Notícia
Trump contra o México e os fabricantes automóveis
Emprego e postos de trabalhos são palavras que deram a chave da Casa Branca ao milionário. Donald Trump tem reclamado várias vitórias com a sua diplomacia económica de pressão pública, provocando respostas dos governos do Alemanha, Japão e México. Tudo isto antes de tomar posse.
Os fabricantes automóveis começaram a estar debaixo do fogo de Donald Trump desde o primeiro minuto da sua campanha. No discurso de lançamento da corrida à Casa Branca, em Junho de 2015, atirou logo a matar. A meio da sua comunicação, na Trump Tower em Nova Iorque, o empresário recorda um investimento que a Ford tinha anunciado no México. Começa então a fazer um pouco de teatro. Finge que está a telefonar para o presidente da fabricante norte-americana a congratular a empresa. Mas rapidamente passa para as más notícias: "Vamos cobrar uma tarifa de 35% a todos os carros produzidos nesta fábrica que atravessarem a fronteira."
O primeiro tiro estava dado e a pressão às fabricantes automóveis continuou, e aumentou, ao longo da campanha. Um desses episódios foi recordado pelo realizador Michael Moore num texto onde previu a vitória de Trump, meses antes da eleição. Moore recordava um discurso de Trump a ameaçar a Ford com a tarifa. "Aquilo foi como música para os ouvidos da classe operária do estado do Michigan", escreveu o realizador em Junho de 2016. Meses mais tarde, Trump vencia Hillary Clinton neste estado tradicionalmente democrata, onde bate o coração da indústria automóvel norte-americana.
Com a vitória sobre Hillary, o republicano começou a metralhar sem perdão sobre as fabricantes de automóveis. Exigências: mais emprego e mais investimentos nos Estados Unidos, por oposição a menos no México.
Mas porque é que esta indústria tem estado entre os alvos preferenciais de Trump? Porque representa 1,5 milhões de postos de trabalho directos nas fabricantes de automóveis, de componentes e concessionários, e 5,7 milhões indirectos, segundo o Center for Automotive Research (CAR).
Já este ano, a Ford anunciou o cancelamento de um investimento no México, justificando a decisão com a queda na procura por carros pequenos nos Estados Unidos. A marca anunciou depois que vai investir nos EUA para criar 700 empregos. Trump reclamou vitória nas redes sociais: "Isto é só o início."
Seguiu-se o ataque à General Motors. "Construam nos Estados Unidos ou vão pagar um grande imposto na fronteira!", ameaçou no início de Janeiro. Duas semanas depois, a maior produtora automóvel do país anunciava que iria investir mil milhões de dólares nos EUA.
Também a Fiat Chrysler anunciou que pretendia canalizar mil milhões de dólares para expandir duas fábricas nos Estados Unidos e criar dois mil postos de trabalho. Trump celebrou, mas a empresa garantiu que os investimentos estavam a ser preparados desde 2015.
"As empresas estão a seguir o seu rumo normal. Tudo o que estão a fazer é anunciar investimentos que teriam feito de qualquer maneira", disse Maryann Kellerum, consultora para o sector automóvel, citada pela Bloomberg, desvalorizando o efeito da pressão exercida por Trump sobre as empresas.
No entanto, instalou-se um certo receio entre as empresas norte-americanas que têm corrido para a Trump Tower com planos de investimento na mão.
"Quase toda a gente tem medo de ser alvo de um tweet. Ser arrastado sem aviso para o tribunal da opinião pública é algo que ninguém quer", observou, ao The Guardian, Kristin Dziczek, do centro CAR.
Rapidamente, o Presidente eleito começou a pressionar fabricantes automóveis de outros países presentes nos EUA. Foi o caso da alemã BMW, com Trump a acenar com a já famosa tarifa de 35%, caso a marca avançasse para o México. A BMW não recuou e veio a público garantir que o seu investimento iria mesmo avançar.
O Governo alemão veio defender a marca da Baviera, apontando que a maior fábrica da BMW no mundo já se encontra, precisamente, nos Estados Unidos, onde são produzidos os jipes da marca.
Também o Governo japonês veio defender a Toyota após Trump ameaçar a marca com uma "elevada tarifa aduaneira", caso investisse no México. "Este é um assunto que envolve uma empresa privada, mas o Governo está preparado para apoiar" a Toyota, respondeu o ministro da Economia do Japão, Hiroshige Seko. Dias depois, a Toyota, a maior fabricante automóvel mundial, anunciava um investimento de 10 mil milhões de dólares nos Estados Unidos nos próximos cinco anos.
Quem ganha e quem perde?
Donald Trump está a ver o copo meio vazio, enquanto as empresas vêem um copo meio cheio. Trump pede mais empregos, mas as várias marcas estrangeiras - BMW, Mercedes, Honda, Nissan e Toyota - respondem que já empregam milhares de trabalhadores nos Estados Unidos em diversas fábricas.
