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Rui Peres Jorge - Jornalista rpjorge@negocios.pt 20 de Outubro de 2017 às 14:00

Longa vida ao Pedro Romano

O que mais apreciava no Pedro era a sua capacidade de desenvolver um quadro de análise e de pensamento autónomo, partilhando textos e ideias como desafios honestos às suas ideias e às dos outros. Perdemo-lo e ficámos-lhe em dívida. Talvez a possamos ir pagando exercitando a curiosidade, o pensamento livre e a exigência na promoção dos melhores.

Foi a última surpresa do Pedro. Desde que o conheci em 2010 e com ele trabalhei habituei-me a ser surpreendido. Pelo que sabia, pelo que estudava e lia, também fora da economia, pelos saltos que deu das ciências da comunicação para o jornalismo, do jornalismo para a assessoria parlamentar, da assessoria para a comunicação e análise económica e, agora, daí para as nossas memórias.

Após ter deixado o Negócios, continuávamos a trocar mensagens, a lermo-nos e a trocar impressões. Nesse período o que mais apreciava no Pedro era a sua capacidade de desenvolver um quadro de análise e de pensamento autónomo, partilhando textos e ideias como desafios honestos às suas ideias e às dos outros.

Foi o caso de um e-mail que me enviou em Abril com o assunto "interessante". Lá dentro uma ligação para um artigo de Charles Goodhart, ex-membro do comité de política monetária do Banco de Inglaterra, publicado num blogue não menos interessante, o "Bank Underground", que acolhe as opiniões do ‘staff’ da autoridade monetária sobre politica económica, e que me foi apresentado também pelo Pedro.

Goodhart, conhecido pela sua liberdade de pensamento e ouvido com frequência nos meios da política monetária e financeira internacional, defende que as reformas da regulação deveriam desviar o foco da tentativa de controlar e penalizar em excesso os bancos, para centrar esforços na responsabilização dos seus gestores, os verdadeiros responsáveis pelos abusos no sistema financeiro. Termina assim:

"Se um CEO de um banco souber que a sua fortuna familiar está em risco ao longo da sua vida por causa de falhas das decisões dos empregados durante o seu tempo à frente do banco, isso fará mais para melhorar a cultura bancária do que qualquer conjunto de sermões e juras de bom comportamento. A raiz do problema está no mau comportamento dos banqueiros, não dos bancos, que são incapazes de agir, para o bem ou para o mal. O enquadramento regulatório deve ser refocado nos primeiros, em particular na reforma dos incentivos"

É um bom texto para ler na semana em que se concretizou a venda do Novo Banco – uma instituição financeira que entre perdas para accionistas e credores do BES e posterior recapitalização, principalmente com capitais públicos, já sugou qualquer coisa como 20 mil milhões de euros – e em que também termina o período de consulta pública da tímida e confusa proposta de reforma da supervisão financeira apresentada pelo Governo, e que se prepara para ser decidida sem o devido debate na sociedade.

Este país não era para o Pedro. Não sei o que pensou na partida, mas sei que ficámos pior sem ele, e que lhe ficamos em dívida. Talvez a possamos ir pagando exercitando a curiosidade, o pensamento livre e a exigência na promoção dos melhores. Longa vida ao Pedro Romano.
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