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Água: contra transvases, dessalinizadoras e barragens. Seis movimentos escrevem aos partidos

Seis movimentos entregaram uma carta aos partidos políticos com 15 reivindicações sobre a água, manifestando-se desde logo contra "autoestradas da água, unindo as bacias do Douro, Tejo e Guadiana", alertando que transvases "custos económicos e os impactes ambientais na biodiversidade seriam de "incomensurável magnitude".

Miguel Baltazar/Negócios
Diana do Mar dianamar@negocios.pt 15 de Fevereiro de 2024 às 11:12

"Não aos transvases entre bacias hidrográficas", "não aos projetos sustentados num aumento do consumo de água", como dessalinizadoras, "não à proliferação de barragens e açudes". Estas são três das 15 reivindicações que seis movimentos fizeram constar de um manifesto enviado, esta quarta-feira, a todos os partidos políticos com assento parlamentar, a poucas semanas das eleições legislativas, marcas para 10 de março.

As 15 reivindicações pelos rios e pela água são subscritas por mais de 70 organizações, que incluem organizações não governamentais, associações e municípios, assim como cidadãos a título individual que fazem parte de um conjunto de seis movimentos com representatividade nas principais bacias hidrográficas do país (AMORA, Mondego Vivo, #MovRioDouro, MUNDA, PAS e proTEJO).

"Irrefletida, deliberada e inconscientemente foram ignorados os avisos fundamentados, sobretudo a partir dos anos setenta do século passado. E assim chegámos à situação que nos coloca no limiar da sobrevivência face à rapidez das alterações climáticas e, em particular, face à degradação da quantidade e qualidade das águas superficiais e subterrâneas e respetivos ecossistemas", começam por avisar os movimentos aos partidos políticos, no documento de reivindicações que pede aos decisores políticos para se agir prioritariamente sobre as causas como forma de combater os efeitos.

Na lista de 15 reivindicações as organizações manifestam-se, desde logo, contra os transvases entre bacias hidrográficas. A razão? "Os custos económicos e os impactes ambientais na biodiversidade (ser humano incluído) seriam de incomensurável magnitude", referem, argumentando que "a ideia de que no norte de Portugal há água a mais é também uma fantasia de quem não conhece a realidade de, por exemplo, Trás-os-Montes onde, no passado recente, tem sido necessário o fornecimento de água à população através de autotanques e onde várias explorações agrícolas tiveram que suportar uma carência de água extrema".

O segundo apelo vai no sentido do combate ao desperdício de água. "É fundamental acelerar a melhoria dos sistemas de distribuição no ciclo urbano da água e de rega de modo a diminuir drasticamente as perdas de água, o que por si só travaria a necessidade de aplicar medidas restritivas ao abastecimento (designadamente no Algarve) e evitar o recurso a novas fontes de captação", sustentam, apontando ser "também importante acelerar o reaproveitamento das águas residuais, ainda que em muitos casos isso exija uma profunda revisão das ETAR e a construção de linhas de distribuição de água alternativas".

As organizações signatárias do documento estão também contra projetos sustentados num aumento do consumo de água, como dessalinizadoras, sob o argumento de que "a definição de limites para o consumo de água é fundamental para a avaliar a viabilidade de novos projetos, nomeadamente na área agrícola cujas utilizações correspondem a 74% dos consumos totais". Além disso, em simultâneo, "deve ser repensada a oferta turística assente na construção de piscinas, campos de golfe, entre outros e, em alguns casos, impedida".

Neste sentido, uma das reivindicações está direcionada em específico para o projeto de construção da dessalinizadora do Algarve que, "além de ser bastante oneroso", trará "mais desequilíbrio ecológico à orla marítima do Algarve com reflexos negativos nas pescas costeiras, maior emissão de gases de efeito de estufa devido à necessidade de se recorrer a combustíveis fósseis", implicando ainda "um aumento do preço da água que pode atingir cinco vezes o custo atual", advogam.

Os seis movimentos estão ainda contra a proliferação de barragens e açudes, por entenderem ser "importante a defesa dos rios vivos e livres, com dinâmica fluvial adequada". "A remoção de barreiras e açudes obsoletos terá que ser uma prática constante", defendem, apontando ser  "necessário promover alternativas à construção de novas barragens de regadio (programa nacional de regadios, Projeto Tejo, etc.), procurando alternativas como o armazenamento fora do leito do rio e culturas menos dependentes da água". Neste ponto, aliás, dizem também ser "fundamental criar regulamentação adequada para as barreiras que já existem de modo a corrigir as práticas de má gestão da água nas barragens".

"As propostas de construção de novas barragens, designadamente Girabolhos-Bogueira no Alto Mondego ou de outras propostas no sul do país devem ser repensadas. Neste caso, de que serve construir mais barragens em cursos de água onde as barragens já existentes, muitas vezes sobredimensionadas não ultrapassam os 50% de armazenamento, mesmo num ano hidrológico normal. As barragens não geram água e por isso agir sobre as causas passa por favorecer a vitalidade do ciclo da água, por todos os meios, nomeadamente através do coberto vegetal permanente, de soluções de engenharia natural e de práticas que favoreçam a infiltração de água nos solos", argumentam.

Da missiva consta ainda um apelo à proteção das águas subterrâneas, assim como ao cumprimento integral e urgente da legislação comunitária e nacional, como a Diretiva Quadro da Água ou a Lei da Água, e das medidas previstas nos Planos de Bacia Hidrográfica (PGRH). Pede-se assim a definição e implementação rigorosa de regimes de caudais ecológicos,  de processos de recuperação ecológica e do efetivo controlo físico-químico e biológico dos efluentes libertados nos meios hídricos.

Em simultâneo, os seis movimentos defendem também a redução dos valores limite de emissão dos efluentes libertados pelas Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) e de Tratamento de Água Residual Industrial (ETARI), a definição de políticas eficazes no sentido de regulamentar a proliferação de monoculturas ou ainda uma estratégia de desenvolvimento conduzida por planos nacionais de restauro fluvial, de eliminação de barreiras transversais, de erradicação de invasoras e de eficiência hídrica.

"Os movimentos ambientalistas reivindicam a introdução destas questões na campanha eleitoral, e a observação de um discurso com pensamento estratégico que represente um projeto viável de ação coletiva e individual responsável e com sentido de justiça intergeracional", concluem.

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