Os dados também demonstram que os postos de trabalho nos Estados Unidos têm vindo a crescer nos últimos anos, depois da recessão de 2008.
Um aviso deixado por vários responsáveis é que, com estas políticas, os automóveis nos Estados Unidos podem ficar mais caros. "Quem vai ficar a perder são os apoiantes base de Trump, que acabam por comprar produtos mais caros", analisou um antigo executivo da Chrysler, Bill Russo, ao New York Times.
Os analistas indicam que parte da produção no México que se destina aos Estados Unidos é de carros pequenos, menos onerosos, e onde a mão-de-obra mexicana mais barata faz diferença no preço final. Já nos Estados Unidos, as marcas têm investido em fábricas para produzir carros maiores, como jipes, em que a maior margem de lucro acomoda a mão-de-obra mais cara.
"Estou muito céptico sobre quanto lucro vem dos carros ligeiros. O lucro está nos camiões e nos SUV", apontou o analista Jamie Albertine à CNBC. Um carro ligeiro pode gerar dois mil dólares líquidos para o fabricante, enquanto um SUV pode gerar um retorno de 10 mil dólares.
Do outro lado do rio grande
A resposta óbvia são os baixos salários no México face aos praticados nos Estados Unidos (seis dólares contra 28 dólares). A indústria automóvel emprega 675 mil trabalhadores no país asteca. Mas o México também tem acordos de comércio livre com 40 países, tendo acesso a 47% do mercado automóvel mundial, mais do que os EUA têm.
A maioria das exportações automóveis do México nos próximos anos terá como destino países fora da América do Norte, segundo uma previsão do centro de estudos CAR.
O Governo mexicano, presidido por Enrique Peña Nieto, já ameaçou retaliar, caso o Governo Trump imponha tarifas aos carros mexicanos.
"É claro que temos de estar preparados para neutralizar imediatamente o impacto desta medida. E é muito claro como vamos fazê-lo: através de acções fiscais com vista a neutralizar a medida", avisou o ministro da Economia, Ildefonso Guajardo, citado pelo Guardian.
O presidente da Fiat Chrysler, Sergio Marchionne, já avisou que uma tarifa de 35% para os carros produzidos no México vai provocar o encerramento de fábricas naquele país.
Trump fez campanha contra os imigrantes ilegais mexicanos a viverem nos Estados Unidos. E uma campanha anti-investimento no México pode ter consequências adversas.
"Quanto mais postos de trabalho forem destruídos no México, mais imigrantes vão estar entre os norte-americanos. Pense um pouco!", alertou o ex-Presidente mexicano Felipe Calderón.
Donald Trump tem sido um atirador furtivo: nada discreto, mas muito certeiro. Até agora a mirar os Estados Unidos e o México a partir da Trump Tower. Daqui para a frente, vai estar na Casa Branca a olhar para todo o mundo. A grande pergunta neste momento é: quais são os próximos alvos?
O primeiro tiro estava dado e a pressão às fabricantes automóveis continuou, e aumentou, ao longo da campanha. Um desses episódios foi recordado pelo realizador Michael Moore num texto onde previu a vitória de Trump, meses antes da eleição. Moore recordava um discurso de Trump a ameaçar a Ford com a tarifa. "Aquilo foi como música para os ouvidos da classe operária do estado do Michigan", escreveu o realizador em Junho de 2016. Meses mais tarde, Trump vencia Hillary Clinton neste estado tradicionalmente democrata, onde bate o coração da indústria automóvel norte-americana.
Mas porque é que esta indústria tem estado entre os alvos preferenciais de Trump? Porque representa 1,5 milhões de postos de trabalho directos nas fabricantes de automóveis, de componentes e concessionários, e 5,7 milhões indirectos, segundo o Center for Automotive Research (CAR).
Já este ano, a Ford anunciou o cancelamento de um investimento no México, justificando a decisão com a queda na procura por carros pequenos nos Estados Unidos. A marca anunciou depois que vai investir nos EUA para criar 700 empregos. Trump reclamou vitória nas redes sociais: "Isto é só o início."
Seguiu-se o ataque à General Motors. "Construam nos Estados Unidos ou vão pagar um grande imposto na fronteira!", ameaçou no início de Janeiro. Duas semanas depois, a maior produtora automóvel do país anunciava que iria investir mil milhões de dólares nos EUA.
Também a Fiat Chrysler anunciou que pretendia canalizar mil milhões de dólares para expandir duas fábricas nos Estados Unidos e criar dois mil postos de trabalho. Trump celebrou, mas a empresa garantiu que os investimentos estavam a ser preparados desde 2015.
