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Virgolino Faneca "bateu punho" para comparar Feliciano a Macaco

O que é mais grave: florear um currículo com um "visiting scholar" em Berkeley ou perorar sobre valores que não se praticam. O dilema shakespeariano reinventado em todo o seu esplendor.

23 de Março de 2018 às 17:00
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Traidora Delfina

Escrevo para me indignar contigo, praticando assim um dos desportos preferidos da actualidade. E indigno-me porquê? Ora bolas, ainda perguntas. Andas a laurear a pevide e outras partes do corpo pelas praias de Varadero e eu fico aqui enclausurado, a tentar levar o país às costas, unicamente com a ajuda do professor Marcelo, o que revela um comportamento totalmente egoísta da tua parte.

Tu a beberes "cubas libres" e eu às voltas com um incomensurável dilema de natureza académica, o qual pode colocar Portugal na rota de um retrocesso civilizacional. Sim, faz-te de santinha, diz que aí em Cuba não apanhas internet, mas fica sabendo que o desconhecimento não é desculpa e eu não acredito nessa lengalenga de não haver rede e coiso e tal. Cá para mim, atendendo à transcendência do problema, tenho a certeza absoluta de que o Granma o noticiou e tu assobiaste para o ar ou na direcção daquele mulato que te serve as bebidas na espreguiçadeira.

Pois fica sabendo que aqui pelo burgo caiu o Carmo e a Trindade e caiu também Feliciano Barreiras Duarte, da cadeira de secretário-geral do PSD, devido a ter floreado o seu currículo com um "visiting scholar" na Universidade de Berkeley, Califórnia, estatuto que nunca teve. E que antes disso tivemos um problema com o facto de Passos Coelho ter sido convidado para dar aulas no ISCSP. E que muito antes destes dois eventos tivemos aquele célebre exame de Inglês técnico a José Sócrates realizado a um domingo, sem esquecer, claro está, a licenciatura de Miguel Relvas feita com créditos pela experiência profissional e pessoal que iam do cargo de ministro a membro da direcção de um rancho folclórico.

Eu pois que entendo as indignações, eu próprio estou indignado por tu estares ausente e assim não te indignares na minha companhia. Mas eu, e aqui vou surpreender-te, indigno-me com o facto de o doutor Feliciano ter sido destratado.

O homem levou com Berkeley em cima, mas coitado ele só escreveu "visiting", nem sequer dizia que vivia lá, pelo que considero ter-se tratado de uma reacção desproporcionada. Por exemplo, o doutor Fernando Madureira, licenciado em Gestão do Desporto pelo Instituto Universitário da Maia, e líder da claque dos Super Dragões, pode incitar ao uso da força, insultar os adversários e a seguir ser orador num simpósio sobre "Violência vs. Valores", sem ninguém se indignar. Porque efectivamente só uma pessoa com muito valor pode aceitar um convite deste género sem se encabular, isto para não falar dos valores que emanam da pessoa teve a desfaçatez de considerar a sua presença boa ideia, neste caso uma pessoa colectiva que responde pelo nome de Amar Gaia, Associação para o Desenvolvimento de Gaia.

Mas não. O futebol é realmente uma macacada, pelo que as macacadas da política, menos frequentes, têm um outro élan, e o doutor Feliciano pôs-me mesmo a jeito. Qualquer dia, a Amar Gaia irá convidá-lo para o simpósio "Política vs. Currículos", que terá como moderador Miguel Gonçalves. Lembras-te?! É aquele rapaz que o doutor Relvas, enquanto ministro, convidou para embaixador do "Impulso Jovem", ficou célebre pela expressão "bater punho" e deixou um legado de pensamentos profundos dos quais destaco este: "Ser universitário é a coisa mais sexy do mundo. É um iPhone."

Uns tipos armados em arautos da ética criticam Feliciano Barreiras Duarte por não a ter, mas bem analisadas as circunstâncias essa é uma base de argumentação pífia, porque ele tem um iPhone, tal e qual o doutor Madureira, o engenheiro Sócrates e o doutor Relvas. E aqui talvez seja útil recordar a reflexão de Oscar Wilde, que não sendo doutor, era bom em diagnósticos: "Chamamos ética ao conjunto de coisas que as pessoas fazem quando todos estão a olhar. Ao conjunto de coisas que as pessoas fazem quando ninguém está a olhar chamamos carácter."

Para que conste, Delfina, fica sabendo que a tua deserção será punida. Quando chegares vou-te tirar o iPhone e pôr a ler a obra completa do Pedro Chagas Freitas.

Um abraço frívolo deste que está ressentido,

Virgolino Faneca



Quem é Virgolino Faneca

Virgolino Faneca é filho de peixeiro (Faneca é alcunha e não apelido) e de uma mulher apaixonada pelos segredos da semiótica textual. Tem 48 anos e é licenciado em Filologia pela Universidade de Paris, pequena localidade no Texas, onde Wim Wenders filmou. É um "vasco pulidiano" assumido e baseia as suas análises no azedo sofisma: se é bom, não existe ou nunca deveria ter existido. Dele disse, embora sem o ler, Pacheco Pereira: "É dotado de um pensamento estruturante e uma só opinião sua vale mais do que a obra completa de Nuno Rogeiro". É presença constante nos "Prós e Contras" da RTP1. Fica na última fila para lhe ser mais fácil ir à rua fumar e meditar. Sobre o quê? Boa pergunta, a que nem o próprio sabe responder. Só sabe que os seus escritos vão mudar a política em Portugal. Provavelmente para o rés-do-chão esquerdo, onde vive a menina Clotilde, a sua grande paixão. O seu propósito é informar epistolarmente familiares, amigos, emigrantes, imigrantes, desconhecidos e extraterrestres, do que se passa em Portugal e no mundo. Coisa pouca, portanto.



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