Opinião
Os pecados da TAP
Depois da extraordinária expressão "inverdade" ter reinado durante alguns anos, agora é a vergonha, ou a ausência desta, o florete do debate político. No meio disto há uma empresa, a TAP, que está a servir de campo de batalha numa luta de galos na qual nenhum tem legitimidade para levantar muito a crista.
Caiu o Carmo e a Trindade com a revelação dos nomes para a administração da transportadora aérea. Miguel Frasquilho e Lacerda Machado, à frente de todos, embora já há muito se falasse da designação. Passos disparou com a "pouca-vergonha" do Governo; o PS, pela voz do sempre disponível Carlos César, atirou a vergonha para o outro lado da barricada, como o fez o ministro Pedro Marques. Curiosamente, ninguém parece estar focado em negar a sua falta de vergonha, mas sim a apontar a dos outros. Ou seja, "eu não sou pior do que vocês". É verdade, mas é pobre.
A designação de Diogo Lacerda Machado não tem problema algum. Percebe-se a tentação do PSD em tentar polemizar uma figura publicamente opaca (será eternamente "o amigo de Costa"), mas os argumentos estão furados. O homem representou o Estado na reversão da privatização, e o Estado escolheu-o para o continuar a representar, agora na administração. Faz sentido.
Depois vem a esquerda lançar bombas de fumo e, como é frequente, confundir tudo. Catarina Martins pede que se acabem com "velhos hábitos" mas não discute a competência dos nomeados, que é o que interessa. Já o PCP vai mais longe. Frasquilho, por exemplo, é atacado pelo seu percurso no PSD (o PCP até sai do seu caminho para dar uma canelada em Paulo Macedo, pelos mesmos motivos); e o comunicado enreda-se na crítica a tudo o que mexe, culpando Lacerda Machado por a reversão na TAP não ter sido total e apenas parcial. Ora Lacerda Machado não tem culpa disto, negociou aquilo para que foi mandatado.
O pecado original da TAP foi uma privatização feita à pressa por um Governo com a legitimidade diminuída; e uma posterior reversão com contornos de chantagem, mal disfarçados.
Quanto às nomeações, o problema não está nos Frasquilhos, nas Esmeraldas Dourados ou nos Lacerdas Machado. Nos cargos que terão e na empresa que é, serão naturalmente muito escrutinados. O problema está nas dezenas ou centenas de nomeações, por razões partidárias ou familiares, que PS, PSD e CDS sempre fizeram e continuam a fazer, para cargos "abaixo do radar" público e mediático. A colonização da coisa pública pelos partidos de poder, esse sim, é um péssimo contributo para a salubridade da nossa democracia.