"As empresas estão a seguir o seu rumo normal. Tudo o que estão a fazer é anunciar investimentos que teriam feito de qualquer maneira", disse Maryann Kellerum, consultora para o sector automóvel, citada pela Bloomberg, desvalorizando o efeito da pressão exercida por Trump sobre as empresas.
No entanto, instalou-se um certo receio entre as empresas norte-americanas que têm corrido para a Trump Tower com planos de investimento na mão.
"Quase toda a gente tem medo de ser alvo de um tweet. Ser arrastado sem aviso para o tribunal da opinião pública é algo que ninguém quer", observou, ao The Guardian, Kristin Dziczek, do centro CAR.
Rapidamente, o Presidente eleito começou a pressionar fabricantes automóveis de outros países presentes nos EUA. Foi o caso da alemã BMW, com Trump a acenar com a já famosa tarifa de 35%, caso a marca avançasse para o México. A BMW não recuou e veio a público garantir que o seu investimento iria mesmo avançar.
O Governo alemão veio defender a marca da Baviera, apontando que a maior fábrica da BMW no mundo já se encontra, precisamente, nos Estados Unidos, onde são produzidos os jipes da marca.
Também o Governo japonês veio defender a Toyota após Trump ameaçar a marca com uma "elevada tarifa aduaneira", caso investisse no México. "Este é um assunto que envolve uma empresa privada, mas o Governo está preparado para apoiar" a Toyota, respondeu o ministro da Economia do Japão, Hiroshige Seko. Dias depois, a Toyota, a maior fabricante automóvel mundial, anunciava um investimento de 10 mil milhões de dólares nos Estados Unidos nos próximos cinco anos.
Quem ganha e quem perde?
Donald Trump está a ver o copo meio vazio, enquanto as empresas vêem um copo meio cheio. Trump pede mais empregos, mas as várias marcas estrangeiras - BMW, Mercedes, Honda, Nissan e Toyota - respondem que já empregam milhares de trabalhadores nos Estados Unidos em diversas fábricas.
Os dados também demonstram que os postos de trabalho nos Estados Unidos têm vindo a crescer nos últimos anos, depois da recessão de 2008.
Um aviso deixado por vários responsáveis é que, com estas políticas, os automóveis nos Estados Unidos podem ficar mais caros. "Quem vai ficar a perder são os apoiantes base de Trump, que acabam por comprar produtos mais caros", analisou um antigo executivo da Chrysler, Bill Russo, ao New York Times.
Os analistas indicam que parte da produção no México que se destina aos Estados Unidos é de carros pequenos, menos onerosos, e onde a mão-de-obra mexicana mais barata faz diferença no preço final. Já nos Estados Unidos, as marcas têm investido em fábricas para produzir carros maiores, como jipes, em que a maior margem de lucro acomoda a mão-de-obra mais cara.
"Estou muito céptico sobre quanto lucro vem dos carros ligeiros. O lucro está nos camiões e nos SUV", apontou o analista Jamie Albertine à CNBC. Um carro ligeiro pode gerar dois mil dólares líquidos para o fabricante, enquanto um SUV pode gerar um retorno de 10 mil dólares.
Do outro lado do rio grande
A resposta óbvia são os baixos salários no México face aos praticados nos Estados Unidos (seis dólares contra 28 dólares). A indústria automóvel emprega 675 mil trabalhadores no país asteca. Mas o México também tem acordos de comércio livre com 40 países, tendo acesso a 47% do mercado automóvel mundial, mais do que os EUA têm.
A maioria das exportações automóveis do México nos próximos anos terá como destino países fora da América do Norte, segundo uma previsão do centro de estudos CAR.
O Governo mexicano, presidido por Enrique Peña Nieto, já ameaçou retaliar, caso o Governo Trump imponha tarifas aos carros mexicanos.
"É claro que temos de estar preparados para neutralizar imediatamente o impacto desta medida. E é muito claro como vamos fazê-lo: através de acções fiscais com vista a neutralizar a medida", avisou o ministro da Economia, Ildefonso Guajardo, citado pelo Guardian.
O presidente da Fiat Chrysler, Sergio Marchionne, já avisou que uma tarifa de 35% para os carros produzidos no México vai provocar o encerramento de fábricas naquele país.
Trump fez campanha contra os imigrantes ilegais mexicanos a viverem nos Estados Unidos. E uma campanha anti-investimento no México pode ter consequências adversas.
"Quanto mais postos de trabalho forem destruídos no México, mais imigrantes vão estar entre os norte-americanos. Pense um pouco!", alertou o ex-Presidente mexicano Felipe Calderón.
Donald Trump tem sido um atirador furtivo: nada discreto, mas muito certeiro. Até agora a mirar os Estados Unidos e o México a partir da Trump Tower. Daqui para a frente, vai estar na Casa Branca a olhar para todo o mundo. A grande pergunta neste momento é: quais são os próximos alvos?