas envolvidas nos factos justificativos do pedido para aceder à estas informações, que têm de ser autorizados pela Comissão de Controlo Prévio, sendo que esta comissão tem poder para cancelar o procedimento e determinar a destruição dos dados. 

 

A titulo complementar, Teresa Leal Coelho, do PSD, acrescentou que a iniciativa do Governo não faz mais do que " dotar os serviços de informações portugueses de instrumentos que todos os serviços  de informações estrangeiros  já detém". E uma vez que o acesso a metadados não  é sinónimo de acesso aos  conteúdos  das comunicações (isto é, é possível saber quem telefonou a quem, a que horas e de onde, mas não se pode conhecer o conteúdo das mensagens) , não há violação da Constituição (CRP). 

 

PCP atira-se ao PS e apela a sobressalto cívico 


Entendimento diametralmente oposto tem o PCP, que recorre ao número 4 do artigo 34º da CRP que proíbe "toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvo nos caos previstos na lei em matéria de processo criminal". 

 

Para os comunistas, a proibição da ingerência nas comunicações pessoais é para ser lida de forma restritiva, e, como a Comissão de Controlo Prévio, apesar de constituída por juízes, é um órgão administrativo, não há aqui qualquer controlo jurisdicional desta matéria, pelo que há uma violação grosseira da Constituição. 

 

O deputado João Oliveira, do PCP, considera que esta "proposta subverte o direito à privacidade". E, num ataque directo ao PS, diz que este " processo legislativo é a prova de que os entendimentos entre o PS, o PSD e o CDS fazem mal à democracia". 

 

Antonio Filipe, também do PCP, fez uma alusão à polemica que envolveu o espião Jorge Silva Carvalho, que ordenou  ilegalmente o acesso a dados de tráfego do número de telefone de um jornalista, em 2010, para apelar a um sobressalto cívico. "Também aí se tratou apenas de dados de trafego", recordou, para acrescentar que o PCP tem "a  esperança que ainda haja um sobressalto democrático até ao próximo dia 22 para que esta proposta seja retirada". 

 

CNPD é Conselho Superior do Ministério Público também estão contra 


Nos pareceres que chegaram à Assembleia da República, a delicadeza constitucional deste artigo não é ignorado, havendo dois que, perfilhando o entendimento do PCP, são especialmente enfáticos: tanto a Comissão Nacional de Protecção de Dados como o Conselho Superior do Ministério Público não têm dúvidas de que o acesso aos metadados, tal como configurados na proposta de Lei, violam a Constituição. 

 

Para a CNPD, a Constituição só autoriza a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas comunicações privadas dos cidadãos se estiver em curso um processo criminal. Ora como o Governo quer que este acesso se possa fazer no âmbito de uma qualquer investigação, sem necessidade de haver processo-crime, há uma violação da CRP e da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

 

Já para o Conselho Superior do Ministério Público, está em causa a "recolha indiscriminada de informação" que não é escrutinada por um órgão jurisdicional, mas sim de natureza administrativa, e que só poderá ser feita mediante uma alteração à Constituição. 

 

O diploma introduz ainda outras alterações ao funcionamento e competências do Servic¸o de Informac¸o~es de Seguranc¸a (SIS) e do Servic¸o de Informac¸o~es Estrate´gicas de Defesa (SIED), bem como ao estatuto de pessoal e ao estatuto remuneratório dos espiões, mas estas matérias acabaram por passar ao lado da discussão na especialidade. 

 

 

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