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Organizações da sociedade civil querem conhecer acordo ibérico para gestão transfronteiriça da água

Utilização da água do Alqueva e as captações que ambos os países pretendem sustentar no rio Guadiana entre as preocupações. Cidadãos e agricultores alertam para falta crónica de água no Alentejo.

10 de Setembro de 2024 às 10:39
A Entidade Regional do Turismo quer potenciar o Alqueva.
Luís Guerreiro
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Mais de 30 organizações e movimentos cívicos da sociedade portuguesa exigem que sejam divulgados publicamente os termos gerais do acordo sobre a gestão transfronteiriça da água que está a ser negociado entre Portugal e Espanha e cuja assinatura está prevista para o próximo dia 26 de setembro.

Numa carta aberta divulgada nesta terça-feira, as organizações, entre as quais a ANPIWWF, GEOTA, LPN, OIKOS e ZERO, defendem que a divulgação antecipada dos termos do acordo permitirá não só uma análise detalhada dos mesmos, mas sobretudo uma discussão aberta e transparente.

"Isso não só fortalece a confiança nas instituições públicas e nas decisões tomadas, como também assegura que o acordo atenda a princípios fundamentais como a sustentabilidade ambiental e a preservação dos recursos hídricos e dos ecossistemas dependentes, e a equidade na gestão e distribuição da água, refletindo um compromisso para com a boa governação e a responsabilidade ambiental", assinam as organizações ambientalistas.

Este acordo aborda a gestão de recursos hídricos partilhados com o país vizinho, sobretudo os relacionados com questões específicas dos rios Tejo e Guadiana como a gestão dos caudais libertados por Espanha no Tejo, a utilização da água de Alqueva na zona de fronteira e as captações que ambos os países pretendem sustentar no Rio Guadiana, junto à localidade do Pomarão.

Segundo as organizações, os resultados deste acordo terão "implicações profundas para a sustentabilidade da gestão hídrica em Portugal e a equidade na distribuição de água", pelo que consideram que "é crucial que os termos a ser acordados sejam tornados públicos antes da formalização do acordo a fim de garantir um processo transparente e informar a sociedade civil".

Os subscritores da carta aberta sublinham ainda a importância da democratização do processo de definição da política nacional da água, assegurando que a sociedade civil tenha um papel ativo no grupo de trabalho "Água que Une" ou, pelo menos, que existam mecanismos de envolvimento contínuo destas organizações para garantir uma participação efetiva e consequente na construção da nova Estratégia Nacional para a Água.

Falta crónica de água

Recorde-se que recentemente a comunidade da região se Mértola também se mostrou apreensiva com o novo projeto que visa captar água do rio Guadiana no Pomarão, para servir a albufeira de Odeleite, em Castro Marim, distrito de Faro, uma vez que existe um problema crónico de falta de água no território.

Questão que a ministra do Ambiente e Energia garantiu que será tida em conta. No passado mês de julho, Maria da Graça Carvalho mandatou a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) para a elaboração de uma solução de abastecimento público regular de água potável à freguesia do Espírito Santo, no concelho de Mértola, cujas localidades são afetadas, todos os anos, por grandes défices hídricos, obrigando a que as populações sejam servidas com recurso a autotanques, no período do verão.

Entretanto, nesta segunda-feira, a primeira edição do Barómetro Associação de Horticultores, Fruticultores e Floricultores dos Concelhos de Odemira e Aljezur (AHSA) dá conta de que a seca no sudoeste alentejano é a maior preocupação da agricultura.

Os dados mostram que 94,4% das empresas inquiridas consideram a disponibilidade de recursos hídricos insuficiente, tendo todas já implementado medidas de poupança.

Entre estas destacam-se a instalação de reservatórios hídricos e a melhoria dos sistemas de rega (ambas implementadas por 67% dos inquiridos), a aposta em sistemas de reutilização de água (57%) e a instalação de tecnologias para medir a humidade dos solos (44%).

Segundo o estudo, são estas as principais ações, entre outras, que têm permitido que o setor agrícola do sudoeste alentejano mantenha a sua atividade aproveitando maioritariamente as águas provenientes da precipitação. Contudo, sublinhe-se que 17% dos respondentes alertaram para a inexistência de qualquer capacidade de autossuficiência através de charcas e da reutilização hídrica.

Paralelamente, segundo o Barómetro AHSA, 83% das restantes empresas demonstram alguma capacidade de autoabastecimento. Dentro deste grupo, refira-se que 11% das empresas reportam precisamente 15% de autossuficiência. Já 28% dos produtores representam um segmento significativo de nível de autonomia de água de 20%. Adicionalmente, 22% dos inquiridos referem o alcance entre 25% e 40% de reservas ou reutilização. Destaca-se, ainda, que a mesma percentagem de 22% das empresas conseguem ultrapassar a marca de 50% de autonomia, apesar dos "elevados custos associados ao tratamento da água de captação", o que evidencia o esforço e gestão eficientes dos recursos hídricos por parte das mesmas.

O Barómetro AHSA apurou que, em 2023, as empresas revelaram um investimento total de cerca de 4,9 milhões de euros, com valores alocados por parte dos associados a variar entre 10 mil e 500 mil euros. Para 2024, à semelhança do ano anterior, 80% das empresas inquiridas planeiam continuar a investir em sistemas de poupança de água, prevendo valores idênticos aos de 2023.

Refira-se, ainda, que todos os inquiridos consideram que o Governo anterior não deu a devida importância ao problema da falta de água na região. Consequentemente, a maioria das empresas (83%) sugere que o atual Executivo deve considerar, como medidas prioritárias, a elaboração de uma estratégia nacional para a gestão dos recursos hídricos, o investimento na melhoria dos sistemas de armazenamento e distribuição, bem como a criação de um plano para novas fontes de água.

"A nossa capacidade de adaptação, através de investimentos em tecnologias avançadas e práticas sustentáveis demonstra um compromisso forte com a gestão eficiente dos recursos. Contudo, é imperativo que todos os stakeholders e decisores políticos elaborem em conjunto uma estratégia nacional para a gestão da água e invistam em soluções a longo prazo, como a dessalinização, para garantir a sustentabilidade da produção agrícola na nossa região", assinala Luís Mesquita Dias, presidente da AHSA.

Face à seca verificada no Sudoeste alentejano, 94% dos respondentes consideram que a dessalinização é uma opção fundamental para a região, com 56% dos quais a verem a solução como complemento.

 

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