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Uma saída limpa muito suja

Portugal vai sair limpinho da troika, depois do exercício forçado de desintoxicação de crédito, motivado por razões absolutamente artificiais e criadas nos laboratórios dos caçadores de "yields" (taxas de rendimento) altas.

 

Para as "autoridades" internacionais o principal está feito. A Alemanha garantiu custos residuais de financiamento para muitos anos. E, mais importante, as taxas de juro elevadas da dívida pública portuguesa (e grega e irlandesa) deram muito dinheiro a ganhar a muitos investidores, depois de o mesmo ter acontecido com a Euribor, o petróleo, as matérias-primas alimentares, as "dotcom", os primeiros emergentes ou o ouro. O tubarão já fitou outra presa (os segundos emergentes?) e seguirá o seu caminho, deixando para trás uma carcaça a engordar até à próxima passagem. A única saída limpa que lhe interessa é a sua e essa foi razoavelmente garantida (as agências de "rating" continuam a fazer o seu trabalho de batedores, desbravando o caminho, por exemplo).

Portugal volta a ficar nas mãos dos seus decisores, cujas escolhas até à chegada da troika foram sendo feitas com base no instinto de auto-preservação e sobrevivência. Agora, com eleições no horizonte, já se pressente o mesmo instinto. O plano de obras públicas (cinco mil milhões para a construção!), as linhas de apoio a PME (seis mil milhões para PME!), a bandeira dos fundos comunitários (seis mil milhões para PME!). O guião volta a ser quase o mesmo (e ainda faltam os impostos).

Tudo isto servirá um único fim, mesmo que isso mantenha o país hipotecado aos credores internacionais, com custos ainda mais gravosos, à espera da próxima passagem do tubarão branco da "high yield". E com a economia sem programa.

O que surpreende nesta estratégia que já se desenha em São Bento é a convicção de que ainda há sobrevivência que justifique este instinto. Acreditar-se que se pode permanecer no poder depois destes longos e penosos meses de governação, marcada por subserviência internacional, gravíssimo défice democrático, falta de respeito pelas instituições ou pelos portugueses mais desprotegidos, erros de um amadorismo político assustador, acreditar-se que ainda se consegue convencer um par de milhões de eleitores a confiar neste Governo, é o cúmulo da falta de maturidade política. Passos Coelho e Paulo Portas quererão uma saída limpa. Mas não é de Portugal, é limpa de consciência e politicamente. Que acreditem que isso ainda é possível é só mais um tique de uma destruidora cegueira político-partidária.

*Editor de Empresas

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