Opinião
À prova de betão
O PSD de Manuela Ferreira Leite desenterrou o tema das obras públicas. Depois de o mesmo PSD, dois líderes atrás, ter relançado o debate sobre a Ota e, com o apoio da sociedade civil, ter obrigado o Governo a recuar e a optar pela localização de Alcochete para o novo aeroporto.
No debate em curso, tende-se a esquecer que a contestação aos grandes projectos de investimento como motor do desenvolvimento começou por nascer dentro do próprio Governo, pelo punho de Campos e Cunha. Que, enquanto ministro das Finanças, pode ter sido acusado de falta de lealdade mas nunca de falta de discernimento e que justificou as suas dúvidas precisamente na necessidade de uma avaliação custo-benefício dos investimentos e da sua exequibilidade no contexto de contenç
Entretanto passaram-se três anos e o Governo sucumbiu. Onde antes era posta a tónica nos factores "soft" – o choque tecnológico, a qualificação dos portugueses, a redução da burocracia – passou a figurar o investimento em obras públicas.
Mário Lino explicou, em entrevista ao Jornal de Negócios, que o interregno foi provocado pela prioridade ao equilíbrio orçamental. A que convém acrescentar o atraso na negociação do novo quadro de fundos comunitários, que apenas agora está em condições de arrancar.
Obras públicas sim ou não é uma dicotomia demasiado simplista. O que deve estar em questão é o carácter reprodutivo dos investimentos: o seu impacto para o desenvolvimento da economia, para o reforço da produtividade e da competitividade nacionais. Portugal está melhor servido de redes de comunicação rodoviárias mas essa não foi a melhor forma de investir o dinheiro posto à nossa disposição por Bruxelas. O problema é que o investimento nos factores intangíveis só produz efeitos a longo prazo e é por isso muito mais difícil de avaliar ao fim de uma legislatura.
Bem pode Sócrates denunciar algum oportunismo político do PSD nas dúvidas enunciadas pela nova liderança social-democrata. Mas o argumento fica prejudicado pela conjuntura: se a necessidade de prosseguir o equilíbrio das contas públicas justificou a contenção no passado recente, não estará o agravamento inesperado da conjuntura internacional a justificar novo compasso de espera?
Não se trata de transferir verbas de investimentos classificados como estruturantes para as políticas sociais, como defendeu Manuela Ferreira Leite na sua intervenção no congresso do partido, numa surpreendente cedência a um estilo populista, mas de definir prioridades num momento em que se torna claro que não vai ser possível fazer tudo sem onerar excessivamente as gerações futuras.
E é aqui que entra Cavaco Silva. Criticado pela aposta dos seus governos no betão, o Presidente da República não está em condições de passar agora para o extremo oposto. Mas pode fazer avisos - como tem feito. Se isso representa o fim da cooperação estratégica ou uma nova forma do seu exercício é o que se vai ver. Mas convém não esquecer o carácter cirúrgico das intervenções do Presidente a propósito do novo aeroporto, de tal forma que bem pode dizer-se que ele é hoje co-responsável da decisão tomada pelo Governo.
Duas coisas devem ser deixadas às atenções dos críticos: Portugal não pode viver em permanente pára-arranca e a inacção não pode ser a resposta às dificuldades. É esse o risco do discurso do "não há dinheiro para nada" de Ferreira Leite.
Entretanto passaram-se três anos e o Governo sucumbiu. Onde antes era posta a tónica nos factores "soft" – o choque tecnológico, a qualificação dos portugueses, a redução da burocracia – passou a figurar o investimento em obras públicas.
Obras públicas sim ou não é uma dicotomia demasiado simplista. O que deve estar em questão é o carácter reprodutivo dos investimentos: o seu impacto para o desenvolvimento da economia, para o reforço da produtividade e da competitividade nacionais. Portugal está melhor servido de redes de comunicação rodoviárias mas essa não foi a melhor forma de investir o dinheiro posto à nossa disposição por Bruxelas. O problema é que o investimento nos factores intangíveis só produz efeitos a longo prazo e é por isso muito mais difícil de avaliar ao fim de uma legislatura.
Bem pode Sócrates denunciar algum oportunismo político do PSD nas dúvidas enunciadas pela nova liderança social-democrata. Mas o argumento fica prejudicado pela conjuntura: se a necessidade de prosseguir o equilíbrio das contas públicas justificou a contenção no passado recente, não estará o agravamento inesperado da conjuntura internacional a justificar novo compasso de espera?
Não se trata de transferir verbas de investimentos classificados como estruturantes para as políticas sociais, como defendeu Manuela Ferreira Leite na sua intervenção no congresso do partido, numa surpreendente cedência a um estilo populista, mas de definir prioridades num momento em que se torna claro que não vai ser possível fazer tudo sem onerar excessivamente as gerações futuras.
E é aqui que entra Cavaco Silva. Criticado pela aposta dos seus governos no betão, o Presidente da República não está em condições de passar agora para o extremo oposto. Mas pode fazer avisos - como tem feito. Se isso representa o fim da cooperação estratégica ou uma nova forma do seu exercício é o que se vai ver. Mas convém não esquecer o carácter cirúrgico das intervenções do Presidente a propósito do novo aeroporto, de tal forma que bem pode dizer-se que ele é hoje co-responsável da decisão tomada pelo Governo.
Duas coisas devem ser deixadas às atenções dos críticos: Portugal não pode viver em permanente pára-arranca e a inacção não pode ser a resposta às dificuldades. É esse o risco do discurso do "não há dinheiro para nada" de Ferreira Leite.
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