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27 de Junho de 2007 às 13:59

Os patinhos feios da democracia

Tornou-se fino apontar o dedo às autarquias, como palco de todos os males do Portugal democrático. Estão no centro dos processos de corrupção. São apontadas como o expoente de desperdício de dinheiros públicos, pela realização de obras de interesse duvido

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São apontadas como o expoente de desperdício de dinheiros públicos, pela realização de obras de interesse duvidoso (as famosas rotundas), justificadas mais por critérios de visibilidade e poder dos eleitos do que pelo bem-estar das populações. São as principais responsáveis pelo desordenamento do território, com a ligação directa entre as receitas e o "boom" de construção civil que infestou grande parte do litoral de uma selva de betão.

Não faltam bons argumentos a quem aponta o dedo às autarquias. O que falta, às vezes, é equilíbrio. E a justiça de reconhecer que alguns dos males de que padecem as câmaras não são substancialmente diferentes dos que afectam outras instâncias de poder.

O descalabro financeiro faz parte da lista negra, cujo excessivo recurso ao endividamento já contribuiu para o agravamento do desequilíbrio das contas públicas nacionais. Tanto ou tão pouco que as câmaras foram justamente criticadas por falta de solidariedade interinstitucional e, depois de ter falhado o tecto ao endividamento imposto por Ferreira Leite, passaram a ser regidas, desde o início do ano, por uma nova Lei das Finanças Locais que foi negociada entre a Associação Nacional do Municípios e um ministro que é agora candidato à Câmara da capital. Uma lei que deu origem a um aceso debate entre o Governo e os autarcas, e que estabeleceu regras mais apertadas nos limites ao endividamento.

O Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses, que trata dados relativos a 2005, é uma iniciativa da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (CTOC) que já vai na sua terceira edição. O documento, que o Jornal de Negócios hoje divulga em primeira mão, faz um retrato detalhado da situação financeira das 308 câmaras portuguesas (perdão, 307, porque uma não respondeu) e apresenta um quadro desastroso, com mais de 15% em situação de ruptura financeira.

Sem surpresas, Lisboa aparece no topo da lista, sobretudo em termos de liquidez, com um défice de 317 milhões de euros, perto de um terço das dívidas acumuladas por todas as câmaras.

Além dos grandes números, outras conclusões se podem tirar. Uma aponta para prazos de pagamento excessivamente dilatados. Há câmaras que pagam quase a dois anos. Se os 640 dias de Fornos de Algodres se destacam pela negativa, atrasos superiores a 200 dias são prática corrente. Tais prazos representam um peso inaceitável sobre a economia, que se reproduz em cadeia muito para além dos seus fornecedores directos. No fundo, as câmaras financiam-se junto dos fornecedores, uma situação que favorece as relações de dependência. Além de as fazer pagar mais pelo serviço.

Não há 50 maneiras de equilibrar as contas. Os especialistas recomendam redução das despesas, que, sobretudo nos municípios mais pequenos, se concentram nos custos com pessoal. Uma receita mais fácil de enunciar do que de concretizar, tendo em conta a grande dependência do emprego público nos pequenos municípios. Mas Lisboa, recorde-se, tem 11 mil funcionários.

As câmaras portuguesas prestam aos seus munícipes serviços importantes. É justo reconhecer que a qualidade de vida, em especial nos centros mais pequenos e de média dimensão, não tem nada a ver com a realidade de há 20 anos. Mas esse crédito, que deve ser reconhecido, não as iliba de responsabilidades e de um comportamento financeiramente responsável. O tempo da balda nas autarquias está, definitivamente, fora de moda.

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